BRASÍLIA— O governo retirou questões relacionadas à diversidade do rol de temas do Exame Nacional de Desempenho ( Enade ), que avalia o ensino superior no país. Componentes como "sexualidade, relações de gênero e relações étnico-raciais", que constavam expressamente dos editais desde 2016 como assuntos de referência para a prova comum a todas as áreas, não se repetiram na portaria do Enade deste ano. Outros itens que desapareceram, como "tolerância/ intolerância , " inclusão /exclusão", e também "relações de gênero ", estavam entre os temas previstos nos editais desde pelo menos o Enade de 2011, segundo documentos oficiais disponíveis.
A portaria do exame deste ano foi publicada no último dia 3 pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), vinculado ao Ministério da Educação ( MEC ). O presidente Jair Bolsonaro é crítico do que chama de "ideologia" em exames oficiais aplicados pelo governo. Na campanha, ele chegou a dizer que, caso eleito, inspecionaria o Exame Nacional do Ensino Médio ( Enem ) antes da aplicação.
Todos os itens cortados do edital do Enade estavam atrelados ao tópico "sociodiversidade e multiculturalismo" — enunciado que foi mantido. Segundo fontes, a mudança ocorreu com respaldo da comissão externa que elabora a sugestão de portaria. O objetivo era não deixar qualquer outra "diversidade" de fora, optando-se por retirar pontos específicos e deixar somente o componente de aspecto genérico.
A portaria do Enade estabelece, entre outras coisas, quais são os temas de referência da prova de formação geral, ou seja, que é aplicada aos estudantes de todas as áreas. Essa parte do exame tem dez questões (oito de múltipla escolha e duas discursivas).
A avaliação também inclui uma parte específica para cada graduação, com 30 questões. Neste ano, serão examinados estudantes de bacharelado em ciências agrárias, ciências da saúde e afins, engenharias, arquitetura e urbanismo, além de cursos de tecnólogos.
Questionado sobre os motivos da retirada das expressões relacionadas à diversidade, o Inep informou, em nota, que "todas as provas, tanto de formação geral quanto de conhecimentos específicos, sofrem modificações ao longo dos anos, é um processo natural". Destacou ainda que a portaria "teve manifestações técnica e jurídica favoráveis".
Embora menos popular que o Enem, o Enade já protagonizou polêmicas em função dos temas abordados. Na edição de 2018, uma questão discursiva da prova geral tratou do assassinato da vereadora Marielle Franco (PSol-RJ), da circulação de fake news após a morte dela e do alto número de defensores de direitos humanos vitimados no Brasil. Ao fim, pedia ao aluno para escrever sobre "os prejuízos da produção de notícias falsas para a sociedade democrática”.
Em 2017, uma questão trazia trechos de textos sobre a importância do nome social para os transgêneros. O comando para o aluno era discorrer sobre o tema e propor uma medida, no âmbito das políticas públicas, para facilitar o acesso dessa população à cidadania. Esse item também foi alvo de críticas, principalmente de militantes do projeto Escola sem Partido.
Colaborou Amanda Almeida