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Por Jornal Nacional


Especialistas explicam por que o Brasil errou ao deixar crianças e jovens longe das salas de aula

Especialistas explicam por que o Brasil errou ao deixar crianças e jovens longe das salas de aula

O Brasil tem estudantes que há quase um ano e meio não entram numa sala de aula. Um levantamento concluiu que oito de cada dez escolas municipais do país ainda não retomaram as aulas presenciais.

Assim que os portões foram fechados por causa da Covid, abriu-se a discussão de como não deixar que crianças e adolescentes ficassem longe das escolas. Quase um ano e meio depois do início da pandemia, os estudiosos da educação avaliam que já passou da hora de os alunos voltarem para sala de aula.

“O Brasil errou por ter ficado tanto tempo com escolas fechadas. O comércio reabriu, muitos setores reabriram e a educação, as escolas públicas, não reabriram”, diz Priscila Cruz, presidente-executiva do movimento Todos pela Educação.

Priscila Cruz, do movimento Todos pela Educação, lembra que o Brasil é um dos recordistas em período de escolas fechadas. A média mundial é de pouco mais de 5 meses. Na América Latina, 10 meses. E no Brasil, 13 meses – mais de um ano.

O prejuízo não é só para o aprendizado e o impacto é mais cruel para as famílias mais pobres. Uma pesquisa encomendada pelo Unicef mostra que 48% dos pais entrevistados contaram que os filhos não tiveram acesso à merenda escolar e, sem ela, 13% revelaram que crianças e adolescentes deixaram de comer por falta de dinheiro para comprar alimentos.

Mais da metade dos pais disseram que algum adolescente da casa apresentou um ou mais sintomas relacionados à saúde mental, como insônia e preocupações exageradas com o futuro.

“Isso acaba prejudicando a aprendizagem, mas vai além da aprendizagem. A gente está falando aqui de um prejuízo que essa criança pode carregar para o resto de sua vida. Por isso que é muito importante, nesse momento, a gente ter uma clareza muito grande, no país, que é preciso sim reabrir a escola, é preciso sim que essa criança fique mais tempo agora na escola, para poder recuperar esse prejuízo todo”, afirma Priscila Cruz.

No fim do primeiro semestre de 2021, apenas dois em cada dez estudantes brasileiros assistiam aula na escola, e as desigualdades sociais ficaram ainda mais evidentes. Enquanto 40% dos filhos das famílias com renda mais alta podem ter acesso a aulas presenciais, nas famílias de baixa renda, são apenas 16%.

O Jornal Nacional fez um levantamento sobre a situação, hoje, nas redes estaduais. Em dez estados, as aulas são presenciais ou híbridas: o aluno pode frequentar parte das aulas online e parte presencial. Em outros onze estados mais o Distrito Federal, as aulas presenciais só vão começar no segundo semestre - até o dia 17 de agosto. Nos outros cinco estados do país, por enquanto, a volta às aulas presencias é só um projeto, não há data definida.

Quando se olha para os municípios, a situação é ainda mais preocupante. Como revela a União dos Dirigentes Municipais de Educação.

“O dado que nós temos mais recente, que nós trabalhamos, é de que a gente tem aproximadamente 85% das escolas funcionando de forma remota, dos alunos atendidos de forma remota; 15% com atividades híbridas e em torno de 1% apenas de atividades presenciais, exclusivamente presenciais”, diz Luiz Miguel Martins Garcia, presidente da União dos Dirigentes Municipais de Educação.

O ensino remoto, à distância, foi uma tentativa de manter o mínimo do aprendizado. Mas no Brasil, com a falta de recursos adequados na rede pública - como acesso a computadores e internet de boa qualidade - a experiência foi sofrível.

Segundo o Unicef, mesmo com o esforço dos educadores, em novembro de 2020, 5 milhões de crianças e adolescentes não tinham acesso à educação. Número equivalente ao cenário que o país tinha 20 anos antes, no início dos anos 2000.

Para defender a volta às aulas presenciais, os especialistas consideram também o avanço da imunização. Segundo levantamento da ONG Todos pela Educação, feito com base no DataSUS, hoje, entre 85% e 90% dos profissionais da educação receberam pelo menos a primeira dose da vacina.

Mas a Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação quer mais garantias de segurança sanitária dentro das escolas.

“Nós defendemos, sim, o retorno, mas o retorno tem que vir com a segurança sanitária necessária para evitar infecções e mortes de segmentos da comunidade escolar. Não podemos colocar a responsabilidade das complicações, do contexto que está acontecendo nesse momento por conta da pandemia, nas costas da escola pública, nem de seus profissionais”, afirma Heleno Araújo, presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação.

O movimento Escolas Abertas - que reúne pais, mães e responsáveis por alunos de 22 estados - diz que não dá para esperar mais.

“A ciência já provou que a escola é um ambiente mais seguro e é uma rede de proteção para as crianças e adolescentes, obviamente para as famílias, e claro, com protocolos. Então, sim, é extremamente urgente que as escolas do Brasil inteiro abram, porque não é só uma questão pedagógica, a escola é um local de proteção social”, diz Lana Romani, fundadora do movimento Escolas Abertas.

Na terça-feira (20), em um pronunciamento ao país, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, considerou urgente o retorno às aulas presenciais.

A presidente do Conselho Nacional de Educação diz que as autoridades públicas têm a obrigação de corrigir possíveis falhas, mas o ensino dentro de sala de aula é para agora.

“Acredito que a volta às aulas é imediata, ela é prioridade para todas as escolas que estão preparadas. As famílias podem ficar tranquilas, a escola é um lugar seguro, os estudantes podem ficar tranquilos porque a maioria das escolas se preparou para esse retorno e os professores podem ficar tranquilos porque terão muito mais segurança dentro do ambiente escolar do que em outros ambientes fora da escola”, explica Maria Helena Castro.

“A gente precisa de um plano para recuperar e para avançar. Ampliar o tempo que a criança fica na escola – e a gente tem recursos no Brasil. Esse tempo integral custa 30% a mais do que o tempo regular, mas a gente dobra o tempo e a criança, além de aprender muito mais, ela não evade, ela não abandona. Então é um investimento que se paga muito. É um investimento que tem um retorno muito grande para o país”, diz Priscila Cruz.

O início do novo semestre está aí para o bem das crianças e adolescentes, para o bem do país. O Brasil precisa encontrar o caminho para os portões estarem abertos de novo.

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