Brasil

Jovem autista é um dos medalhistas de ouro da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas

Gabriel Barroca, que faz a maior parte dos cálculos de cabeça, teve que driblar essa habilidade na competição, que exige que os alunos expressem raciocínio no papel
Estudante teve professores que atribuíam seu comportamento a falta de interesse Foto: Divulgação
Estudante teve professores que atribuíam seu comportamento a falta de interesse Foto: Divulgação

SALVADOR — As páginas quase sempre em branco no caderno de Gabriel Barroca, 13 anos, não dão pistas de que o material pertence a um medalhista de ouro da Olimpíada Brasileira de Matemática das Escolas Públicas ( Obmep ). Aluno do 8° ano de uma escola de Vitória, no Espírito Santo, Gabriel faz a maior parte dos cálculos de cabeça. Ele precisou driblar essa característica para participar da competição, que exige na segunda fase dissertativa que os alunos expressem seu raciocínio no papel. A genialidade do estudante só teve chances de ser reconhecida depois que sua mãe, Andreza Barroca, 47 anos, conseguiu que o filho, que é autista, tivesse um tempo de prova extra para resolver as questões.

Segundo o regulamento, a Obmep disponibiliza uma hora a mais para estudantes com deficiência. A inclusão, na visão de sua mãe, foi fundamental no resultado.

— É muito raro ele abrir a mochila e tirar o material na escola, ele aprende pelo ouvido. Para ele é uma dificuldade muito grande justificar a resposta por escrito. Uma vez eu perguntei o motivo e ele disse que não escrevia para que as pessoas não soubessem o que ele pensa.

Em sua 14ª edição, a Obmep registrou no ano passado a participação de 18,2 milhões de alunos na primeira fase, dos quais 952.782 foram classificados para a segunda etapa. Neste ano, foram concedidas 575 medalhas de ouro, entregues ontem, em Salvador. Todos os anos a Obmep premia estudantes em três categorias — nível um (6° e 7° anos do ensino fundamental), dois (8° e 9° anos) e três (ensino médio) — com medalhas de ouro, prata e bronze.

Se os cálculos complexos da disciplina não foram um problema para Gabriel, o mesmo não pode ser dito sobre seu ambiente escolar. Diagnosticado com o transtorno aos 8 anos, o medalhista foi alvo de bullying e chegou a fugir da escola depois que os colegas o cercaram e tiraram sua roupa. Após uma troca de turno, Gabriel conseguiu desenvolver suas habilidades.

Além da rejeição de parte dos colegas, o estudante teve professores que atribuíam seu comportamento à falta de interesse.

— Ele não demonstrava interesse em nada. Comecei a pensar “para onde ele vai?”. Quando se tem um filho, se pensa no futuro dele. Quando é um filho com um laudo médico, começamos a achar que não vai conseguir, ou só terá subempregos. De repente, ele mostra seu potencial, e isso prova que você está no caminho certo. O meu sonho é ver o Gabriel saindo da bolha — conclui Andreza.