Rio

Escola de Maria Eduarda já teve 28 pedidos de transferência de alunos, mas 24 desistiram

Segundo professor, apenas quatro famílias mantiveram a vontade de mudar crianças de colégio

“Sapo Cururu” ganha versão para abordar violência urbana: psicólogos supervisionam volta às aulas na Escola Municipal Jornalista Daniel Piza
Foto:
Pablo Jacob
/ Agência O Globo
“Sapo Cururu” ganha versão para abordar violência urbana: psicólogos supervisionam volta às aulas na Escola Municipal Jornalista Daniel Piza Foto: Pablo Jacob / Agência O Globo

RIO - Vinte e oito pais de alunos da Escola Municipal Jornalista Daniel Piza, em Acari, onde a menina Maria Eduarda Alves da Conceição, de 13 anos, morreu baleada durante uma aula de educação física, manifestaram o desejo de trocar seus filhos de colégio. Nesta segunda-feira, todos foram apresentados a um projeto de reinício da vida escolar, com apoio de psicólogos e assistentes sociais da Secretaria municipal de Educação.Segundo o professor Edmilson Nascimento Freire, do Programa Interdisciplinar de Apoio à Escola (Proinape) do órgão, 24 acabaram sendo convencidos a mudar de ideia.

— Os pais foram acolhidos. A primeira coisa que falamos é que o desejo de trocar de unidade de ensino é legítimo. Mas explicamos o que está sendo feito para que as crianças voltem a ter confiança no dia a dia. A Escola Municipal Daniel Piza passou a ser assistida por três grupos de profissionais que atuam em três frentes: a ocupação da turma 1.701, da qual Maria Eduarda fazia parte, os colegas de treino de basquete e o atendimento aos funcionários. Quatro pais, depois de nos ouvirem, mantiveram o desejo de transferir os filhos. Os demais desistiram — contou Freire.

O professor disse ainda que a 6ª Coordenadoria Regional de Educação (CRE) decidiu oferecer aos pais que desejam a transferência três opções de escolas na região: Hilton Gama e Telêmaco, na Pavuna, e Monte Castelo, em Coelho Neto.

Freire e a assistente social Simone Cavalcanti do Amaral receberam 20 alunos, todos adolescentes, para conversar sobre a morte de Maria Eduarda. Pediram aos estudantes que falassem sobre a tragédia e expusessem seus temores.

— A maioria não quis conversar, não quis desabafar, mas, no fim do encontro, duas alunas se mostraram dispostas a expor seus anseios — contou Freire.

“Os pais foram acolhidos. O desejo de trocar de unidade de ensino é legítimo. Mas explicamos o que está sendo feito para que as crianças voltem a ter confiança no dia a dia”

Professor
Edmilson Nascimento Freire

Nesta segunda-feira, o pátio do colégio começou a encher aos poucos, e não teve meninos correndo atrás de bola, rodinhas de garotas ou troca-troca de figurinhas. Cenas corriqueiras até o último dia 30, quando Maria Eduarda morreu. A rotina começou a ser retomada com atividades culturais e lúdicas. Aulas, só semana que vem. A reaproximação de alunos e escola foi com sorrisos tímidos e muitos relatos tristes sobre os últimos momentos da adolescente, atingida por tiros de um confronto entre policiais militares e traficantes. Em frente à sala da direção, pais faziam fila para pedir a transferência de estudantes para outro colégio.

Também na manhã desta segunda, representantes da Secretaria municipal de Educação estiveram reunidos com profissionais de ensino e representantes de ONGs na 6ª CRE (Coordenadoria Regional de Educação) para elaborar estratégias de ação.

Perfurado por mais de 20 tiros de fuzil, o muro da escola passará por obras para ser recuperado, a partir da terça-feira da semana que vem, para não prejudicar a reconstituição do crime. Um engenheiro da prefeitura está avaliando os estragos na fachada para dizer como será a restauração. A prefeitura já anunciou a determinação de blindar escolas da rede, mas não adiantou prazos para as obras. Depois de limpo e pintado, o muro será grafitado por artistas da região. Segundo o diretor da unidade, Luíz Menezes, que acompanhou o engenheiro na avaliação, a ideia é deixar um espaço para moradores e estudantes expressem seus sentimentos e problemas do dia a dia.

HOMENAGEM LEMBRA MARIA EDUARDA

Nesta quarta-feira, policiais da Delegacia de Homicídios (DH) farão uma reprodução simulada do caso Maria Eduarda. Os agentes querem saber, entre outras coisas, se era possível Maria Eduarda ter sido vista pelos policiais militares que atiraram durante o confronto. Participarão da simulação o sargento David Centeno e o cabo Fábio de Barros Dias, que estão presos. Os PMs também respondem pelo homicídio qualificado de dois suspeitos baleados próximo à escola. Um vídeo mostra os policiais atirando em homens caídos no chão.

A área interna da Daniel Piza está repleta de cartazes e outros objetos presenteados por alunos de outras escolas públicas em homenagem à estudante Maria Eduarda, de 13 anos, morta por tiros de fuzil. Em um dos pilares do pátio interno, junto ao local onde adolescente foi baleada, há uma versão da música infantil “Sapo Cururu”. O texto foi enviado por alunos do Espaço de Desenvolvimento Infantil (EDI) Wesley Guilber Rodrigues de Andrade, nome de outro estudante morto por bala perdida em 2010, no Ciep Rubens Gomes. “Sapo Cururu/Tá com dó do Rio/ Pois nossas crianças/Oh, maninha/Estão morrendo a tiro”, diz um dos versos.