Laura Mattos

Jornalista e mestre pela USP, é autora de 'Herói Mutilado – Roque Santeiro e os Bastidores da Censura à TV na Ditadura'.

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Grupos de WhatsApp de mães e a difícil comunicação entre escolas e famílias

Há ponderações pedagógicas, como o temor de que tirem a autonomia dos alunos, uma vez que há troca de informações sobre a vida escolar

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Pode ser escola moderninha, democrática, o que for. Para qualquer uma, mesmo para as que preferem negar, grupos de WhatsApp de mães, dez anos depois da criação do aplicativo, seguem dando dor de cabeça.

Não julguemos se são úteis ou não, se é certo ou errado fazer parte, mas é fato que os educadores não morrem de amor por eles.

Há ponderações pedagógicas, como o temor de que tirem a autonomia dos alunos, uma vez que as famílias trocam informações sobre lições e roteiros de estudo para provas, por exemplo.

Grupos de WhatsApp
Grupos de WhatsApp - 20.08.2019 - Dado Ruvic/Reuters

Alerta-se para o fato de crianças deixarem de anotar compromissos dizendo que “minha mãe pega no grupo”. Reclama-se mais, contudo, do potencial de se criar complôs, quase sempre a partir de falhas de comunicação.

Diretor do ensino médio do Santa Maria, em Interlagos (zona sul de São Paulo), Silvio Freire enfrentou uma avalanche de questionamentos quando alguém compartilhou que uma das turmas faria um estudo do meio (como são chamados passeios com fins pedagógicos) em um assentamento do MST, o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

Em pouco tempo, já circulavam mensagens de toda sorte, até uma dizendo que a escola levava todos os alunos para lá anualmente, sem autorização dos pais, para doutriná-los contra a propriedade privada. Histórias assim não são raras por aí.

Além dos grupos de cada sala, são comuns aqueles maiores, que reúnem mães (há pais também, mas são minoria) de diferentes anos escolares.

No Santa Maria, o nome de um deles dá uma pista do perfil dessas comunidades: “Não somos Santa”. Fica claro, ao mesmo tempo, que não se trata de um grupo oficial da escola e que sua proposta é manter postura crítica.

Problema nenhum, desde que postura crítica não se confunda com oposição sistemática e sem reflexão. O que muitas vezes ocorre em universos tão amplos e heterogêneos.

Surgem conflitos e julgamentos que colocam no banco dos réus tanto a escola e os professores, como as próprias famílias e até as crianças.

Os colégios testam as mais variadas formas de lidar com isso. Em grande parte, no Santa Maria inclusive, a estratégia é chamar pais e mães para conversas pessoalmente, a fim de desfazer mal-entendidos.

Fazem palestras, debates, criam códigos de ética. Alguns se arriscam a oficializar os grupos, administrando-os com professores e coordenadores, que procuram moderar a troca de mensagens.

É o caso de algumas escolas Waldorf, em que há muitas atividades que demandam a participação das famílias, e o WhatsApp ajuda.

Isso não evita, entretanto, que se criem os grupos extraoficiais, sem funcionários da escola e com mais liberdade para as conversas.

A regra do “já que não se pode vencê-los, junte-se a eles”, portanto, nem sempre funciona. Mais do que isso, usar o WhatsApp como ferramenta oficial é arriscado, na opinião da advogada Patricia Peck, presidente do Instituto iStart, que desde 2010 realiza palestras em colégios sobre segurança e ética digital.

Nos grupos não há regras ou limites de horário. Educadores e gestores escolares são expostos a ter de dar respostas a qualquer hora ou a se posicionar sobre questões delicadas. Misturam-se o lado pessoal e o profissional, embaralhando o que é ou não institucional.

Na busca por uma comunicação eficiente, cresce o mercado de aplicativos como o Agenda Edu e o ClassApp. Ali estão comunicados, cobranças e pagamentos, autorização para passeios, lições de casa, boletins etc. Alguns têm canais de contato com professores e coordenadores, com horários determinados.

O Agenda Edu é usado por 1.800 escolas no Brasil e o ClassApp, por 500. Vendem-se como instrumentos para o engajamento das famílias no ambiente escolar, contando até com apoio de fundações ligadas à educação.

Vale ressalvar, porém, que estão concentrados na rede particular, que pode pagar por eles. E principalmente que a relação entre família e escola ainda passa muito longe da ideal.

Quando pais e mães se portam como consumidores e colégios, como fornecedores de mercadoria, não há agenda de papel, grupo de WhatsApp ou o melhor dos aplicativos educacionais que dê conta do recado.

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