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Helena Singer, Marcelo Borges e Andrea Margit

Futuro da escola é reflexo de projeto de país

Toda a comunidade escolar deveria promover debates sobre o ensino médio

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Helena Singer

Socióloga e líder da estratégia de juventude da Ashoka

Marcelo Borges

Estudante de jornalismo e Jovem Transformador Ashoka

Andrea Margit

Jornalista e líder de comunicação e novos paradigmas da Ashoka

Espera-se que a educação ofereça as bases para impulsionar um projeto coletivo de sociedade. Mas qual é esse projeto? Se visa reduzir desigualdades, promover uma economia que valoriza a diversidade biológica e cultural de um país tão vasto como o Brasil, a educação será organizada de um jeito. Se é um país que projeta seu futuro como agroexportador, com crenças e comportamentos relativamente homogeneizados, então adotará outros modelos educacionais. Na ausência de uma visão construída em conjunto com a sociedade, as avaliações de desempenho geram meros rankings, propostas de reforma derrapam e o debate público sobre a educação se torna pouco construtivo.

A crise instalada no ensino médio reflete essa falta de projeto. Quase 8 milhões de estudantes sofrem as consequências de um fazer político autoritário, que em 2017 determinou uma reforma sem considerar a realidade e os anseios dos principais interessados. A partir deste modo autoritário de construir a política, fica impossível coordenar sua implementação em mais de 29 mil escolas, com 546 mil professores.

Alunos do ensino médio da Escola Estadual Padre Saboia de Medeiros, na Chácara Santo Antonio, zona sul de São Paulo - Bruno Santos/Folhapress - Folhapress

É preciso reconhecer que os problemas do ensino médio são multifacetados. Cerca de um terço dos jovens não conclui esta etapa. O fato é que o Ensino Médio sempre registrou altos níveis de evasão, sinal da falta de condições para a permanência dos jovens.

Os principais objetivos anunciados pela reforma são dar mais liberdade aos estudantes para se aprofundarem em áreas do conhecimento de seu interesse e reduzir a fragmentação do currículo. Na prática, em várias redes de ensino, o número de aulas compartimentadas no dia dobrou. Neste contexto, muitos estudantes e profissionais da educação exigem a revogação da reforma.

Desde 1996, a Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB) possibilita a qualquer escola organizar o currículo de acordo com as necessidades e interesses de seus estudantes e território, podendo articular a aprendizagem de forma interdisciplinar, com projetos, cooperação e pesquisas que transcendem as salas de aula. No entanto, a maioria das escolas continua operando da forma convencional porque as redes de ensino tendem a engessá-las por meio das avaliações nacionais, do preparo para o Enem e da gestão da carreira de professores de modo que se sintam mais conectados à rede do que a suas escolas.

A organização do currículo por disciplinas, entregues aos alunos em aulas expositivas, conforma uma escola que não dialoga com a produção de conhecimentos, cultura e comunicação. Várias escolas já superaram a lógica que fragmenta saberes em aulas e matérias. Romper com a estrutura disciplinar não significa descartar os professores das diferentes áreas. Ao contrário. Cada escola precisa de um corpo multidisciplinar de professores, em tempo integral, para construir coletivamente um currículo integrado, que faça sentido para os estudantes daquele lugar. Contudo, essa estrutura requer planejamento. Por isso, não se pode reformar o ensino médio por decreto.

A consulta pública que o Ministério da Educação (MEC) se propôs a fazer entra em sua reta final. Toda escola deveria ser incentivada a promover o debate sobre o ensino médio em dias letivos, envolvendo estudantes, responsáveis, professores e gestores. O produto desses debates tem que gerar um aprendizado profundo sobre a diversidade das escolas do país. Devemos cobrar o compromisso democrático assumido pelo governo; exigir que os resultados sejam públicos e inteligíveis para qualquer pessoa; e que os achados da consulta sirvam de bússola para traçar novos caminhos e apoiar as secretarias de Educação na reconstrução do novo ensino médio (NEM).

Os jovens interessados em discutir coletivamente suas experiências com o NEM também podem se juntar a uma iniciativa liderada por estudantes, os Debates Públicos nas Escolas. Urge traduzir todo o simbolismo da subida da rampa com o povo brasileiro, neste começo de ano, em um amplo e democrático debate sobre os destinos do ensino médio.

TENDÊNCIAS / DEBATES
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