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Escolas2030: Práticas inovadoras de educação estão ao alcance de todos

Escola Pluricultural Odé Kayodê (Goiás/GO) - Site Ashoka/Reprodução
Escola Pluricultural Odé Kayodê (Goiás/GO) Imagem: Site Ashoka/Reprodução

Meghie Rodrigues

Colaboração para Ecoa, em São João (PR)

13/04/2021 06h00

Nesta escola não há carteiras nem filas: os alunos se reúnem em mesas redondas que acomodam até seis crianças. Assim, os estudantes conseguem trabalhar coletivamente em roteiros de estudos que eles mesmos ajudaram a criar, externando temas sobre os quais querem aprender.

Aqui, o sistema de médias e reprovação dá lugar à autoavaliação: cada aluno analisa o próprio desempenho e se dá uma nota, que é discutida com colegas e professores em um pequeno conselho escolar para validá-la.

Além disso, cada criança tem um tutor que a acompanha em toda a sua vida escolar, garantindo uma assistência personalizada e contato próximo, o que facilita apontar necessidades e dificuldades de cada aluno em seu percurso. Com nota 7,5 no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) de 2019, estamos falando de uma das melhores escolas de sua cidade.

Ao contrário do que pode parecer, esta escola baseada em pedagogia integral não é uma instituição privada localizada em bairros afluentes de metrópoles como Rio de Janeiro ou São Paulo.

Situada em São Geraldo, bairro pobre de Manaus (AM), a Escola Municipal Professor Waldir Garcia oferece ensino fundamental 1 (primeira à quinta série) a mais de 200 crianças, inclusive portadoras de necessidades especiais e vindas de famílias refugiadas da vizinha Venezuela e do Haiti.

"Crianças vulneráveis socioeconomicamente, refugiadas e com necessidades especiais enfrentavam mais dificuldade de aprendizado. Com isso, tínhamos altos níveis de reprovação e, como consequência, uma evasão escolar altíssima. Perdíamos as crianças para os sinais de trânsito," conta Lúcia Santos, diretora da Waldir Garcia. Com a transição para um modelo de ensino mais humanizado a partir de 2015, o cenário é outro.

A escola é uma das organizações pólo do programa Escolas2030, que busca desenvolver e facilitar boas práticas em educação de crianças e jovens em dez países, a maioria deles do sul global. Além do Brasil, participam Afeganistão, Índia, Paquistão, Portugal, Quênia, Quirguistão, Tajiquistão, Tanzânia e Uganda.

Com duração prevista para dez anos (de 2020 a 2030), a ideia do projeto é engajar cem escolas em cada país - mil ao todo, envolvendo 50 mil professores e meio milhão de estudantes pelo mundo. O Escolas2030 tem por bússola os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS), criados pelas Nações Unidas em 2015, que, em substituição aos Objetivos do Milênio, estabelecem metas para reduzir as desigualdades globais até 2030.

Como funciona e impacto social

Elena - Divulgação  - Divulgação
A educadora Helena Singer
Imagem: Divulgação

Para Helena Singer, líder da estratégia de Juventude para América Latina da Ashoka Brasil, a inclusão começa sobretudo nos critérios de avaliação. Não faz sentido medir a qualidade de educação na Nigéria com a mesma régua que se usa na Finlândia.

"Estudantes de países em desenvolvimento vão mal em avaliações usando indicadores formulados no norte global, mas conseguem bons resultados quando se usa parâmetros alternativos, adequados à sua realidade. Isso mostra o potencial de contextos de vulnerabilidade e pobreza," diz Singer, coordenadora geral do Escolas2030 no Brasil.

Um dos principais objetivos do projeto, segundo Singer, é estimular educadores e comunidades a repensar esses critérios de avaliação e explorar as potencialidades de crianças e jovens em seu próprio contexto. "Cada país escolhe cem instituições que possam ser acompanhadas ao longo de dez anos para entender como as crianças e jovens entre 5 e 15 anos estão se desenvolvendo," conta ela ao Ecoa.

Liderado globalmente pela Fundação Aga Khan, o Escolas2030 chegou ao Brasil por iniciativa da Fundação Itaú Social e é gerido em parceria com a ONG Ashoka Brasil e a Faculdade de Educação da Universidade de São Paulo.

"O Brasil saiu na frente nesta iniciativa porque o trabalho mais difícil já estava feito - mapear instituições educativas que inovam no emprego da educação integral mesmo em contextos de vulnerabilidade," conta Singer. Esse mapeamento é o projeto Escolas Transformadoras, que reúne mais de dez das 14 organizações-polo que são a base do Escolas2030. Outras 36 escolas já fazem parte do projeto e espera-se chegar às 100 em abril.

Estas 14 organizações-polo, explica Singer, são escolas localizadas em todas as regiões do Brasil, cobrindo diversos tipos de administração e todos os níveis escolares - da educação infantil ao ensino superior, passando pela Educação de Jovens e Adultos (EJA). Elas servem como base física do projeto e irradiadoras de boas práticas para outras escolas.

A ideia é não esperar uma década para compilar os resultados do projeto, e, sim, compartilhar com secretarias de educação o que já funciona para que outras escolas possam ser estimuladas a adotar novas práticas também.

"Nós já adotávamos o desenvolvimento de competências como empatia, colaboração interdisciplinaridade e autonomia com as crianças mesmo antes de fazermos parte do Escolas2030," conta Erika Cecílio, coordenadora do projeto Escola Integrada na Escola Municipal Professor Paulo Freire, em Belo Horizonte.

Participar do Escolas2030 trouxe uma percepção diferente do que já vinham fazendo. "Começamos a pensar nessas competências de forma mais sistematizada. Ouvir de colegas em outras escolas do Brasil sobre o que vêm fazendo também foi muito importante para ver lacunas e pontos fortes que tínhamos," continua ela.

Para Emicléia Alves Pinheiro, coordenadora geral da Escola Pluricultural Odé Kayodê, em Goiás, participar do Escolas2030 foi um reconhecimento de que estão no caminho certo. "É muito interessante ver as experiências de outras escolas que estão trabalhando para construir uma humanidade diferente, melhor, preocupada com o bem-comum."