Brasil

Mais de 60% dos estudantes em alfabetização não conseguem diferenciar um cartaz de uma lista de compras

Inep divulgou dados do Saeb nesta quarta-feira; é a primeira vez que a prova avalia estudantes dessa série e sob parâmetros da Base Nacional Comum Curricular
Sala de aula do ensino fundamental do Colégio Pedro II Foto: Divulgação / Agência O Globo
Sala de aula do ensino fundamental do Colégio Pedro II Foto: Divulgação / Agência O Globo

BRASÍLIA— Dados divulgados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), nesta quarta-feira, mostram que no 2° ano do ensino fundamental 66,8% dos alunos não conseguem identificar a finalidade de um texto e diferenciar, por exemplo, um cartaz de uma lista de compras. Essa é a primeira vez que o órgão avalia essa série de ensino desde que a Base Nacional Comum Curricular (BNCC) indicou a antecipação do fim da alfabetização para o 2° ano e não mais no 3°.

Segundo as informações, 68,3% desses alunos também não conseguem identificar num calendário o dia da semana em que um determinado mês se inicia. Também não conseguem posicionar números de 7 a 14 em ordem decrescente.  A alfabetização foi elencada com uma das prioridades do governo do presidente Jair Bolsonaro.

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Em Língua Portuguesa dez unidades da federação ultrapassaram a média brasileira de 750 pontos: Ceará, Espírito Santo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Goiás e Distrito Federal. Os alunos que não atingiram essa pontuação não conseguem, por exemplo, localizar informação explícita em textos de até seis linhas, como bilhetes.

Em Matemática também dez atingiram a média de 750 pontos: Ceará, Pernambuco, Espírito Santo, Rio de Janeiro, São Paulo, Paraná, Rio Grande do Sul, Santa Catarina, Distrito Federal e Goiás. Quem não alcançou essa média não consegue, por exemplo, relacionar um conjunto de moedas de valores menores a uma única moeda de valor equivalente, por exemplo: cinco moedas de cinco centavos trocadas por uma moeda de 25.

O Inep divulgou os resultados do Sistema Nacional de Avaliação da Educação Básica (Saeb) para as avaliações aplicadas no 2° ano do fundamental, nas áreas de Língua Portuguesa e Matemática; e para os testes do 9° ano do fundamental em Ciências Humanas e Ciências da Natureza. Ambas as avaliações são inéditas. A matriz de avaliação levou em conta os novos parâmetros estabelecidos pela BNCC. O instituto não divulgou qual o nível de proficiência considerado "adequado" para cada um desses níveis.

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— Nosso trabalho é trazer a escala, trazer os resultados e agora abre-se para a sociedade que vai receber essas informações e aí juntos poderemos chegar ao estabelecimento do que é um patamar adequado na nossa escala de proficiência e quais as metas de onde a gente deve chegar— disse Alexandre Lopes, presidente do Inep.

De acordo com os dados, 66,8% dos alunos estão distribuídos em patamares que variam de "abaixo de 1"  até o nível 5 na prova de Língua Portuguesa. Na pior faixa estão 4,62%  dos estudantes. O fato de estarem posicionados nesse patamar indica que essas crianças não dominam praticamente nada das habilidades testadas, ou seja, não sabem nem associar sons às letras.

Na prova de matemática, 68,3% ficaram entre "abaixo de 1"  até o nível 5. No nível mais baixo foram 2,82% dos estudantes. Isso significa que não sabem usar uma régua, também não sabem reconhecer o que é um triângulo quando solicitados. Não sabem comparar o comprimento de duas cordas e dizer qual a mais curta.

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O Ministro da Educação, Milton Ribeiro, afirmou que os dados servirão para subsidiar a produção de indicadores para melhorar a qualidade da educação brasileira.

— Está na hora de o Brasil não mais olhar envergonhado para crianças de 10,11 anos que por essa ou aquela razão, que não sejam apenas sociais, mas pedagógicas, não conseguem sequer ler ou entender o que leem. Está na hora de fazermos essa virada de qualidade — disse, afirmando que baseará as políticas do MEC em evidências.

Diferenças entre o campo e a cidade

Os dados mostram a diferença entre as escolas rurais e urbanas. O índice de estudantes com pior desempenho que estudam na área rural é o dobro daqueles que estão na zona urbana no que diz respeito à avaliação de Língua Portuguesa. Enquanto 4,27% dos estudantes das cidades têm desempenho abaixo de 1, o índice chega a 8,33% no campo.

A diferença é ainda maior quando analisados os resultados de matemática: 2,52% dos estudantes têm nível abaixo de 1 na zona urbana e 6,04% na zona rural.

Gargalo nas ciências

O Inep também divulgou os resultados do Saeb para o 9º ano do fundamental. Foram analisadas pela primeira vez as áreas de Ciências Humanas e Ciências da Natureza. Segundo o órgão, 17,73% dos estudantes estão abaixo do nível 1 em Ciências da Natureza, o que significa que esses estudantes não entendem, por exemplo, a importância do uso de preservativos na prevenção da aids. O estado com maior índice de estudantes nessa condição é Roraima, com 30,9% dos alunos abaixo do nível 1.

Nessa área, 52,1% dos estudantes tiraram notas abaixo de 250 pontos, nível 2, ou seja, esses estudantes também não conseguem identificar a importância das vacinas para prevenir doenças. Apenas nove estados ultrapassaram essa pontuação, que é também a média brasileira.

Os dados mostram que 16,97% dos estudantes dessa etapa não conseguem, por exemplo, associar a alta de temperaturas com determinados períodos do ano. Também não conseguem identificar censura à liberdade de expressão em uma charge sobre a ditadura militar. Esses estudantes estão localizados no pior nível de proficiência: abaixo de 1. O estado com maior índice de alunos nesse patamar também é Roraima, com 28,7%.

No total, 51,71% tiraram menos de 250 pontos na prova, nível 2, o que mostra que esses estudantes não dentificam a manutenção de desigualdades de gênero históricas, por exemplo. Também nove estados conseguiram ficar acima da média brasileira de 250 pontos.