'Escola deve ser a última a fechar e a primeira a ser reaberta', diz secretário de São Paulo

Fernando Padula não descarta novo fechamento das escolas se a situação da pandemia piorar na cidade e ainda se vê diante de ameaças de greve dos sindicatos dos professores

PUBLICIDADE

Foto do author Renata Cafardo
Por Renata Cafardo
Atualização:

Atualizada às 19h01. 

PUBLICIDADE

Às vésperas da volta às aulas em São Paulo, no dia 1º, o novo secretário municipal de Educação, Fernando Padula, não descarta novo fechamento das escolas públicas e particulares na cidade se a situação da pandemia piorar. Mas “reza” para que isso não aconteça, como conta em sua primeira entrevista exclusiva desde que assumiu o cargo, no começo do mês. E diz que, num eventual novo cenário, elas seriam as últimas a pararem de funcionar e as primeiras a voltarem. “Nós vamos seguir a determinação da Saúde sempre, a educação não vai se rebelar, mas vamos argumentar que, do ponto de vista educacional, psicológico, de sociabilidade, da nutrição, é importante que a escola esteja aberta ou que fique fechada o menor tempo possível”, diz

Na rede municipal, Padula ainda se vê diante de ameaças de greve dos sindicatos dos professores, que pediam o retorno apenas em março. Um decreto publicado nesta quinta-feira no Diário Oficial formaliza o dia 1º como o início do retorno presencial. Nas escolas municipais, no entanto, até o dia 12 haverá apenas planejamento dos professores. Após a entrevista do secretário com o Estadão, a Justiça suspendeu a volta às aulas presenciais em todo o Estado de São Paulo. O governo paulista vai recorrer. 

Fernando Padula, secretário municipal de Educação Foto: Taba Benedicto/ Estadão

A volta presencial nas creches e escolas da Prefeitura este ano é obrigatória. Desde que assumiu, o novo secretário tem conversado com pediatras e educadores para viabilizar o retorno e está convencido de que a escola não é um local de grande transmissão da covid. No ano passado, a Prefeitura foi a pedra no sapato dos movimentos a favor da volta. Mesmo com autorização do Estado, Covas permitiu apenas atividades extracurriculares presenciais. “Sou contra o homeschooling, adiar a volta às aulas fortalece o discurso de quem defende que não precisa ter escola.” 

A amizade desde os tempos de adolescência com o prefeito ajudou Padula a ter Covas do seu lado a favor do retorno. O secretário, de 43 anos, conta que conheceu o atual prefeito porque seu avô, Mario Covas, era um “ídolo na infância e adolescência”. Quando menino, nos anos 90, Padula fez de tudo para conhecer o então senador, que acabou se tornando uma espécie de mentor dele na política. Formado em Direito, foi trabalhar na educação chamado pela ex-secretária Rose Neubauer e atuou como chefe de gabinete durante nove anos na secretaria estadual, com outros notórios educadores tucanos, como Paulo Renato Souza e Maria Helena Guimarães de Castro. Essa é a primeira vez que assume um cargo de secretário, segundo ele, depois de muitos “nãos” ao amigo prefeito.

No ano passado, as negociações entre Educação e Saúde não foram fáceis e o prefeito acabou autorizando só atividades extracurriculares nas escolas. Isso muda agora?

Estamos tendo uma excelente relação com a Saúde, fazendo conversas com especialistas, pediatras. Estamos criando um grupo das duas secretarias, onde as 468 UBSs vão acompanhar as escolas municipais, de acordo com o protocolo da cidade. E também um comitê de orientação, com a sociedade civil, sociedade brasileira de pediatria, para orientar a secretaria da educação e acompanhar as ações. 

Publicidade

Por que o senhor considera a volta tão importante?

Eu sou o secretário da educação, então do ponto de vista da educação, as evidências são enormes: pedagógicas, de aprendizado, de convivência, sociabilidade, de evitar a violência. Esse conjunto mostra que a escola é essencial e precisa existir. Mas é voltar a qualquer preço? Não, eventualmente se tiver uma explosão da pandemia vai ter que fechar. Mesmo que seja mais pra frente, em maio, aí fecha por um período curto e abre de novo.

Não estamos numa explosão da pandemia agora?

Aqui em São Paulo os dados são melhores. Nós vamos seguir a determinação da Saúde sempre, a educação não vai se rebelar, mas vamos argumentar que do ponto de vista educacional, psicológico, de sociabilidade, nutrição, é importante que a escola esteja aberta ou que fique fechada o menor tempo possível. Rezo para que não fechem, mas se a saúde mandar, vamos fechar. É imprevisível. Estava tudo baixando, aí o pessoal foi para a praia, festa, pancadão, e explodiu. A escola pode ser a vítima do comportamento da sociedade. Estou absolutamente convencido de que a escola não é um foco.

PUBLICIDADE

Consegue ver o cenário na cidade em que tudo está fechado e só a escola continua aberta, como foi feito em outras capitais do mundo?

Consigo. E consigo também ver tudo fechado de novo, até a escola, mas ela sendo a primeira a ser reaberta. A escola deve ser a última coisa a fechar. Hoje há um consenso na Prefeitura da importância das escolas abertas. A Saúde pesquisou, tem acompanhamento de inquéritos em crianças e foi o que os embasou a tomar a decisão de abrir escola. Eu acho que essa foi uma evolução, no ano passado todo mundo achava que a escola era um grande foco de contaminação. Entramos na pandemia num susto e agora temos que sair de forma organizada e planejada. No caso da educação, com kits para as crianças, EPIs, reformas que já foram feitas, para novas pias, abrir janelas, adaptação de banheiros, garantir distância.

Isso cada escola vai organizar?

Publicidade

Sim, a secretaria dá as diretrizes gerais. Por exemplo, os 35% de alunos autorizados na escola, a gente defende que se priorize na rede municipal os que não tiveram acesso à plataforma. Sabemos que 70% tiveram acesso ao Google Classroom, 20% acesso baixo e 10% nenhum acesso. Na hora de distribuir os 35%, esses últimos devem ir mais dias na escola. 

O senhor concorda com a obrigatoriedade dos alunos voltarem ao presencial?

Em altaEducação
Loading...Loading...
Loading...Loading...
Loading...Loading...

Não. Primeiro porque tem uma lei da cidade de São Paulo que fala que é optativo enquanto tiver pandemia. Claro, em situação normal, educação é obrigação do Estado, da família, está na Constituição, tem que ir para a escola. E se não for, tem que chamar o Ministério Público e conselho tutelar, mas estamos vivendo um momento diferente. Eu prefiro o convencimento. E gradativamente todos vão voltar porque a educação é necessária e importante. Tem que dialogar, entender os dramas, os medos. 

Tem ideia de quantos alunos vão voltar na rede municipal?

A pesquisa com os pais começou agora. Eu acho que vai ter uma mudança gradual. Eles vão ganhar confiança aos poucos. Todos querem voltar, acho que vivemos um bom momento de mostrar a importância da educação, algo que não se tratava.

Mas para escolas e professores é obrigatório voltar. Como a Prefeitura vai agir se uma escola resolver não voltar?

Escola é obrigatório voltar. Aí com muito jeito, a equipe da diretoria regional de ensino tem que ir na escola e falar dessa obrigatoriedade. E voltar. Eu acho que nós conseguimos convencer porque todo mundo tem compromisso com a educação. Na minha gestão, eu quero muito construir consensos, vamos agora convergir com o foco no aluno, na importância da escola. 

Publicidade

O senhor teme greve de professores agora?

Claro. Qual o princípio para a volta às aulas? É prejudicial para os alunos estarem fora da escola. O que a greve provoca? O aluno não estar na escola. Tudo que pudermos fazer, respeitando os 200 dias letivos, vamos fazer. Tive já duas conversas com os sindicatos em um mês. Deixei clara a minha posição, sou contra homeschooling, acho que adiar volta às aulas fortalece o discurso de quem defende que não precisa ter escola.

Como vai ficar o ensino remoto nas escolas municipais? O investimento foi mais em apostila, faltou aula online no ano passado.

Vamos poder usar o centro de mídias do Estado, com os nossos professores, com o currículo da cidade de São Paulo. No ano passado cada professor postou a sua aula, não teve algo da secretaria criar as aulas para toda a rede. Agora, com os tablets que serão entregues até abril, com chip, todo aluno vai ter acesso. A secretaria produz a aula e o professor da sala pode recomendar que assistam a aula tal, façam tal atividade. 

Quando a capital chegar à fase verde, 70% dos alunos poderão voltar para o presencial, como prevê o Estado?

Vamos sempre seguir a Saúde, o município pode ser mais restritivo que o Estado. A saúde analisará cada momento e nos orientará.

Como melhorar a qualidade do ensino na cidade, que ainda não é um dos melhores do País?

Publicidade

Temos o problema da pandemia este ano, com estratégias que juntam 2020, 2021 e eventualmente 2022. Estamos contratando professores para ajudar na alfabetização do 3 ano. Esse ano será um ponto fora da curva, mas todo foco tem que estar na melhoria da aprendizagem. Acho que a educação de São Paulo pode mais. Ela já tem o currículo da cidade, atrelado à Base Nacional Comum Curricular, tem professores qualificados, tem salário bom comparado com Brasil, mas temos que focar na formação dos professores. A formação inicial para prática pedagógica é precária. Nossa engrenagem precisa funcionar melhor, com supervisor, coordenador apoiando os professores para eles poderem dar melhores aulas, mais atrativas, para que os alunos aprendam mais. 

O senhor se arrependeu da condução na época da ocupação das escolas estaduais, em 2015, quando em um áudio vazado de uma reunião  mencionou que havia uma “uma guerra” contra os estudantes?

No áudio, para quem tiver paciência de ouvir, não declarei guerra a ninguém. Eu já tenho mais de 20 anos de serviço público e minha história fala por mim, eu sou um cara do diálogo, da conversa, estão agora até dizendo que eu que mandei a polícia nas escolas. Nem tudo foi glamour, nas ocupações tinha gente que não tinha nada a ver com as escolas, segurança contratada, estávamos no meio de um processo de impeachment, e aquilo era um foco de resistência. Mas, por outro lado, mostrou que temos que dar voz aos estudantes. Essa é a lição que se tira daquele processo, muito diálogo. 

O senhor é citado na investigação da “mafia da merenda” no governo de Geraldo Alckmin. Qual a sua relação com o caso? (um suposto esquema de fraude e irregularidades na compra de merenda em 2014).

Eu sou absolutamente inocente e vítima de uma injustiça. Um delator que estava foragido disse que o Fernando Capez (então deputado estadual pelo PSDB, que teria recebido propina para ajudar na contratação de uma cooperativa de alimentos pelo Estado) teria feito um contato comigo. Eu já sofri muito, já chorei muito, mata a alma, o coração. Eu já fui inocentado pela corregedoria, pela CPI, estou denunciado de uma forma esdrúxula, sou acusado de receber um telefonema que eu não recebi. A denúncia contra mim não foi nem aceita. Eu fiquei em um limbo. 

Comentários

Os comentários são exclusivos para assinantes do Estadão.