Escola pública em bairro rico de SP sofre preconceito: 'Encarar tudo isso'

Frases racistas e ataques contra os professores. Essas são algumas das discriminações vivenciadas nos últimos anos pela escola municipal de educação infantil Monteiro Lobato, em Higienópolis, um dos bairros de maior poder aquisitivo em São Paulo. Para enfrentar essas violências, a unidade adota medidas como o reforço do currículo pedagógico o qual define como "diverso e inovador".

O que aconteceu

O ataque mais recente sofrido pela escola ocorreu no mês passado. Postes no entorno da unidade foram pichados com frases racistas como "viva voz é coisa de macaco" e outras como "escola sem educação, escola sem respeito, escola sem noção" e "pedagogia da violência".

A polícia diz que busca imagens de câmeras de segurança e que testemunhas devem ser ouvidas. A prefeitura da capital paulista afirma que "presta todo apoio necessário à comunidade escolar" (leia mais abaixo).

Pelo currículo adotado, a unidade sofre intimidações desde 2018.

Educação antirrascista e discussão de igualdade de gênero. O currículo inclui esses temas, entre outros, para as turmas de crianças entre 4 e 6 anos.

Temos um currículo diverso e inovador, porque temos uma gestão democrática. Não fazemos nada sem intencionalidade pedagógica ou que não colabore para o desenvolvimento das crianças. Estamos implementando temas previstos em leis que passaram por muitas discussões, como a que aborda o ensino da história africana nas escolas.
Maria Claudia Fernandes, diretora da EMEI

Escola reforça a importância do currículo diverso. Para enfrentar essas violências, a escola mantém diálogo com o conselho de pais, que tem uma atuação forte.

Secretaria municipal foi pressionada por pais. Segundo o UOL apurou, o apoio da pasta de Educação em relação às intimidações sofridas pela escola só ocorreu após o conselho de pais cobrar. A secretaria nega essa informação.

Vamos acompanhar [a investigação sobre as frases racistas]. Não queremos que ninguém se sinta à vontade para fazer isso contra a escola e com as nossas crianças. [...] A gente não vê esses casos acontecerem na porta de escolas particulares da região.
Mariana Borga, presidente do conselho de pais

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Diversidade na sala de aula

África, negros, indígenas e bonecas de diferentes perfis étnico-raciais. Nas salas e pátios da escola Monteiro Lobato, é possível encontrar mapas do continente africano, ilustrações de personagens negros, livros diversos, fotos de uma visita de indígenas à unidade, além das bonecas diversas.

Professores trabalham educação antirracista e igualdade de gênero na EMEI Monteiro Lobato
Professores trabalham educação antirracista e igualdade de gênero na EMEI Monteiro Lobato Imagem: Ana Paula Bimbati/UOL

Visita à exposição "Rainhas da Copa", que retrata o futebol feminino. A reportagem acompanhou um dia de atividades na escola. Na ocasião, as crianças visitaram o Museu do Futebol para a exposição sobre a valorização das mulheres no esporte. "Eu queria ser ela", diz uma das meninas, quando é apresentada a uma imagem da jogadora Roseli.

"Atenção! Crianças na área". A escola promove passeios para as crianças. Alguns são feitos em caminhadas pelo bairro, como foi a visita ao Museu do Futebol. Nas saídas, as turmas deixam marcas pelo chão da cidade.

Precisamos mostrar que as crianças podem aprender fora das paredes da escola e também ocupar esses espaços na cidade.
Claudia Oliveira, assistente da direção escolar

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Manifesto antirracista

A escola produziu um manifesto antirracista, dias após as pichações preconceituosas. O objetivo foi reafirmar seu compromisso na discussão com as crianças.

Fortalecer esse trabalho é a nossa forma de encarar tudo isso. Continuar abordando os temas, mostrando novas possibilidades de personagens e histórias para as crianças, por exemplo.
Jane Queiroz, professora da escola

EMEI Monteiro Lobato, em Higienópolis, região central de São Paulo
EMEI Monteiro Lobato, em Higienópolis, região central de São Paulo Imagem: Ana Paula Bimbati/UOL

"Ideologia de gênero"

Pai gravou um vídeo em que diz que a escola ensinava "ideologia de gênero" — um conceito pejorativo usado por grupos conservadores para atacar avanços nos direitos sexuais, reprodutivos e na igualdade de gênero, em especial a população LGBTQIA+. Isso aconteceu em 2018, envolvendo o pai de uma criança matriculada na unidade.

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O vídeo viralizou e uma onda de ataques contra a professora e à escola começou. A polêmica chegou até vereadores de São Paulo. Em 2021, as imagens foram editadas e voltaram a circular.

Na época, a escola chegou a receber intimidações e ameaças por telefone — incluindo uma visita da Polícia Civil.

O que diz a prefeitura

A prefeitura citou ações feitas nos últimos meses, como a entrega de 128 mil bonecas e bonecos negros e migrantes às escolas.

Qualquer ato que discrimine ou incite violência é repudiado, e a gestão municipal é a mais interessada para que a situação seja esclarecida
Prefeitura de São Paulo, em nota

A secretaria municipal diz contar com um núcleo de educação para as relações étnicos-raciais. "Formar profissionais atentos às desigualdades e comprometidos para sua superação perpassa os fazeres deste núcleo", diz.

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