Mais da metade dos alunos de licenciaturas do país estão em cursos a distância

No setor privado, participação da modalidade chega a 74%; Censo da Educação Superior 2019 ainda mostra primeira baixa no total de concluintes desde 2013

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Brasília

Mais da metade dos alunos brasileiros de licenciaturas (53%), que formam professores, estão em cursos a distância, segundo dados de 2019.

Na rede privada, que concentra a maior parte das matrículas no ensino superior, sete em cada dez estudantes estão nessa modalidade.

As informações são do Censo da Educação Superior de 2019, divulgado nesta sexta-feira (23) pelo Inep (Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais), órgão do Ministério da Educação.

A baixa qualidade da formação dos futuros professores é apontada como um dos entraves para a melhoria da educação básica.

O ensino não presencial nas licenciaturas é visto com ressalvas por especialistas —a modalidade é a aposta do setor privado de ensino superior para a expansão de matrículas.

Em avaliação federal de 2017, apenas 0,5% dos cursos de formação de professores a distância tiveram nota máxima. O percentual foi de 2,5% na modalidade presencial.

De 1,7 milhão de matrículas em licenciaturas, 899.217 estão em cursos a distância. Essa proporção tem subido de forma acelerada nos últimos anos: representava cerca de um terço entre 2009 e 2013, chegou a 42%, em 2016, a 50% em 2018, até chegar a 53% em 2019.

Os dados gerais refletem o comportamento do setor privado. Universidades, faculdades e centros universitários particulares concentram 1 milhão de alunos em licenciaturas, sendo 793 mil (74%) em vagas não presenciais —até 2013, isso não passava da metade.

Em entrevista coletiva nesta sexta, o presidente do Inep, Alexandre Lopes, disse que cursos online e presenciais têm resultados similares na avaliações federais, sem comentar as especificidades da formação docente.

"Os resultados dos alunos no Enade tem sido próximos, não da para dizer que é melhor ou pior. E são realidades diferentes [dos alunos], inclusive socioeconômica, maior parte dos alunos do EAD trabalham", disse.

O ministro da Educação, Milton Ribeiro, fez apenas um discurso de abertura e saiu da entrevista sem se dispor a responder perguntas. "O professor é o grande protagonista da educação no Brasil. Nós demos atenção aos alunos, infraestrutura, métodos de ensino, mas temos que focar na área capacitando [os professores]", disse.

O professor da Faculdade de Educação da UFF (Universidade Federal Fluminense) Paulo Carrano diz que não se pode cair em uma polarização em que necessariamente o presencial é melhor que o EAD. Mas, diz ele, é preciso olhar para desafios, como a falta de formação específica dos professores para a modalidade.

"Sabemos que a expansão do setor privado, ainda que não perca de vista a busca da qualidade, porque o mercado cobra isso, tem parâmetros de lucro, e precisa botar na balança a qualidade que atraia clientela e, ao mesmo tempo, a maximização dos lucros".

O ensino superior brasileiro registrou, no total, 8.603.824 matrículas em 2019, um avanço de 2% com relação ao ano anterior. Em 2019, 76% dos estudantes universitários estavam em instituições privadas.

Avaliações federais da etapa têm mostrado qualidade inferior das faculdades privadas. No último Enade, divulgado nesta semana, só 1% dos cursos particulares avaliados em 2019 obteve nota máxima, contra 24% nas federais.

O pequeno aumento no total de matrículas no ano passado ocorre, sobretudo, por causa do aumento de matrículas nos cursos a distância no setor particular. Houve um incremento de 409 mil matrículas em relação ao ano anterior.

As graduações não presenciais já concentram 28% das matrículas no ensino superior como um todo. Atingem 35% dos alunos ao se olhar apenas o setor privado, levando em conta todas as carreiras.

Os dados refletem cenário anterior à pandemia do novo coronavírus, que causou impacto na manutenção de estudantes e na oferta de educação remota.

Rodrigo Capelato, diretor-executivo do Semesp (Sindicato das Entidades Mantenedoras do Ensino Superior), ressalta a necessidade de discussão da qualidade do ensino a distância na formação dos professores, mas aponta outro sintoma preocupante.

"O aluno do EAD é mais velho, que muitas vezes já está trabalhando e decide fazer pedagogia para um reposicionamento. Parece mais grave que os mais jovens, que acabaram sair do ensino médio, não estão entrando nos cursos presenciais para ser professor".

É esperado que o EAD continue crescendo, o que reforça, para ele, a necessidade de alterar as regras do MEC de credenciamento exclusivo para EAD para evitar concentração de oferta. Hoje, somente 308 instituições privadas oferecem a modalidade, contra 1.998 que não têm liberação.

"É fundamental evitar concentração e ampliar possibilidade de ofertas para termos mais modelos", diz.

"O EAD tem de melhorar, ampliar a oferta, aperfeiçoar processos de avaliação, mas, por outro lado, não da para colocar como o caminho para o setor porque o presencial é o que consegue chegar no jovem."

Capelato reforça que ​o governo precisa investir em políticas de inclusão. Tanto Capelato quanto Carrano chamam a atenção para a baixa atratividade da carreira docente, que não aparece entre as primeiras opções entre os jovens que saem do ensino médio.

O Censo 2019 ainda mostra que o país registrou a primeira baixa no número total de alunos concluintes desde 2013. As instituições públicas e particulares formaram 1.250.076 pessoas, queda de 1% em relação ao ano anterior.

Houve redução nas matrículas na média das instituições públicas (federais, estaduais e municipais) e também nas particulares.

O maior impacto, entretanto, vem da queda de concluintes, a primeira desde 2015, em cursos presenciais do setor privado, que passaram de 747.965, em 2018, para 694.831 —retração de 7%.

Já o total de alunos ingressantes em 2019 no ensino superior foi de 3.633.320, número 5% superior ao de 2018. Apesar da alta, o ritmo é menor do que o registrado nos dois anteriores, quando o crescimento fora de 7% em 2018 e 8% em 2017.

No ano passado, 44% dos novos alunos ingressaram em cursos a distância. Percentual que era, por exemplo, de 24% em 2015.

O curso com maior volume de matrículas no país em 2019 continua sendo o de direito, com 831.350 alunos. A posição é registrada desde 2014.

Na sequência, aparecem Pedagogia (815.350 matrículas) e Administração (645.777).

O Censo ainda mostra um aumento das matrículas de alunos com deficiência no ensino superior. Em 2009, eram 20.530 alunos (0,34% do total de alunos) e, no ano passado, chegou a 48.520 (0,56%). Estudantes com deficiência física, baixa visão e deficiência auditiva concentram essas matrículas.

As universidades federais somaram 1.335.254 matrículas no ano passado, 1% a mais do que em 2018. Na comparação com 2009, a rede federal teve um incremento de 495.857 matrículas —alta de 59%.

Nas instituições privadas, foram criadas 2.093.521 matrículas no período —um crescimento de 47%.

A proporção de adultos com ensino superior no Brasil é uma das piores do mundo, atrás de países como México, Argentina, Colômbia, Chile e Turquia.

No Brasil, 14,3% dos adultos entre 55 e 64 anos têm ensino superior, o que chega a 21,3% na faixa etária entre 25 a 34 anos.

No México, por exemplo, a proporção entre os mais velhos é até menor que no Brasil, mas chega a 23,6% na faixa etária de 25 a 34 anos. É de 29,9% na Colômbia, nesse mesmo intervalo de idade, de 33,7% no Chile, 35,3% na Turquia e de 40% na Argentina.

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