Especialistas apontam efeitos negativos de mudanças propostas pelo governo no Fundeb
Especialistas estudaram os efeitos negativos que as mudanças propostas pelo governo teriam sobre o repasse de dinheiro do Fundeb para os estados, especialmente sobre os mais pobres.
São seis letras que na prática significam dinheiro para que alunos de municípios mais pobres aprendam.
O Todos Pela Educação fez as contas. Comparou a proposta do Fundeb discutida na Câmara com a proposta defendida pelo governo, considerando o cenário em 2026.
O investimento mínimo por aluno por ano deve chegar a R$ 5.416 pela proposta da Câmara e a R$ 4.661 pela do governo, 14% a menos.
O pesquisador de políticas públicas Mozart Ramos diz que aumentar esse investimento é essencial para o Brasil avançar na qualidade do ensino e nas avaliações internacionais como o Pisa.
"O próprio presidente fala que o Brasil precisa chegar no Pisa como os países mais desenvolvidos, só que nesses países eles gastam quatro, cinco vezes mais por aluno/ano do que o Brasil faz. Consequentemente, se ele quer de fato tornar o Brasil mais competitivo no Pisa, ele tem que ampliar o investimento na educação básica", disse Mozart Ramos, pesquisador em políticas públicas de Educação da USP.
Segundo o levantamento do Todos Pela Educação, pela proposta da Câmara, 23 estados serão beneficiados com os recursos da União. Pela sugestão do governo, seriam apenas 16, sete a menos. Amapá, Espírito Santo, Goiás, Mato Grosso do Sul, Paraná, Rio de Janeiro e Santa Catarina ficariam de fora.
Pela sugestão do governo, Bahia e Ceará teriam as maiores perdas em números absolutos. Proporcionalmente, Tocantins, Minas Gerais e Mato Grosso seriam os mais prejudicados.
O Todos Pela Educação também afirma: segundo a proposta da Câmara, o dinheiro para reforçar a educação chegaria a 2.395 municípios; e a 1.575 pela do governo, 820 a menos.
O secretário de Educação de Sergipe, Josué Modesto dos Passos Sobrinho, comentou: "Nos municípios mais pobres é um colapso claro da rede pública de educação. O Fundeb foi muito importante para a melhoria da qualidade de ensino no Brasil. Ele é fundamental para manter essa trajetória de melhoria e sustentabilidade do financiamento da educação."
Ainda segundo o estudo, a diferença também é grande no número de alunos beneficiados: são mais de 14 milhões na proposta da Câmara; 7.805 milhões pela sugestão do governo.
O Maranhão perderia quase R$ 1 bilhão por ano. O secretário estadual de Educação, Felipe Camarão, se preocupa com outro ponto da proposta do governo: a que limita a 70% os gastos com pessoal.
"No Maranhão nós utilizamos 100%. Nesse caso, nós não teríamos recursos para pagar os salários dos professores. Portanto, seria um verdadeiro apagão da educação pública brasileira a aprovação do Fundeb tal qual proposta pelo governo federal", afirmou o secretário.
Os educadores avaliam que a proposta do governo não contribui para a reduzir a desigualdade na educação, que é grande e aumentou agora na pandemia, já que as aulas presenciais foram substituídas pelo ensino remoto e muitos alunos de escolas públicas não têm acesso a celular, computador e internet.
"Tira grande parte do potencial de geração de mais justiça, de mais equidade para fazer com que a educação brasileira não dependa do CEP da criança, de onde ela mora, de onde ela nasceu", afirmou Priscila Cruz, presidente do Todos Pela Educação.
Os educadores reconhecem a importância de aumentar os investimentos na área social, mas dizem que isso não pode ser às custas da educação.
"Acabar com o Fundeb ou desidratar o Fundeb vai gerar graves consequências para a educação brasileira. É fundamental, numa agenda de reconstrução do país, de reconstrução via educação, que a gente tenha recursos direcionados para esses alunos mais pobres, porque só com a educação que eles vão sair da pobreza”,disse Priscila Cruz.
"Há uma crise de desemprego, todos nós compreendemos isso. Mas o governo precisa ver qual é a fonte que não seja da educação básica para cobrir esse cobertor, porque educação básica é aquela que de fato vai promover a sustentabilidade do país a médio e longo prazo. Pessoas mais alfabetizadas, mais esclarecidas e educadas e com boa educação, naturalmente aumenta o PIB per capita e consequentemente dá maior capacidade de sustentabilidade ao país", explicou Mozart Ramos.