Economia

‘Há uma tendência de reprodução da exclusão’, diz representante da ONU

Para Anna Cunha, recessão dificulta inserção na vida adulta de forma saudável, segura e produtiva. Com isso, jovens deixam de alcançar todo o seu potencial

Anna Cunha, atua na coordenação do Grupo Assessor de Juventude do Sistema ONU no Brasil
Foto: Jorge Salhani/UNFPA Brasil
Anna Cunha, atua na coordenação do Grupo Assessor de Juventude do Sistema ONU no Brasil Foto: Jorge Salhani/UNFPA Brasil

Rio- Para Anna Cunha, oficial do Fundo de População das Nações Unidas e uma das coordenadoras do grupo Assessor de Juventude da ONU, crises econômicas podem impedir que jovens que estão na base da pirâmide de renda rompam o ciclo de pobreza.

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Como as recessões afetam o jovem?

Ele deixa de ter condições de passar de forma saudável, segura e produtiva da adolescência para a fase adulta e não consegue alcançar todo o seu potencial. E, no caso do Brasil, temos neste momento uma situação demográfica benéfica para a economia, que só ocorre uma vez na História, na qual a população em idade de trabalhar é maior do que a que não está em idade ativa. É preciso intensificar os investimentos na juventude, em educação, saúde, formação e qualificação profissional, para que seu potencial se concretize em uma contribuição para impulsionar a economia.

Estamos comprometendo uma geração?

Quando uma geração, diferentemente da dos pais, é capaz de contar com uma educação de maior qualidade e formação profissional que a leve a um emprego digno e qualificado, mesmo que tenha tido uma trajetória de obstáculos, consegue romper esse ciclo de pobreza. Do contrário, como ocorre agora, você tem uma tendência de reprodução da exclusão e da pobreza. São desigualdades enfrentadas anteriormente que vão se reproduzindo ao longo do tempo.

Como o desemprego piora esse quadro?

Elevados níveis de desemprego entre os jovens podem marcar negativamente a trajetória profissional. Essas primeiras experiências são definidoras. Jovens desempregados deixam de acumular experiência profissional. E jovens sem experiência tendem a aceitar empregos de pior qualidade, na informalidade.

Qual é a sua avaliação sobre as políticas de emprego voltadas para esse grupo no país?

O país tem feito progressos nos últimos anos, mas permanecem desafios. Há subgrupos de maior vulnerabilidade entre os jovens, com dificuldades ainda maiores de inserção, como adolescentes com filhos que são discriminadas e esbarram na falta de creches e escolas para dar apoio, jovens de comunidades ribeirinhas, indígenas, quilombolas, jovens negros e negras da periferia. São grupos que precisam de políticas diferenciadas. Ademais, existe uma agenda nacional de trabalho decente para a juventude que tem quatro pilares: mais e melhor educação, conciliação entre as demandas da escola, do trabalho e da vida familiar, inserção ativa e digna no mundo do trabalho e diálogo social em torno da juventude brasileira.

Há uma definição de primeiro emprego ideal?

Antecipar demais a entrada no mercado de trabalho pode ser prejudicial quando implica menos anos de estudo. Existe uma relação entre a qualidade do emprego e o número de anos de estudo que o jovem terá. Entrar muito cedo pode significar entrar em uma condição desfavorável, em uma ocupação que não exige qualificação e pode prejudicar os estudos. Mas muitos jovens também querem ter a oportunidade de trabalhar e ter uma renda. As políticas para a juventude precisam ser inteligentes, de forma que o primeiro emprego possa ser conciliado com a permanência na escola ou na faculdade.