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Política Jair Bolsonaro

Líder do governo Bolsonaro diz que ensino domiciliar é a primeira pauta da agenda conservadora

Deputado Ricardo Barros afirma que proposta é a mais 'madura' para avançar
Jair Bolsonaro participa de formatura de militares no Rio, no Centro de Instrução Almirante Alexandrino Foto: Marcelo Regua / Agência O Globo
Jair Bolsonaro participa de formatura de militares no Rio, no Centro de Instrução Almirante Alexandrino Foto: Marcelo Regua / Agência O Globo

SÃO PAULO E RIO – Entre as pautas direcionadas ao eleitorado conservador que integram a lista enviada pelo presidente Jair Bolsonaro ao Congresso, o projeto de lei que oferece a possibilidade de ensino domiciliar deve receber prioridade. Segundo o líder do governo na Câmara, Ricardo Barros (PP-PR), trata-se da proposição que, em sua avaliação, encontra-se mais avançada em questão de discussão.

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Apresentado pelo deputado Lincoln Portela (PL-MG) em 2012, o projeto de lei aguarda constituição de Comissão Temporária pela Mesa desde dezembro de 2019.

— Ainda não estudei a lista toda, mas vamos começar pelo homeschooling (ensino domiciliar). Consultando os líderes, entendo que é a que está mais madura — declarou Barros.

O deputado disse não ter recebido nenhuma orientação especial de Bolsonaro para a missão de aprovar a agenda, e que foi dele o “feeling” sobre por onde começar. Barros se esquivou de cravar a viabilidade de outros projetos tramitarem.

O ensino domiciliar foi abraçado pela ala mais ideológica do governo Bolsonaro, em especial pela ministra da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos, Damares Alves. A Associação Nacional de Ensino Domiciliar (Aned) estima que cerca de 7.500 famílias praticam o homeschooling no país. A prática, porém, tem sido criticada por educadores e já foi considerada ilegal pelo Supremo Tribunal Federal (STF) até que haja lei sobre o tema.

Professora do departamento de Psicologia da Educação da Universidade Estadual Paulista (Unesp), Luciene Tognetta ressalta que a convivência social no ambiente escolar é fundamental para o desenvolvimento de crianças e adolescentes:

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– O domínio da relação com os pais é do particular, do privado, que se diferencia do professor, que atua no espaço público. A própria pandemia já mostrou que ser pai não é a mesma coisa que ser professor. Se assim fosse, não haveria necessidade de especialização, de teorias e métodos sobre o processo de aprendizagem. Com o homescholing, se tira a oportunidade de experiência social e pública. Tira-se a possibilidade de conviver com diferentes ambientes e valores. A experiência de poder experimentar a diversidade, de contrapor pontos de vista, dificilmente será dada à criança apenas na família.

Falta de articulação

A iniciativa do Palácio do Planalto, no entanto, encontrará barreiras para avançar. Bolsonaristas na Câmara ainda não se encontraram para debater a aprovação desses projetos e, para o líder do governo no Congresso, o senador Eduardo Gomes (MDB-TO), a agenda está em "banho-maria":

— Neste momento, vai ter muito mais um avanço em termos de tramitação do que de mérito. Mas pode surgir uma nova tendência — afirmou.

A falta de articulação ficou mais evidente quando o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ) atacou nas redes sociais, nesta semana, o deputado Julian Lemos (PSL-PB), por ele ter comparecido à festa do novo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL) – Lemos defendeu o voto em Baleia Rossi (MDB-SP), que foi derrotado. O deputado, no entanto, é relator de um dos projetos que fazem parte da lista de prioridades de Jair Bolsonaro: o texto que endurece pena para abuso sexual de menores.

— Quando eu vi a lista de prioridades, eu percebi que era o meu projeto, mas o presidente nem deve saber que eu sou o relator dele — afirmou Lemos.

Especialista critica ampliação do porte

Há também no documento entregue por Bolsonaro propostas que ampliam o porte de arma – direito de andar armado na rua – para uma série de categorias profissionais e a ampliação do excludente de ilicitude para militares em operações de Garantias da Lei e da Ordem (GLO). Para o diretor-presidente do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, Renato Sérgio de Lima, a flexibilização do porte representa um “boicote da política de segurança pública”, uma vez que o país falha na rastreabilidade desses equipamentos e munições. Sobre o excludente de ilicitude, o especialista avalia a medida como “inconstitucional e antidemocrática”.

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— A gente podia debater isso (ampliação do porte) se o país tivesse fiscalização das armas. Se não há rastreabilidade, como vamos dar conta do esclarecimento dos homicídios que voltaram a crescer no país, de saber para onde a munição comprada foi parar? Então, são eliminados controles, possibilidade de rastreio e se estimula o consumo de armamento de poder letal. Não é só liberar arma, mas é um liberou geral em nome de um individualismo atroz que coloca qualquer um em risco – afirma Lima, acrescentando. — É uma atribuição do Ministério Público decidir se reconhece ou não se a ação do policial é excludente e se vai ou não oferecer a denúncia contra os envolvidos (caso haja morte durante uma operação). O projeto fala que tudo é excludente de ilicitude e dá a quem puxa o gatilho, isto é a polícia, essa decisão. Não se dá autonomia para uma instituição de força em nenhuma democracia do mundo — afirmou Lima.