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Mais um 8 de março: o que as mulheres da educação têm a comemorar?

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Por Nayara de Souza Araujo , gestora de políticas públicas e MBA em gerenciamento de projetos. Hoje coordena projeto de primeira infância na FGV CEIPE e
Atualização:

Oficializado pela ONU em 197, o 8 de março costuma ser mais uma daquelas datas onde a opinião se divide entre os que acreditam haver motivos para comemorar e outros que querem mais que parabéns ou rosas.

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A máxima sobre ser dia da mulher todo dia faria sentido se considerarmos que a maioria da população brasileira é composta por elas/nós. Entretanto, a desigualdade de gênero perpassa diferentes cenários socioeconômicos. De acordo com o IBGE (2021), em 2019, 54,5% das mulheres integravam a força de trabalho no Brasil, contra 72,7% dos homens. E as mulheres, ainda, recebem, em média, 77% do salário auferido pelos homens. Quando em posição de poder, como em cargos de diretores e gerentes, a diferença é ainda maior, onde as mulheres recebem 61,9% do rendimento dos homens.

Além do acesso ao mercado de trabalho e remuneração desigual, o ainda presente "lugar da mulher" na família faz com que elas/nós nos dediquemos o dobro do tempo aos afazeres domésticos e cuidados com a família que os homens (IBGE, 2021). Barduni, Gonçalves e Ferreira (2022), aponta que a estereotipação dos atributos considerados inerentes à mulher, tais como o cuidado e educação dos filhos, doçura e doação, proporcionou a criação de profissões eminentemente femininas, como a de professora. Quando analisamos o cenário da educação pública, percebemos a enorme dicotomia de gênero. Por exemplo, na rede estadual de Mato Grosso, 90% das professoras são mulheres, 80% no Paraná e mais de 70% em São Paulo. No entanto, pasmem (!), todos esses estados são liderados por Secretários homens.

No Brasil, ainda que o governo Lula tenha avançado nessa pauta e superado do Governo Dilma com o ministério mais diverso, nomeando 11 ministras, elas representam apenas 30% das pastas e apesar de uma mulher ter sido cotada desde a eleição para o MEC, ele também é liderado por um homem. Inclusive, desde que foi criado em 1931, o MEC teve apenas uma ministra, Esther de Figueiredo Ferraz em um governo não democrático, do presidente João Goulart, em 1982.

Dentre as novas gestões estaduais, 14 têm Secretárias mulheres, prioritariamente nos estados do nordeste, que também se destacam com maior paridade geral entre o secretariado e também por contar com os únicos dois estados liderados por governadoras mulheres.

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No âmbito do terceiro setor, as discrepâncias parecem diminuir um pouco. Segundo o censo GIFE de 2020,a predominância de mulheres nas equipes vem aumentando, sendo quase dois terços formadas por mulheres. No último biênio, essa proporção aumentou 9 pontos percentuais, sendo que a presença de homens nas equipes diminuiu significativamente (20%) desde o Censo 2018, passando de 6 mil para 4,8 mil profissionais - já a quantidade total de mulheres aumentou 15%, de 7,4 mil para 8,5 mil.

Embora vários governos já tenham iniciado o movimento de processo seletivo para seleção dos cargos de liderança, o cenário para equiparidade de gênero em cargos de poder evolui a passos lentos. E mais: dados de uma pesquisa de 2019 apontam que três em cada 10 pessoas no Brasil não se sentem confortáveis com uma mulher como sua chefe. Então, mesmo que exista processo seletivo, existem valores sociais intrínsecos que impedem a ascensão da mulher.

Ou seja, é natural para nós a figura da mulher como professora, mas não em uma posição de tomada de decisão, mesmo que seja no âmbito da educação. Porém é urgente aceitarmos que o papel da mulher na educação não é ser a "tia" da educação infantil ou a "prof" mãezona do ensino médio. O lugar da mulher na educação, como em qualquer outro, é onde ela quiser.

 

Até quando isso passará como normal? 

Cida Bento, em seu livro "O pacto da branquitude" reforça a importância de problematizar o entendimento de que os resultados de processos seletivos, contratações e promoções que colocam homens brancos majoritariamente em posições mais qualificadas são decorrentes exclusivamente do mérito que essas pessoas têm pela excelência individual naquilo que são e fazem. Ela ainda convoca que é urgente fazer falar o silêncio, refletir e debater ainda que seja parte de uma herança simbólica.

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Em um esfera predominantemente feminina, como a educação, é de suma relevância debater e questionar a predominância de homens no poder. Quem eles representam e quem eles lideram? Não é possível indicarmos mulheres igualmente capacitadas para essas posições?

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Maneiras de homenagear as mulheres nesse dia:

Na sala de aula, compreenda o papel da professora como educadora, desassociada à perspectiva familiar. A professora ensina. A mãe, tia e outros papéis femininos da família, cuidam.

  • Exija salário igual entre gêneros para trabalhos de igual valor;
  • Exija política de tolerância zero para assédio sexual e outras práticas machistas no seu local de trabalho;
  • Fomente a representação igual das mulheres nas salas de reuniões,  conselhos e mesas diretoras;
  • Solicite políticas de licença parental que apoiem mães e pais;
  • Repense o cotidiano de dentro de casa também: divida igualmente o trabalho doméstico e o cuidado com a família
  • Vote em mulheres. Hoje apenas 18% da câmara e do senado são ocupados por mulheres.
  • Bônus: aproveite a discussão sobre desigualdade de gênero e reflita sobre todas as outras situações de desigualdade e exclusão, como os que tangem raça, capacitismo e sexualidade, por exemplo. Os debates não devem ser desassociados. E todos os espaços devem ser ocupados de forma plural.

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