Gestão Doria quer reduzir avaliações de alunos e mudar bônus de professores

Desempenho será aferido a cada três meses e não mais bimestralmente

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São Paulo

O novo secretário de Educação do estado de São Paulo, Rossieli Soares da Silva, quer reduzir o número de avaliações feitas por alunos durante o ano para dar mais tempo a aulas e alterar o sistema de bonificação por resultados na rede escolar, política central das sucessivas gestões do PSDB no governo paulista.

Ao invés de avaliar o aluno a cada dois meses, como atualmente, isso deve passar a ocorrer trimestralmente. "Precisamos garantir mais tempo para o professor dar aula", disse Silva à Folha. "Depois vamos pensar em um bônus com outro olhar, com outras informações [para compor o cálculo da bonificação]".

A mudança na bonificação, de profissionais de escolas que progridam no indicador estadual de educação, o Idesp, será discutida no primeiro semestre. A implementação deve ocorrer em 2020.

O novo secretário de educação de SP, Rossieli Soares Silva, na secretaria estadual de Educação - Eduardo Anizelli/Folhapress

A partir do ano que vem o secretário pretende começar a implementar a reforma do ensino médio na rede. O modelo flexibiliza o currículo, mas tirá-lo do papel é visto com dúvidas por especialistas.

O plano dele é chegar em 2022 com o novo modelo em todo o estado. Das 5.300, 3.000 oferecem ensino médio.

Silva foi ministro da Educação do governo Michel Temer (MDB) e também ocupou a secretaria de Educação Básica do MEC. A reforma do ensino médio foi uma das bandeiras da sua gestão.

O agora secretário paulista foi trazido pelo governador João Doria (PSDB) para comandar a rede de 3 milhões de alunos e quase 200 mil professores. A meta estipulada pelo tucano é recolocar a educação paulista no topo dos indicadores educacionais do país.

A liderança no Ideb (Índice de Desenvolvimento da Educação Básica), foi perdida na gestão do ex-governador Geraldo Alckmin (PSDB).

São Paulo ficou para trás tanto em duas etapas do ensino fundamental quanto no ensino médio, onde a situação é mais grave. Mesmo quando liderava no índice, o estado ainda se mantinha em patamares considerados baixos.

O mandato de Doria é o sétimo seguido do PSDB no estado. O período se inicia em 1995 em SP mas não foi capaz de garantir políticas bem sucedidas de longo prazo na educação e eliminar deficiências.

Silva teve que, nos primeiros dias do ano, gerir uma crise de fornecimento de kits escolares e materiais didáticos, e foi a Brasília acompanhar decisão do Supremo Tribunal Federal que garantiu a contratação de professores temporários --havia o risco de 60 mil alunos ficarem sem aulas.

Para ele, essas questões são mais ligadas com o planejamento de 2019 do que com o legado tucano --de abril a dezembro de 2018, SP foi governado por Márcio França (PSB), vice de Alckmin, derrotado no pleito estadual.

Seguindo estilo de Doria, Silva reforça o discurso de que há uma nova postura."É inaceitável que São Paulo, um estado pujante, líder em tantas áreas, não lidere o processo educacional no Brasil. Precisamos ter claridade que São Paulo pode fazer muito mais", diz. "Nosso olhar agora é para a aprendizagem. Essa é a grande discussão, vamos trazer isso com muito mais energia."

Em São Paulo, profissionais das escolas que cumpram metas (ou parte) no Idesp recebem bônus em dinheiro. Nos últimos oito anos o estado desembolsou R$ 4,2 bilhões.

O Idesp é calculado a partir da avaliação dos alunos em matemática e português, o Saresp, e taxas de aprovação escolar. Há índices para o 5º e 9º anos do fundamental e para o 3º do médio.

O sistema sempre foi polêmico e nunca houve evidências científicas para sua manutenção. A Folha revelou em maio de 2018 que avaliações do próprio governo concluíram que o bônus não promoveu melhorias. Advertências para correções foram ignoradas pelo menos desde 2011.

Segundo ele, novas informações devem ser incluídas para definição do bônus, o que será discutido neste semestre.

O bônus continuará anual, mas o Saresp (prova estadual que compõe o indicador de qualidade) será só nos anos pares. Nos ímpares, o estado utilizará dados da avaliação federal, aplicada a cada dois anos para calcular o Ideb.

Silva poderá colocar em prática políticas pensadas em sua passagem pelo MEC: reforma do ensino médio e implementação do currículo construído à luz da Base Nacional Comum Curricular (que define o que os alunos devem aprender).

São Paulo tem desde 2008 um currículo estruturado, mas, mesmo articulado com a bonificação, não foi capaz de alavancar a educação.

"A gente não tem uma bala de prata. A gente aprovou a base mas ela não vai resolver todos os problemas do Brasil. Não resolve a formação de professore por si só, a infraestrutura das escolas, a valorização dos profissionais. Estas dimensões precisam ser cuidadas", diz Silva.

A expectativa é que as escolas tenham itinerários formativos para o aluno decidir: linguagens, matemática, ciências da natureza, ciências humanas e educação profissional.

Silva sabe das limitações orçamentárias, mas diz buscar ampliar recursos. "Se a gente não colocar, em primeiro lugar, o professor dentro da sala de aula, não temos nem chance de fazer o trabalho com aluno. Depois, se não valorizar o professor, não só no aspecto salarial e em outros aspectos, também não vai dar".

Presidente da Apeoesp (sindicato da categoria), Maria Izabel Noronha, a Bebel, diz que Silva teve bom começo na pasta. Ela critica, no entanto, a insistência na política de bônus. "Há comprovação de que isso não tem impacto na qualidade do ensino, e que não valorizou os professores", diz ela, que foi eleita deputada estadual pelo PT.

Ao contrário de Doria, secretário é contra lei de Escola sem Partido

Ao contrário do governador João Doria (PSDB), favorável ao Escola sem Partido, projeto polêmico que busca limitar o que professor pode falar na sala de aula como combate a supostas doutrinações de esquerda, o secretário de Educação do estado de São Paulo, Rossieli Soares da Silva, não vê necessidade da medida.

"Não pode haver doutrinação, nesse sentido estamos buscando a mesma coisa, mas entendo não ser necessário uma lei para regular isso. Se há conflito, a escola precisa ser o primeiro lugar para resolver", afirma.

"Mas a discussão é que precisamos colocar o foco na aprendizagem. Se o aluno souber ler e interpretar um texto, terá condições de fazer suas críticas a um pensador de esquerda ou de direita".

Silva era secretário de Educação Básica do MEC quando o governo retirou menções à gênero da Base Nacional Comum Curricular. Grupos religiosos e conservadores têm se mobilizado contra o que chamam pejorativamente de "ideologia de gênero" na educação.

O termo nunca esteve na base e não é adotado por educadores. A abordagem de temas sobre identidade de gênero pode, segundo estudiosos, influenciar na discussão de problemas como violência contra a mulher, gravidez na adolescência e homofobia.

Grupos conservadores e religiosos vem na discussão um ataque ao conceito tradicional de família. "O uso do termo gênero para uma coisa e ideologia para outra tem causado essas divisões que não permitem avançar o que precisamos. Temos, sim, que preservar os direitos humanos, respeitar as diferenças, respeitando as instituições, inclusive a própria famílias", diz.

O tema é a principal bandeira do governo do presidente, Jair Bolsonaro (PSL). Na semana passada, o Ministério da Educação envolveu Silva numa polêmica ao acusar a gestão Temer de ter alterado um edital de compra de livros que excluía exigências bibliográficas e temas de direitos humanos. "Temos tido boa relação, me parece que foi muito mais um erro mesmo", diz.

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