Brasil

Juízes e desembargadores contrariam STF e derrubam passaporte da vacina em universidades

Em fevereiro, Supremo decidiu que as instituições federais de ensino superior tinham autonomia para exigir comprovante de imunização da Covid para aulas presenciais
Universidade Federal de Uberlândia: após ordem judicial, alunos foram liberados de apresentar passaporte vacinal Foto: Divulgação
Universidade Federal de Uberlândia: após ordem judicial, alunos foram liberados de apresentar passaporte vacinal Foto: Divulgação

Contrariando decisão do Supremo Tribunal Federal (STF), juízes e desembargadores têm derrubado o passaporte da vacina exigido por universidades federais. Medidas desse tipo foram tomadas nos últimos quinze dias em Minas Gerais, Rio Grande do Norte e Mato Grosso.

Em fevereiro, o STF decidiu que as universidades federais tinham autonomia para optar pela exigência ou não do comprovante de vacina contra Covid para os alunos assistirem às aulas presenciais. Cinquenta e três das 69 instituições de ensino superior federal exigiram o passaporte.

Na Universidade Federal de Uberlândia (UFU), o juiz Osmar Vaz de Mello da Fonseca Júnior, do Tribunal Regional Federal da 1ª Região, voltou atrás da decisão que havia tomado apenas dez dias antes a favor da exigência e barrou a obrigatoriedade de comprovante da vacinação na instituição. De acordo com o magistrado, “embora reconhecida a responsabilidade e boa intenção na edição da norma”, ele decidiu reconsiderar sua posição por nenhum outro local público ter as mesmas exigências e também porque os demais cuidados sanitários foram relaxados na cidade.

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— O passaporte vacinal é ainda mais importante neste momento em que as medidas de proteção, como máscara e distanciamento, estão sendo afrouxadas — avalia o infectologista André Giglio Bueno, da PUC de Campinas. — Se todo mundo está vacinado numa sala, ainda que as outras medidas estejam relaxadas, você tem mais segurança naquele ambiente porque o vírus encontrará mais barreiras para conseguir circular.

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Segundo o especialista, a despeito de o Brasil estar num momento melhor da pandemia, os números de casos diários — em torno de 17 mil, segundo o consórcio de imprensa, em média — não podem ser considerados como controlados.

— Também precisamos olhar o contexto internacional. Países da Europa e da Ásia estão vivendo novas ondas que devem servir de alerta para o Brasil. Uma pessoa vacinada tem uma proteção boa contra internações e morte, mas ainda assim podem apresentar sintomas até fortes — diz o infectologista.

A universidade informou que recorreu da decisão. A avaliação interna é a de que, por causa da manifestação já tomada pelo STF favorável à autonomia universitária, há boas chances de que a norma volte a valer. As aulas presenciais voltam em maio na instituição.

A UFU havia determinado que alunos e servidores que recusaram a vacina seriam chamados a uma Comissão de Mediação, com o objetivo de ouvir esses membros da comunidade acadêmica e esclarecê-los a respeito da importância da vacinação para a convivência social e a saúde coletiva. Mantida a recusa, poderiam ser punidos até com a perda do semestre letivo.

O procurador responsável pela ação em Uberlândia é o mesmo que entrou na Justiça pedindo que a vacinação infantil contra Covid não seja obrigatória no país. Ele alega que os estudos da vacina são experimentais, o que não é verdade, segundo a Anvisa.

Atualmente, quatro vacinas são utilizadas pelo Plano Nacional de Imunização (PNI) para imunizar a população brasileira (Pfizer, Janssen, CoronaVac e Oxford/AstraZeneca) e todas elas passaram pelo crivo da agência antes de serem disponibilizadas à população. A ampla análise da Anvisa considerou não só informações sobre eficácia, mas também sobre a segurança dos imunizantes.

Interpretação no RN

Na Universidade Federal do Rio Grande do Norte, uma liminar assinada pelo desembargador federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, do Tribunal Federal Regional da 5ª Região, suspendeu a exigência do comprovante vacinal contra a Covid. A universidade foi notificada na última sexta-feira.

O magistrado diz que “a matéria já foi resolvida em sede de Suprema Corte que deixou assentado somente ser possível a exigência de passaporte sanitário através de lei formal que, no caso, inexiste”. Ele também afirma que “ninguém é obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de lei, daí que a exigência combatida é de ilegalidade manifesta”.

— Na decisão que trata especificamente do passaporte vacinal exigido por instituições federais de ensino, não há essa manifestação do STF. Essa manifestação no Rio Grande do Norte pode ter se baseado em alguma interpretação, a meu ver equivocada, de outros precedentes — afirma Felipe Correa, um dos advogados que participaram da ação no Supremo, movida pelo PSB, que terminou com a decisão em plenário favorável ao passaporte vacinal nas universidades.

No final de março, a Justiça Federal também determinou que a Universidade Federal de Mato Grosso (UFMT) deveria suspender a exigência da apresentação do passaporte da vacina para o retorno das aulas presenciais. Segundo o juiz que analisou o pedido, a exigência do comprovante vacinal na universidade fere a hierarquia das normas e causa ilegalidade na resolução expedida pela instituição de ensino.

A decisão foi tomada uma semana depois da publicação do acórdão do STF no qual o relator Ricardo Lewandoski, que foi seguido integralmente por oito dos outros ministros, afirma que “as instituições de ensino têm autoridade para exercer a autonomia universitária e legitimamente exigir a comprovação de vacinação”.