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Marcos Pinto

Investindo no futuro

Poucas políticas públicas podem fazer tanto com tão pouco como o programa Pé-de-Meia

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Marcos Pinto

Secretário de Reformas Econômicas do Ministério da Fazenda

O programa Pé-de-Meia, do Ministério da Educação, pode romper o círculo vicioso que perpetua a desigualdade social no Brasil. Além de combater a pobreza, por meio de bolsas pagas aos alunos mais pobres, desestimula a evasão escolar e promove a igualdade de oportunidades, oferecendo uma poupança para os jovens que concluírem o ensino médio. De quebra, o programa eleva a produtividade da economia, gerando mais crescimento econômico.

Infelizmente, a pobreza no Brasil está concentrada entre os mais jovens. Segundo dados do IBGE, cerca de 40% das crianças e adolescentes brasileiros pertencem a famílias pobres. Isso mesmo: 4 em cada 10 crianças vivem na pobreza. Sem apoio do Estado, só metade delas completa o ensino médio. Ou seja, 1 em cada 2 jovens pobres abandona a escola sem completar sua formação básica.

Estudantes de ensino médio durante aula no Recife - Leo Caldas - 9.ago.2023/Folhapress - Folhapress

Sem educação formal, esses jovens têm poucas chances de progredir economicamente. Segundo estudo de Diogo Britto e outros pesquisadores, é de apenas 2,5% a probabilidade de uma criança nascida numa família pobre migrar para o grupo dos 20% mais ricos do país. Mesmo as chances de migrar para a metade mais rica da população são baixas: inferiores a 30%. Sem igualdade de oportunidades na infância e na adolescência, a mobilidade social se torna um mito.

Isso gera uma perda econômica enorme, não só para os jovens, mas para o país como um todo. Estudos indicam que alunos que abandonam a escola são menos produtivos, ganham menos, são mais propensos à violência e têm expectativa de vida menor. Segundo os economistas Ricardo Paes de Barros e Laura Machado, a evasão escolar gera uma perda de 3% do PIB para o país. Ou seja, perdemos R$ 300 bilhões ao ano só por conta da evasão.

O Pé-de-Meia procura romper esse círculo vicioso intergeracional, que perpetua a pobreza, limita a mobilidade social e gera enormes perdas econômicas para o país. Ao conceder uma bolsa mensal de R$ 200 aos alunos pobres do ensino médio, o programa alivia a pobreza justamente na faixa etária onde ela mais se concentra: entre crianças e adolescentes.

Além disso, o programa concede a esses alunos uma poupança que os incentiva a continuar na escola. No começo de cada ano letivo, o governo Federal deposita R$ 1.000 numa conta em nome do aluno. Se o estudante evadir-se, perde a poupança. Por outro lado, se concluir o ensino médio, poderá sacar o valor integral, acrescido dos juros incorridos durante todo o período.

A lógica do Pé-de-Meia está baseada em estudos de finanças comportamentais que indicam que as pessoas, sobretudo as mais jovens, sentem mais quando perdem algo do que quando deixam de ganhar. Por isso, os depósitos na poupança do programa são feitos no início de cada ano. O aluno não ganha um prêmio se concluir os estudos; ao contrário, ele perde algo que já era seu se decidir abandonar.

Iniciativas similares ao Pé-de-Meia já foram testadas em outros países, como Israel e Colômbia, e em alguns estados brasileiros, como Rio de Janeiro e Piauí. Com base nessas experiências, um estudo do economista Vitor Pereira indica que a poupança criada pelo Pé-de-Meia pode reduzir a evasão escolar em um terço. Isso mesmo: o programa pode evitar que 1 em cada 3 jovens deixe a escola.

Além de estimular os jovens a concluir o ensino médio, o programa lhes dá acesso a uma reserva financeira para iniciar sua vida adulta. Esse "pé-de-meia" pode ajudar o jovem a iniciar uma faculdade, abrir um negócio ou mesmo procurar estudo ou emprego em outra localidade. Dessa forma, o programa mitiga a enorme desigualdade de oportunidades que impera no país.

Seria um grande equívoco encarar o Pé-de-Meia como um simples gasto do governo; na verdade, é um investimento de altíssima qualidade. Poucos projetos, públicos ou privados, têm uma taxa de retorno tão elevada como a poupança criada por ele. Nos cálculos do Ministério da Fazenda, cada R$ 1 gasto com essa poupança haverá um retorno de R$ 7 para o país.

O programa custará, ao ano, menos de 0,1% do PIB. Só para se ter uma ideia, o Brasil gasta cerca de 5% do PIB por ano com incentivos fiscais que não têm eficácia comprovada. Poucas políticas públicas podem fazer tanto com tão pouco como o Pé-de-Meia. Implementá-lo é investir de forma inteligente e responsável no futuro do país.

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