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Há 200 dias longe da sala, professores dizem não se acostumar com distância de aluno

Ausência de contato pessoal é apontado como maior desafio no ensino remoto

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São Paulo

Já são mais de 200 dias sem dar aula da forma como foram ensinados e sabiam fazer. Ainda que tenham encontrado formas de continuar ensinando a distância, professores dizem não se acostumar com a falta de contato presencial com os alunos.

“Sinto falta do barulho das crianças antes do início da aula, de falar olhando no olho, de ver como eles interagem entre si. Dar aula não é só transmitir conhecimento, é a troca de energia”, diz o professor de educação física Eduardo Camargo, 41.

Professor há 18 anos, ele conta que nunca ficou tanto tempo sem ver os alunos. Camargo diz que o colégio em que dá aula, o Rio Branco, na Granja Viana, adaptou o conteúdo para que os alunos pudessem continuar se desenvolvendo corporalmente e aprender a disciplina, mas ainda vê muitos desafios.

“O que aprendi sobre planejamento e metodologia de ensino nesses sete meses não aprenderia em anos [sem a quarentena]. Mas aprendi, també,m que nada substitui o contato presencial. É muito difícil dar aula sem ver o que os alunos estão fazendo do outro lado da tela”, conta.

Professor está sentado em frente ao computador onde dá aula
Professor de educação física Eduardo Camargo diz sentir falta do barulho das crianças na escola - Mathilde Missioneiro/Folhapress

São as câmeras desligadas dos alunos o principal desafio elencado pelos professores, conta Mirtes Timpanaro, 56, que leciona história na unidade de Higienópolis do Rio Branco. “Sinto falta da comunicação corporal com os alunos. Em sala de aula, eu sei quando um aluno se distraiu, quando está interessado ou sente sono e modelo minha aula dessa maneira. Com as telas pretas, eu não sei o que está acontecendo do outro lado."

Timpanaro é professora há 30 anos e diz ter descoberto uma nova forma de interagir com os alunos, chamando-os para comentar a aula ou responder alguma questão ainda que só por áudio ou por escrito. “Só 3 ou 4 ficam o tempo todo com a câmera ligada, então, preciso convocar o restante o tempo todo para que não se distraiam, para que se sintam envolvidos na aula”.

Professora de química do colégio Dante Alighieri, nos Jardins, Mara Cristina Pane, de 54 anos, diz que foi preciso se adaptar ao desafio de “invadir” a casa dos alunos e vê-los entrando em seu ambiente familiar. “Quero poder ver minha turma, ver se todos estão acompanhando, mas também preciso entender que nem sempre estão em um ambiente que se sentem confortáveis de compartilhar com todos os colegas.”

Uma estratégia encontrada foi pedir para que todos liguem a câmera por alguns minutos no início da aula, em uma espécie de chamada. “É nesse momento em que vejo todas as carinhas, que pergunto como estão."

Vanessa Andreotti, professora da escola municipal Clemente Pastore, no Jardim Angela, também relata a dificuldade em “entrar” na casa das crianças. Com 33 alunos, ela só conseguiu dar aula simultânea para no máximo 7, já que a maioria não tem equipamento ou conexão para entrar nas vídeochamadas

“Queria ter a possibilidade de ver todos os alunos porque é a única maneira de saber como eles estão. Ainda que seja difícil entrar na intimidade das famílias. Outro dia, uma aluna começou a chorar porque os pais estavam brigando no fundo e ela não conseguia desligar a câmera”, conta. Depois da experiência, Andreotti disse ter conversado com a menina e família para entender a situação.

Para Reinaldo Espinosa, professor de física do colégio Santa Cruz, no Alto de Pinheiros, a distância imposta pela pandemia pode aproximar os alunos do ambiente escolar. “Eles perceberam que a nossa relação não se restringe ao conteúdo. Temos uma relação de troca muito maior."

Depois de sete meses distante, Espinosa encontrou seus alunos de 3º ano do ensino médio na semana passada pela primeira vez e diz nunca ter visto adolescentes tão ansiosos e desejosos de voltar à escola.

“Não escolhemos como entrar nessa crise, mas a gente pode escolher como sair dela. Acredito que podemos construir uma nova escola ao ver como ela faz falta."

Professora está sentada em frente ao computador onde dá aula
Mirtes Timpanaro, professora de história, diz sentir falta da comunicação corporal com os alunos durante as aulas - Mathilde Missioneiro/Folhapress
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