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Escolas públicas com bons resultados no ensino médio têm relação próxima com alunos

Pesquisa "Excelência com Equidade no Ensino Médio" analisa pontos fortes e dificuldades de escolas com notas acima da média na Prova Brasil e no Enem, altas taxas de aprovação e estudantes de nível socioeconômico baixo

por Fernanda Nogueira ilustração relógio 27 de setembro de 2019

A relação próxima com os alunos é um dos principais diferenciais das escolas públicas com bons resultados no ensino médio, mostra a pesquisa “Excelência com Equidade no Ensino Médio: a dificuldade das redes de ensino para dar suporte efetivo às escolas”. O estudo mapeou escolas que atendem alunos de nível socioeconômico baixo e obtiveram notas acima da média no Enem (Exame Nacional do Ensino Médio) 2017 e na Prova Brasil, com taxa de aprovação mínima de 95%.

As escolas pesquisadas têm outros pontos fortes em comum. De um total de cem escolas que atingiram os indicadores de qualidade propostos, 82 são de tempo integral. Isso permite um acompanhamento mais efetivo dos estudantes, diferente do que acontece nas escolas de tempo regular, com quatro a cinco horas de aulas diárias, segundo Ernesto Martins Faria, pesquisador responsável pelo estudo e diretor-executivo do Iede (Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional), que realizou o trabalho junto com a Fundação Lemann, Instituto Unibanco e Itaú BBA.

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“Este é um desafio, porque não dá para fazer com que todas as escolas de ensino médio sejam de tempo integral no curto prazo. É preciso pensar em um modelo com mais tempo pedagógico, seja no contraturno ou em uma conexão escola-comunidade. É difícil conseguir bons resultados no tempo regular”, afirma Ernesto. A pesquisa faz parte de uma série iniciada em 2012 com os anos iniciais do ensino fundamental e que já investigou também os anos finais do fundamental.

Com a maior permanência dos alunos na escola, há atividades que desenvolvem a autonomia, discutem a vida dos jovens, falam sobre projetos de vida e plano de carreira. Desta forma, os estudos fazem sentido para os jovens.

Os pesquisadores visitaram duas escolas em cada um dos estados com mais escolas dentro dos critérios. Foram eles, Ceará, com 55 escolas, Espírito Santo, com 14, Goiás e Pernambuco, com sete cada. Estiveram também em uma escola na média para comparar os resultados.

O perfil das escolas pesquisadas mostra uma preocupação em desenvolver os conhecimentos cognitivos dos estudantes, com exercícios de fixação de gramática e matemática, por exemplo. “Eles precisam construir uma análise crítica e uma visão ampla a partir de conhecimentos sólidos. Por isso, essas escolas também cobram conteúdo e mesclam estratégias”, explica Ernesto.

A proximidade entre professores e alunos e a relação com os pais também fica acima da média, segundo a pesquisa. Além disso, as secretarias de educação contribuem na parte de indicadores, com informações sobre como os alunos se saem nas provas locais e nacionais.

Mesmo assim, as escolas enfrentam dificuldades para aumentar o número de alunos com nível de aprendizagem adequado para sua série. “Os desafios são grandes. Há um gargalo na formação de professores e no acompanhamento pedagógico. Os indicadores são reflexos de defasagens no aprendizado que vêm do fundamental. No ensino médio, as secretarias estaduais têm mais dificuldade para ajudar as escolas do que no ensino fundamental, quando a secretaria é municipal e tem um contato mais próximo”, explica Ernesto.

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Presença
Uma das escolas que participaram da pesquisa é o Centro de Ensino em Período Integral Professor Pedro Gomes, de Goiânia. Lá, o currículo é dividido entre o núcleo comum, com as 13 disciplinas do ensino médio, e o núcleo diversificado, que inclui atividades como projeto de vida, estudo orientado, clubes juvenis e disciplinas eletivas. As aulas dos núcleos são mescladas no horário letivo, das 7h30 às 17h.

Nos clubes juvenis, os próprios alunos se reúnem em torno de um tema de interesse comum. Um aluno pode ensinar violão para os outros, por exemplo. Neste período, que acontece semanalmente, os estudantes atuam por conta própria enquanto os professores participam de reuniões pedagógicas, segundo o diretor da escola José Joaquim Neto. Os alunos também se organizam para fazer projetos de iniciação científica.

No primeiro ano, participam do projeto de jovens escritores, em que escrevem sobre suas vidas, falam sobre sonhos, dia a dia, dramas e violências sofridas. “Focamos no processo e não no resultado final, que vem se o processo for bem feito”, explica José. Ao final, a escola produz livros impressos ou ebooks.

Alunos participam com roda de conversaDivulgação

Alunos do Centro de Ensino em Período Integral Professor Pedro Gomes participam de roda de conversa

No segundo ano, os jovens estudam artigos da Convenção Internacional dos Direitos Humanos. Produzem pesquisas e vídeos sobre temas como cidadania, racismo, bullying, machismo, feminicídio, entre outros. No terceiro ano, desenvolvem projetos sobre temas variados, como arte, cultura, esportes e ciência, um pouco mais densos. Ao final, escrevem artigos e defendem suas teses.

A escola adota a chamada “Pedagogia da Presença”, criada pelo pedagogo Antonio Carlos Gomes da Costa, que preza pela abertura ao diálogo, respeito à diversidade, ações reflexivas e entendimento do universo do jovem, segundo a pesquisa.

“O aprendizado acontece com a presença atenta, generosa e solidária dos professores. Os estudantes aprendem a mediar conflitos, a ter responsabilidade, a sonhar, vendo como o professor faz tudo isso. As relações são mais horizontais. Se o professor cobra pontualidade, responsabilidade, tratamento humano, igualitário, gentil, tem que ser assim com os alunos”, explica José.

A equipe atua em tempo integral na escola e incentiva o protagonismo dos estudantes. Os jovens têm reuniões mensais com o diretor para lidar com problemas, questionar, discutir sobre a condução da escola. “Incentivamos a participação democrática.”

Há dois modelos de tutoria, uma coletiva, em que cada tutor acompanha 20 alunos, e outra pessoal, com um acompanhamento acadêmico e também com uma atuação do professor como ouvinte. Quem escolhe o tutor é o aluno. “Eles estabelecem vínculos, conhecem os sonhos dos jovens, sabem de onde vêm, quem são os pais, como é o cotidiano. Fica mais fácil ter um olhar mais cuidadoso”, diz José.

Apesar do trabalho em busca de aproximação da família, a escola sofre com o distanciamento de alguns pais, segundo o diretor. “Criamos mecanismos, vamos convocando os pais, mas é um trabalho árduo. Muitas vezes a gente desanima, não há milagre”, explica. A escola procura mostrar aos pais a importância de permitir que os filhos estudem em tempo integral até o final do ensino médio, ao invés de procurar um subemprego. “Chamamos as famílias para explicar o potencial dos alunos, que podem ir para a universidade”, diz o diretor.

Segundo José, a escola procura desenvolver as competências cognitivas dos estudantes, mas sem “massacrar o aluno”. A prioridade é fortalecer as relações dentro do ambiente escolar, no intuito de proporcionar o bem-estar. “Temos avaliações, acompanhamento acadêmico, para que todos avancem. Mesmo que nem todos cheguem ao mesmo ponto, consideramos que todos têm potencial”, afirma.

De acordo com Ernesto, do Iede, os próximos estudos trarão análises quantitativas dos resultados, para aprofundar pontos encontrados na primeira pesquisa. Haverá ainda um acompanhamento das escolas com dados de 2019, para que seja possível avaliar a evolução de cada uma delas.

Infográfico Pesquisa Excelência e Equidade no Ensino Médio

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aprendizagem baseada em projetos, aprendizagem colaborativa, competências para o século 21, educação integral, engajamento familiar, ensino médio, equidade, socioemocionais, tecnologia

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