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Escolas de São Paulo usam mediadores para diminuir conflitos entre alunos

Questão ganhou especial relevância depois do atentado a escola de Suzano, há um mês; para especialistas, mediação é importante para evitar casos de violência
Professores mediadores atuam na Escola Estadual Manuel Ciridião Buarque, na zona oeste de São Paulo. Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo
Professores mediadores atuam na Escola Estadual Manuel Ciridião Buarque, na zona oeste de São Paulo. Foto: Edilson Dantas / Agência O Globo

SÃO PAULO — Já era fim de tarde de um dia de fevereiro quando uma conversa entre colegas escalou até virar uma briga na Escola Estadual Ciridião Buarque, uma instituição com mais de 700 alunos na zona oeste de São Paulo. Era uma briga clássica de colégio. Já há algum tempo, Victória Ribeiro, de 17 anos, acumulava atritos com os colegas de classe. Ante a provocação de um amigo, explodiu. Ofensas foram disparadas de parte a parte e, chorando, Victória telefonou para o pai, pedindo para ser transferida de escola. De pronto, o professor Luiz Eduardo Carvalho, um rapaz esguio e sereno, entrou em ação. Depois de falar com os pais dos alunos em conflito, marcou uma reunião com a sala de Victória. Convenceu os estudantes a conversar com a aluna. Numa segunda-feira, todos se reuniram em círculo, para colocar suas diferenças em dia:

- A Victória foi a primeira a falar. E desarmou a todos, pedindo desculpas - conta Carvalho.

A conversa durou quatro horas e rendeu algumas lágrimas. Ao final, saldo positivo: Victória saiu convencida a continuar no colégio.

Desde o começo do ano, Carvalho ocupa a função de mediador escolar e comunitário no Ciridião Buarque. Concilia a tarefa com as aulas de português.  Na função, sua principal tarefa é escutar os estudantes - e ajudá-los a dialogar.

Diariamente, dezenas de alunos passam pela salinha que ocupa um cômodo com saída para o pátio interno da escola. Em alguns casos, encaminha os estudantes a psicólogos ou profissionais de saúde:

- Hoje, um grupinho me mostrou imagens de uma rede social, em que uma das alunas falava em suicídio. Ansiedade e depressão, hoje, são os problemas mais recorrentes - conta o professor.

A figura do mediador escolar passou a fazer parte do cotidiano de algumas escolas estaduais paulistas em 2010. Sua função é  facilitar o diálogo entre alunos, com professores e com a comunidade escolar. O trabalho foi pensado como parte do Sistema de Proteção Escolar, um conjunto de medidas desenhadas para reduzir e prevenir a incidência de conflitos. A ideia é bem vista por especialistas, segundo os quais melhorar o “clima escolar” é passo importante para evitar casos de violência:

- As escolas mais violentas são justamente aquelas onde há pior comunicação - diz a professora Kathie Njaine, pesquisadora da Fundação Oswaldo Cruz, órgão ligado ao governo federal.

Njaine observou o fenômeno ao estudar a questão em escolas da baixada fluminense, no Rio. Naquelas onde a participação dos estudante era estimulada e onde a relação com pais era mais próxima, havia menos conflitos.

A questão ganhou especial relevância depois do atentado na escola Raul Brasil, em Suzano, em março. Na ocasião, dez pessoas morreram depois de dois estudantes abrirem fogo contra professores e funcionários do colégio. Passado um mês, o governo paulista diz trabalhar em um plano para aprimorar a segurança nas escolas. Ainda não divulgado, ele incluiria ações que fogem às receitas tradicionais da segurança pública e deve tratar de questões relacionadas à vivência dos alunos na escola:

- Precisamos pensar na questão do policiamento, claro. Mas precisamos repensar, também, nossa relação com os alunos - disse o secretário estadual de educação, Rossieli Soares, durante coletiva no Palácio dos Bandeirantes na semana passada.

O programa de mediadores de São Paulo é entendido por especialistas em educação como uma forma de melhorar o convívio nas escolas. Mas existe o temor de que peque por falta de planejamento:

— O trabalho do mediador funciona muito bem, desde que seja acompanhado por um projeto mais amplo, que avalie os problemas de cada escola, e acompanhe as intervenções, para saber se funcionaram — diz a professora Miriam Abramovay, Coordenadora da Área de Juventude e Políticas Públicas da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais.

Segundo Abramovay, não há notícias de avaliações sobre a efetividade do programa paulista. Questionada quanto a isso, a Secretaria de Educação de São Paulo não deu respostas. Segundo a secretaria, há pouco mais de 1800 professores mediadores atuando nos colégios estaduais paulistas - em 2017, o governo manifestara o desejo de ampliar o programa para todos as mais de 5 mil escolas da rede.