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Américo N. Amorim

Evidências multiplicam ganhos de alunos

Forma de pensar e agir pode levar escolas a superar achismo e teorias antigas

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Américo N. Amorim

Pesquisador afiliado da New York University (EUA) e fundador da Escribo Inovação para o Aprendizado; autor de “A Professora da Alfabetização”

Muito se fala sobre o fracasso do aprendizado no Brasil. Os dados do MEC/Inep mostram que apenas 51% das crianças de escolas públicas aprendem o mínimo de português no 5º ano. Em matemática, são somente 37%. Esses indicadores ficam ainda mais terríveis nas séries seguintes.

Para melhorar a situação, governantes falam sobre várias iniciativas. Ensino integral, salários dos professores, boas instalações físicas, acesso à tecnologia, merendas nutritivas. Sim, tudo isso é necessário, mas falta atenção ao principal: o que acontece dentro da sala de aula.

A forma como os professores ensinam influencia diretamente o aprendizado das crianças. E, nesse quesito, temos sérios problemas. São raros os cursos de pedagogia que mostram para futuros educadores as formas mais eficazes de ensinar.

Em relação à alfabetização, por exemplo, as professoras foram ensinadas a privilegiar o uso social da linguagem para que a criança construa seu conhecimento. Assim, o letramento ocorre quando lemos para as crianças, cantamos parlendas, promovemos brincadeiras, rodas de conversa e produção de histórias. Sem dúvida, são práticas importantes. Mas não será que deveríamos ensinar também as letras e seus sons?

Esse tipo de pergunta não pode ser respondida com achismo, teorias antigas ou pesquisas que observam como algumas poucas professoras trabalham. Para sabermos se uma forma de ensinar gera mais ou menos aprendizado que outra, é preciso realizar um experimento controlado. Vamos a um exemplo real.

Primeiro, avaliamos as habilidades de cada criança de uma determinada escola —por exemplo, na leitura de palavras. Cada habilidade receberá uma "nota", individualizada.

Depois, dividimos as turmas da escola em dois grupos, por sorteio. No grupo controle, as professoras continuam trabalhando como de costume —apenas promovendo o letramento. No grupo experimental, além do letramento, as crianças receberão instrução explícita para aprender a manipular os sons da fala e relacioná-los com as letras. Para isso, os professores passam por uma formação e recebem planos de aula, fichas de atividades ou jogos para utilizarem com os estudantes.

As turmas, então, são monitoradas ao longo do semestre. Ao fim desse período, todas as crianças são avaliadas novamente. Assim, temos para cada estudante um score (nota) anterior à intervenção educacional e outro posterior.

Esses scores permitem calcular as médias dos grupos e comparar o avanço das crianças que foram ensinadas como de costume (o grupo controle) com o avanço daquelas que receberam a nova didática (turmas experimentais). Se as notas do grupo experimental crescerem mais do que as do grupo de controle, então essa nova forma de ensinar gerou benefício para os estudantes.

Depois de décadas de pesquisas realizadas em vários países, um artigo da Johns Hopkins University sintetizou o que ocorreu em experimentos com mais de 11 mil crianças. Nas escolas que trabalhavam o letramento e que também ensinavam sistematicamente as crianças a relacionarem os sons da fala com as letras (consciência fonológica e fonêmica), os alunos da educação infantil aprenderam o dobro daqueles estudantes de escolas que só estimulavam o letramento.

No Brasil, vários pesquisadores de psicologia e fonoaudiologia encontraram ganhos similares. Um experimento feito com 351 crianças de famílias de baixa renda revelou que o ensino da consciência fonológica, utilizando jogos digitais lúdicos, gerou quatro vezes mais avanço em leitura e três vezes mais em escrita.

Neste início de ano letivo, vamos torcer para que os gestores educacionais busquem evidências sobre as formas mais eficazes de ensinar. Que estimulem e apoiem suas professoras a empregar essas práticas em sala. E que também destinem recursos para que as escolas possam medir e divulgar os resultados que essas mudanças causarão no aprendizado das crianças.

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