Brasil

Fundeb: complemento de 15% proposto por governo federal é baixo, diz estudo

Pesquisadora Tassia Cruz, que comparou a situação do Brasil à de outros países da OCDE, também ressalta que a escolha por 40% trará problemas de caixa
Pesquisadora Tássia Cruz, do grupo de pesquisa d3e Foto: Divulgação
Pesquisadora Tássia Cruz, do grupo de pesquisa d3e Foto: Divulgação

RIO — O debate sobre a reformulação do Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação, o Fundeb, tensiona governos federal, estaduais, municipais e escolas públicas. A quantidade de dinheiro e como ele deve ser distribuído pautam o principal financiamento para que a educação básica funcione no país.

LEIA MAIS: Veja quais os principais pontos da proposta apresentada na Câmara para o Fundeb

Em média, o fundo corresponde a 59% da origem do dinheiro escolar. Um grupo de pesquisadores do grupo d3e, junto com o Banco Interamericano de Desenvolvimento ( BID ) elaboraram o relatório "Novo Fundeb: Prós e Contras das propostas em debate".

O texto apresenta os pontos positivos nas diferentes propostas e levanta possíveis problemas em algumas proposições. A pesquisadora Tassia Cruz, que faz parte do grupo, afirma em entrevista ao GLOBO que não existe uma "equação mágica" e que qualquer escolha tem que ser feita sabendo das consequências.

O debate que ganhou mais notoriedade é de quanto o governo federal deve complementar para a operação do fundo. Atualmente, a União atua com o 10%, mas os estados pregam 40% e a atual gestão do MEC, 15%.

— O que podemos dizer é que 15% ainda está baixo e, com 40%, teríamos que rever outros gastos em educação. Provavelmente, perderia-se recursos no ensino superior e isso precisa ser um acordo da sociedade para ser feito — afirma Tássia.

Confira a íntegra da entrevista

Qual a relevância da reformulação do Fundeb?

A educação básica depende do Fundeb, já que 59% dos recursos vêm dele, e os municípios quebrariam sem essa fonte de recursos. O Fundeb, como é hoje, já tem um papel muito importante, mas tem pontos com problemas. A Complementação da União indo para os estados é um deles (no atual modelo, o fundo sai do governo federal e é repassado para os estados) . Alguns estados são pobres, com cidades ricas dentro delas, e isso acaba gerando desigualdades.

O Fundeb é um fundo que recebe parte de vários impostos e, atualmente, vive-se o debate da reforma tributária. Até que ponto uma discussão não atrapalha a outra?

O ICMS é a maior receita que financia o Fundeb. 58% da receita do fundo, em 2016, foi do ICMS. A reforma tributária pode impactar muito o que vai ser (o fundo).

Mas até que ponto isso pode ser um problema?

Incluir novos impostos não deve travar o debate. Um Fundeb permanente, como é a proposta, pode ter uma revisão a cada cinco anos, por exemplo.

Outro debate é como o recurso deve ser redistribuído. Atualmente é por matrícula dando pesos para ensino integral, por exemplo. Mas outras propostas existem...

Sim, mas continuaria sendo distribuição por matrícula com outras ponderações. Uma matrícula em creche pode ter um valor diferente, e isso valoriza a expansão (deste segmento). Mas algumas vezes isso não é o suficiente para custear o serviço. Uma escola integral, por exemplo, recebe 1,3 vez do que uma escola regular. Mas, o custo dela não é só 30% mais cara. Com isso, cidades que conseguem cobrir o custo restante passam a ter esse ensino, com mais qualidade, do que outros municípios.

Existem propostas que tratam pesos de acordo com a realidade sócio-econômica também.

Sim, isso poderia combater a desigualdade. Outra proposta é pela capacidade de arrecadação do município. Existem cidades que poderiam arrecadar mais impostos e direcionar para educação, mas não o fazem por questão política. Essas podem receber menos que outras que não possuem capacidade de arrecadação.

O ponto mais debatido em público é quanto, percentualmente, o governo federal deve contribuir. É a chamada Complementação da União...

Sim, hoje ele é de 10%. O governo acenou para um crescimento de 15%, e existe a proposta de 40%. O valor de 15% ainda está abaixo do que é necessário em comparação com o que analisamos de outros países, mas com 40% teríamos que rever outros gastos na educação. Não existe número mágico, mas é necessário fazer uma escolha e saber — e lidar — com as consequências.