RIO — Educadores ouvidos pelo GLOBO fizeram uma análise das notas do Enem 2017 (Exame Nacional do Ensino Médio), divulgadas nesta quinta-feira. Eles destacam que o nível de dificuldade do exame foi parecido com o do ano anterior nas provas de Linguagens e Ciências Humanas, no entanto, foi justamente nessas áreas que os candidatos registraram queda na média de notas. Entre 2016 e 2017, a média em Linguagens passou de 520,5 para 510,2. E, em Ciências Humanas, passou de 533,5 para 519,3, no mesmo período.
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Queda de notas 'frustrante' em Linguagens
Marco Laurindo, professor dos cursos Sabin Med Isoladas e Linguagens Mais, definiu como "frustrante" a queda nas notas da prova de Linguagens e Códigos do Enem 2017. Se em 2016, os candidatos alcançaram média de 520,5, ano passado a pontuação média caiu ligeiramente para 510,2.
— Eu considerei que a prova do Enem 2017 veio num nível muito parecido com a da edição anterior. Havia, portanto, uma expectativa de que os candidatos conseguissem aumentar a nota média, o que não aconteceu — afirma ele.
Em áreas como Matemática e Ciências da Natureza, as notas médias cresceram: na primeira, passou de 489,5 para 518,5; e na segunda, de 477,1 para 510,6. Laurindo observa que é mais recorrente as notas nessas áreas de exatas subirem, de uma edição do Enem para a outra, do que o mesmo acontecer na área de Linguagens.
— Atribuo isso ao fato de a grande maioria dos candidatos "desprezarem" Linguagens. Em geral, eles acham que, sabendo interpretar textos, eles não terão problemas com Linguagens, e conseguirão se virar mesmo sem estudar muito. Passam a treinar incessantemente para matemática, física e química, que são as matérias nas quais é mais comum ter dificuldade, e deixam de lado o português — avalia o professor. — No entanto, nos últimos anos, o Enem tem cada vez mais exigido não só interpretação, mas conteúdo.
Aumento em Matemática está relacionado a redução do número de candidatos
Para Bruno Rabin, diretor acadêmico do Colégio e Curso de A a Z, a explicação para o aumento das notas nessas áreas está na redução no número de participantes:
— A explicação tem a ver com o fato de que houve menos inscritos, menos pessoas fazendo o Enem. Quando há uma redução no número de participantes, ela não acontece no topo, mas sim na base, ou seja, aqueles alunos que fariam a prova por fazer e não estão preocupados com a nota. Como eles não fizeram, a média se desloca um pouco para cima.
Ainda que tenham registrado aumento nas médias em relação ao ano anterior, Matemática e Ciências da Natureza continuam sendo as áreas com pior desempenho. De acordo com Rabin, isso tem relação com uma deficiência histórica na Educação brasileira.
— Historicamente, aqui no Brasil, matemática, física e química atraem menos interesse. É difícil encontrar professores de física, por exemplo. Em outros países, há uma cultura muito ligada ao ensino de matemática, o que não é nosso caso. Em geral, muitos alunos não recebem estímulo da família durante a educação básica para essa área. Outros não têm carga horária suficiente ou ainda enfrentam falta de professores — explica.
A presidente do Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), Maria Inês Fini, considerou as flutuações das notas dentro do esperado e registrado em séries históricas. Até mesmo em relação a Matemática, um gargalo da educação básica brasileira, que teve aumento de 489,5 para 518,5 na proficiência média, Fini disse que “não surpreendeu”. Questionada se aponta uma melhora importante, respondeu:
— Estatisticamente, não foram muito melhores.
Ciências da Natureza: prova foi mais difícil, mas teve média maior
Segundo Allan Rodrigues, professor de química do Descomplica, a prova de Ciências da Natureza de 2017 teve grau de dificuldade maior que nos anos anteriores. Por isso, esperava-se que a média da área neste ano fosse inferior que a das últimas edições. A explicação para o contrário ter acontecido pode ser o tipo de correção que é feito no Enem, que segue a Teoria de Resposta ao Item (TRI).
— É muito difícil olhar o resultado do exame e, a partir dele, entender o grau de dificuldade da prova ou de que tipo ela foi. A correção segue um modelo estatístico. É possível que a maioria dos candidatos tenha acertado poucas questões e, por isso mesmo, pelo nivelamento feito entre eles, a média tenha sido essa — explica o professor.
Ciências Humanas: médias caíram pela dificuldade da prova
Em Ciências Humanas, as notas médias caíram de 533,5 em 2016 para 519,3 na última edição do exame. Para o professor de Filosofia e Sociologia Ênio Mendes, do curso QG do Enem, a prova não foi mais difícil que na edição anterior, mas exigia conhecimentos específicos além da interpretação de texto.
— Para quem acreditava que poderia responder às questões apenas interpretando o texto, não funcionou — comentou Mendes. — Pelo menos na minha área, a prova exigia conhecimento sobre os autores, os pontos centrais de seus pensamentos.