Brasil Educação

Maioria dos alunos do ensino técnico não trabalha em sua área

Pesquisa aponta que apenas 25% dos estudantes de escolas técnicas acabam em empregos deste nível; desconexão com o mercado de trabalho e preferência por seguir para a educação universitária explicam baixa adesão
Descompasso entre ensino médio técnico e mercado de trabalho faz com que apenas 25% dos alunos ocupem vagas ligadas a suas formações Foto: Divulgação
Descompasso entre ensino médio técnico e mercado de trabalho faz com que apenas 25% dos alunos ocupem vagas ligadas a suas formações Foto: Divulgação

RIO — Um estudo divulgado recentemente pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) mostra um descompasso na educação brasileira: somente 25% dos estudantes formados em cursos de nível médio técnico do país acabam trabalhando em ocupações que requerem esse tipo de formação.

A realidade demonstrada pela pesquisa é uma preocupação que também é expressa por educadores: o ensino precisa ser repaginado e alinhar os ponteiros com o mercado de trabalho.

De acordo com o levantamento, quando uma pessoa com formação técnica ocupa uma vaga específica para esse tipo de qualificação, seus rendimentos tendem a aumentar em média 25%. Apesar disso, essas posições continuam não atendendo ao público para o qual são destinadas.

O pesquisador Maurício Reis, um dos autores do estudo, afirma que o ensino técnico brasileiro está desconectado das demandas do mercado e que muitos cursos estão obsoletos. A crítica é antiga também entre os educadores e foi, inclusive, uma das justificativas para embasar a necessidade de uma reforma no ensino médio  brasileiro.

— Esse é um tipo de curso que visa ensinar as pessoas a desempenhar determinadas ocupações, é importante que a sintonia com o mercado de trabalho seja forte — afirma Reis.

O ensino técnico tem recebido atenção especial nos últimos anos. Em 2014, o Plano Nacional de Educação (PNE) estabeleceu que, até 2024, o Brasil deve alcançar cerca de 5,2 milhões de matrículas de educação profissional de nível médio. Atualmente, há 1,9 milhão, de acordo com o último Censo Escolar.

Em 2016, com a reforma do ensino médio, a educação profissional ganhou destaque. A partir da nova lei, a etapa deve permitir que os alunos escolham o caminho para sua formação entre cinco áreas: Ciências Humanas, Ciências da Natureza, Matemática, Linguagens ou formação técnica e profissional.

Embora tenha dado indícios de que pretende privilegiar a formação profissional no Brasil, o novo ministro da Educação, Ricardo Vélez Rodríguez, ainda não esboçou publicamente os planos para etapa. Em entrevistas, citou apenas que analisava o modelo alemão .

Planejamento

A educadora Mônica Gardelli, diretora-executiva do Centro de Estudos e Pesquisas em Educação, Cultura e Ação Comunitária (Cenpec), diz que a reforma pode ser uma oportunidade para fortalecer esse tipo de ensino, mas ressalta que é necessário que a implementação seja feita de forma planejada.

— É preciso um diagnóstico do local onde a escola está inserida para identificar qual a qualificação profissional demandada pela região. Não adianta um jovem ser formado em tecnologias de comunicação, por exemplo, e na região dele não ter demanda para essa área. Sem esse planejamento, continuaremos com essa distorção de vagas do mercado ocupadas por pessoas sem qualificação — opina Gardelli.

O estudo do Ipea mostra que pessoas sem formação técnica têm um ganho de apenas 6% no salário quando atuam em uma vaga para a qual essa qualificação é exigida. Já os que têm formação técnica para a vaga ganham 25% a mais.

Além da desconexão com o mercado, outra hipótese que explica a falta de técnicos ocupando vagas específicas para sua formação é a busca pelo ensino superior. Muitos alunos concluem a formação técnica e partem para a universitária em seguida, trabalhando depois em funções que exigem esse nível.

Segundo os especialistas, essa é uma evidência de que os jovens brasileiros não têm uma perspectiva de formação para o mercado de trabalho.

— Temos que entender o curso técnico com uma visão mais emancipatória, como um começo do ingresso do jovem no mercado. Ele ainda é visto como uma função menos qualificada do que o curso superior. Novas maneiras de formar e seguir aprendendo precisam ser construídas — defenda Ana Inoue, assessora de educação do Itau BBA.