Estudantes se esqueceram do ambiente da escola, diz Sal Khan - PORVIR
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Inovações em Educação

Estudantes se esqueceram do ambiente da escola, diz Sal Khan

Fundador da Khan Academy conversa com o Porvir sobre as marcas deixadas pela pandemia e o futuro da educação online

Parceria com Khan Academy

por Ruam Oliveira ilustração relógio 1 de julho de 2022

A pandemia deixou marcas, tanto nos estudantes quanto nos educadores. Como consequência, há uma série de desafios que precisam ser enfrentados quando se pensa na educação, em nível nacional e global.

Entre as questões a se enfrentar, uma é em relação aos hábitos dos estudantes. Desacostumados com o ambiente escolar, tiveram dificuldades de socialização no retorno ao ambiente escolar e colocaram educadores diante de uma nova missão de fazê-los se encaixar novamente no que se espera deles em termos de comportamento. Isso quem conta é o fundador da Khan Academy, Sal Khan, em entrevista ao Porvir

Sal também ressalta que a educação vai precisar olhar para as lacunas de aprendizagem causadas pelo período de pandemia. Segundo ele, houve uma perda significativa de aprendizagem a qual já vinha acontecendo antes mesmo da pandemia, mas que foi aprofundada por ela. Para ele, uma das maiores prioridades para os tempos atuais é a educação infantil.

O educador destaca o quanto esse período deixou a todos mais cansados. “Você ouve o termo ‘fadiga de tela’ muito mais agora, porque professores precisaram fazer tudo de maneira remota. Estavam fazendo tudo por Zoom, os estudantes precisavam fazer tudo por Zoom e não é só a fadiga de telas, é uma fadiga geral”, comenta.


Confira abaixo o que o educador pensa sobre os próximos passos da educação.

Porvir – Quais são os principais desafios que estudantes enfrentam neste retorno à escola depois da covid-19?

Sal Khan – Bem, infelizmente existem muitos desafios. Há esse desafio relacionado aos hábitos porque os estudantes ficaram dois anos sem ir regularmente à escola. Conversamos com muitos professores e temos visto que os estudantes se esqueceram do ambiente da escola, de como se comportar nesse ambiente e como acompanhar a si mesmos. E no último ano escolar, os professores estão precisando investir muito mais tempo e esforço somente para garantir que os alunos ‘entrem nos eixos’ em relação aos hábitos e comportamentos apropriados para o ambiente escolar.

Penso que os estudantes também precisaram lidar com muito estresse emocional ocasionado pelo período de pandemia. Por vezes, eles talvez tenham parentes e familiares que adoeceram e simultaneamente não receberam o apoio necessário [para enfrentar essas questões]. Além de não terem visto seus amigos ou socializado tanto.

Está claro que muitos estudantes, se não a maioria, perderam muito do aprendizado ao longo dos últimos dois anos. Até mesmo antes da pandemia os alunos não estavam aprendendo tanto quanto deveriam. Houve muita perda de aprendizagem ao longo do tempo, seja no período de férias ou simplesmente coisas que esqueceram e aí a pandemia piorou a situação. 

Porvir – E qual o papel da Khan Academy nesse cenário?

Sal – Estamos trabalhando com professores, lideranças e gestores para mostrar que temos ferramentas nas quais os estudantes podem ter a oportunidade de preencher essas lacunas enquanto são capazes de prosseguir e avançar. 

Existem mais de 50 estudos de eficácia na Khan Academy. Se os alunos são capazes de dedicar até 30 minutos na plataforma por semana para preencher essas lacunas de aprendizagem no próprio ritmo, eles crescem de 50 a 100% mais rápido que seus pares que não fazem essa prática semanalmente. Imagine se pudessem dedicar uma hora por semana? Isso seria ainda mais fortalecido..

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Porvir – Os últimos dois anos fizeram com que muitos professores resistentes ao uso de tecnologia em suas práticas experimentassem recursos digitais pela primeira vez. Como fazer com que eles deem o próximo passo e saiam do uso emergencial?

Sal – É uma questão interessante. Quando a pandemia começou, pensei que haveria um sentido positivo quando se pensa nessa questão em que muitos professores estão agora, mais abertos ao uso da tecnologia. Infelizmente, eu acho que o que aconteceu criou quase uma retaliação contra a tecnologia. Você ouve o termo “fadiga de tela” muito mais agora, e isso porque professores precisaram fazer tudo de maneira remota. Estavam fazendo tudo por Zoom, os estudantes precisavam fazer tudo por Zoom e não é só a fadiga de telas, é uma fadiga geral. Há tanta incerteza… Vamos abrir as escolas? Não vamos abrir as escolas? Ou então algo como: “Meu amigo ficou doente, preciso substituí-lo”. Estamos vendo em uma escala global que o sistema educacional é só fadiga, fadiga, fadiga causada pela pandemia. E o que a fadiga faz é tornar tudo mais difícil para professores e escolas fazerem algo que vá além do básico. 

Porvir – Quais suas expectativas?

Sal – Espero que, pelo menos este ano,consigamos ao menos retornar para onde estávamos em 2019, em que o básico era mais do que simplesmente realizar uma atividade. Assim poderemos nos ater novamente em como impulsionar as crianças – porque isso sempre foi uma prioridade que se tornou ainda mais importante agora, porque sabemos o quanto elas perderam nos últimos anos.

Porvir – Poderia mencionar alguma habilidade que um professor precisa desenvolver para usar tecnologia de um modo que impacte a aprendizagem?

Sal – Acredito que a primeira habilidade seria um desejo de tentar, entendendo que talvez não seja perfeito na primeira tentativa. Acho que há também a habilidade de tentar por si mesmo.

Porvir – Quais questões do processo de aprendizagem a tecnologia não conseguiu resolver e que você considera possíveis de serem atendidas num futuro próximo?

Sal – Não sei se a tecnologia falhou em solucionar. Acho que é mais do que isso. As salas de aula se movem em sincronia e todos cobrem as mesmas coisas, até mesmo se um estudante não está entendendo algo e a classe inteira segue para o próximo conceito. A maioria dos estudantes está perdida ou entediada 

Porvir – Muitas habilidades que os estudantes precisarão ter em suas vidas devem ser incentivadas na escola. Se pudesse elencar as mais importantes a serem desenvolvidas, quais seriam?

Sal – Eu sigo acreditando que os estudantes precisam dominar matemática, leitura e escrita e não somente serem expostos a elas. Dominar – e aqui mais uma vez é onde a personalização da aprendizagem para o domínio é muito importante. Um outro conjunto de habilidades é justamente conseguir desenvolver seu próprio aprendizado. Vejo muitos estudantes que são excelentes, mas eles estão acostumados a ter sempre alguém que os diga o que fazer. E quando vão para a faculdade ou mercado de trabalho sofrem porque estão acostumados a sempre ouvir que precisam fazer isso ou aquilo porque determinada ação pode ajudá-los ou ajudar os outros. Aqui também a personalização é muito valiosa e os estudantes começam a ter controle sobre seu aprendizado – que é outra habilidade importante ao longo da vida. 

Porvir – Vocês trabalham bastante com o conceito de aprendizagem para o domínio. Como você acredita que esse conceito pode se espalhar pelos currículos das escolas pelo mundo? 

Sal – Aqui na Khan Academy, nós desenvolvemos ferramentas para a aprendizagem para o domínio, mas também temos outras ferramentas para apoiar os educadores no que eles já estão fazendo. Talvez estejam criando uma tarefa para a semana ou algo do tipo, mas que é igual para todos os alunos. O que queremos fazer é usar a plataforma em diferentes situações. 

Porvir – Do seu ponto de vista, quais são as tendências para a educação online para os próximos anos?

Sal – Acredito que a personalização e o domínio para a aprendizagem. A noção de competências – que está relacionada com o domínio para aprendizagem –, que não interessa se fez um curso ou apenas ficou sentado na cadeira, o que importa é se você aprendeu o material ou se demorou duas semanas ou dois meses para aprender. Acho que essa é a tendência. 

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formação de professores, personalização, tecnologia

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