Por g1 SP — São Paulo


Renato Feder, Secretário da Educação do estado de São Paulo, durante coletiva — Foto: TV Globo

Os primeiros oito meses de Renato Feder à frente da Secretaria estadual da Educação de São Paulo (Seduc), no governo Tarcísio de Freitas (Republicanos), foram marcados por uma série de recuos após anúncios, motivados por críticas da comunidade escolar e da sociedade e até por decisões da Justiça desfavoráveis ao governo.

A notícia mais recente envolvendo a gestão Feder foi a saída do coordenador pedagógico da pasta, Renato Dias, nesta quarta-feira (6), após professores da rede estadual exporem erros graves de conteúdo no material didático produzido pela secretaria para serem usados nas aulas.

O g1 listou 10 momentos em que a secretaria foi alvo de críticas:

  1. Não adesão ao PNLD
  2. Materiais 100% digitais
  3. Erros no material didático
  4. Ensino sob vigilância
  5. Conflito de interesses
  6. Instalação de app sem autorização
  7. Compras sem licitação
  8. Fechamento de salas
  9. Falta de psicólogos em escolas
  10. Cancelamento de matrículas

Não adesão ao PNLD

Em julho deste ano, a Seduc decidiu que a rede estadual não iria aderir ao material didático e pedagógico do Programa Nacional de Livros Didáticos (PNLD), do Ministério da Educação, para turmas do 6º ano em diante, a partir de 2024.

Com a medida, os alunos dos anos finais do ensino fundamental e do ensino médio estadual utilizariam somente o material próprio, produzido e distribuído pela secretaria.

Esta seria a primeira vez que o estado paulista ficaria fora do PNLD. Porém, após críticas da comunidade escolar e de especialistas em Educação, a Justiça foi acionada e determinou que São Paulo fizesse a adesão do programa nacional para o próximo ano, o que, segundo a gestão Feder, foi realizado na tarde de 15 de agosto.

Em nota, à época, a pasta afirmou que a decisão de permanecer no programa veio "a partir da escuta e do diálogo com a sociedade, que resultou no entendimento de que mais esclarecimentos precisam ser prestados antes de que a mudança seja efetivada".

Materiais 100% digitais

Quando confirmou a não adesão ao PNLD, a Seduc também informou que forneceria material didático próprio para os estudantes da rede estadual, sendo ele 100% digital para alunos entre o 6º e 9º ano do ensino fundamental e também para o ensino médio.

Devido aos problemas de conectividade nas diversas regiões do estado, a pasta autorizou as unidades de ensino a imprimirem o material para uso de estudantes que necessitarem.

Contudo, após a repercussão negativa do tema, o governo decidiu fornecer a versão impressa do material para todos os alunos a partir do 6º ano da rede. De acordo com a Seduc, o custo já estava previsto no orçamento da pasta para o próximo ano.

Erros no material didático

Nas últimas semanas, professores da rede estadual de ensino relataram que o material didático produzido pela Seduc para as aulas do ensino fundamental apresentavam erros graves em diferentes disciplinas, entre elas história, biologia e matemática.

A pasta afirma que afastou os servidores responsáveis pelos erros no material e que corrigiu o conteúdo, que está no formato digital e é editável.

Ainda assim, a Justiça de São Paulo determinou que a secretaria retirasse os arquivos modificados do ar até que fossem totalmente revisados e colocados no padrão do Ministério da Educação, estipulando uma multa diária de R$ 10 mil em caso de descumprimento.

Ensino sob vigilância

Uma portaria da secretaria publicada em 28 de julho determina que diretores terão que assistir duas vezes por semana às aulas ministradas nas escolas estaduais e preencher semanalmente um relatório sobre os professores, que também terão de assinar o documento.

A publicação estabelece que devem ser avaliados aspectos como interação dos estudantes com as atividades, gestão do tempo, recursos utilizados e clima entre professor e alunos na sala de aula, apontando os pontos positivos identificados e os que ainda precisam ser melhorados.

Para os docentes, a medida não é prática, devido ao volume de relatórios que seriam produzidos, e cria desconfiança e tensão dentro do ambiente escolar.

Instalação de app sem autorização

No início de agosto, o aplicativo "Minha Escola", da Secretaria da Educação, foi instalado de forma automática e sem autorização nos celulares pessoais de professores e responsáveis por alunos da rede estadual, o que infringe a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD).

De acordo com a Seduc, o incidente ocorreu durante um teste promovido pela área técnica da pasta em dispositivos da secretaria, mas teria afetado aparelhos conectados às contas de email institucionais devido a uma "falha". Um processo administrativo foi instaurado para apurar o ocorrido.

Um problema similar de instalação automática ocorreu no Paraná, em novembro de 2022, quando Feder ainda era secretário da Educação do estado. Na ocasião, a pasta também afirmou se tratar de um erro.

Conflito de interesses

O Ministério Público de São Paulo instaurou em março deste ano um procedimento para investigar o secretário Renato Feder por conflito de interesse em contratos firmados pela gestão estadual com uma empresa da qual ele é acionista.

De acordo com o governador Tarcísio, os acordos com a Seduc foram realizados no governo anterior, antes de Feder assumir a pasta.

Haveria ainda alguns firmados com outras secretarias, durante a atual gestão da Seduc, mas o chefe do Executivo estadual afirmou que "são contratos muito pequenos que foram feitos dentro da regra do jogo". Ainda assim, proibiu novas contratações da empresa em questão.

Compras sem licitação

Em agosto, o governo desistiu de realizar a compra de 68 títulos de livros literários sem processo licitatório. O acordo, que seria firmado com a empresa Bookwire Brasil, previa a disponibilização das obras para 2,9 milhões de alunos da rede, totalizando cerca de 197,2 milhões de acessos ("cópias" dos livros virtuais).

A pasta não havia esclarecido a razão do investimento, uma vez que permanece ativa no PNLD para a distribuição de livros literários - ou seja, recebe esse tipo de material do Ministério da Educação. Segundo apurado pelo g1, ao menos dois dos livros que seriam comprados já faziam parte da lista dos fornecidos pelo MEC.

Procurada, a Bookwire Brasil afirmou que o valor total era de R$ 4,51 milhões para a licença por título de 1 ano. Pela lei, os contratos da gestão pública só podem ser firmados sem licitação em casos emergenciais, valores menores de R$ 50 mil e quando não há empresas concorrentes no mercado.

Fechamento de salas

Durante o primeiro semestre, a pasta confirmou o fechamento de 327 salas de aulas da rede estadual, redistribuindo os estudantes afetados dentro de suas próprias unidades de ensino.

Segundo a pasta, o processo de redimensionamento de turmas segue resoluções de governos anteriores e ocorre quando, ao final de cada bimestre, é constatado aumento ou diminuição relevante no número de alunos em uma escola.

A medida foi alvo de críticas de estudantes e professores, que temiam uma piora na qualidade do ensino devido a uma possível sobrecarga dos docentes.

Contudo, a Seduc afirma que, após as mudanças, a rede ficou com uma média de 24 alunos por sala.

Psicólogos na escola

Em abril, após o atentado a faca na Escola Estadual Thomazia Montoro, na Zona Oeste da capital paulista, o governo de São Paulo prometeu contratar 550 psicólogos para atuarem na rede de ensino.

À época, o secretário Feder disse que a ideia era que todas as unidades escolares do estado recebessem visitas semanais dos profissionais. Contudo, as contratações só foram concluídas em agosto, quase cinco meses após o episódio que resultou na morte de uma professora e deixou outras quatro pessoas feridas.

Ao g1, docentes da escola atacada disseram se sentir "órfãos do Estado" após todo esse tempo. Alunos da unidade também relataram falta de apoio psicológico.

A Seduc alega que a demora ocorreu em razão dos prazos do processo licitatório. O primeiro grupo, de 368 psicólogos, começou a trabalhar na rede estadual na última semana de agosto.

Cancelamento de matrículas

O Ministério Público de São Paulo instaurou um inquérito civil em 25 de agosto para apurar uma resolução da Seduc que permite o cancelamento da matrícula de alunos com mais de 15 faltas consecutivas.

O documento publicado em julho pela secretaria não cita o acionamento do Conselho Tutelar, como estabelece a Lei 13.803, de 2019, para os casos em que a quantidade de faltas ultrapassar 30% do permitido.

Segundo o MP, a medida caracteriza uma "possível violação ao Direito Constitucional de Permanência Escolar". A Lei de Diretrizes e Bases da Educação (LDB – Lei 9.394, de 1996) estabelece que um aluno não pode ser aprovado caso apresente uma quantidade de faltas superior a 25% das horas-aula dadas no ano letivo, mas a quantidade de faltas não pode impactar o direito à permanência escolar.

Nesta quarta-feira (6), a gestão Feder publicou uma nova resolução com procedimentos que devem ser adotados pela direção das escolas no combate à evasão escolar a partir do momento em que forem identificadas três faltas consecutivas não justificadas, dentre elas o acionamento do Conselho Tutelar.

Quem é Renato Feder

Renato Feder, secretário da Educação de SP — Foto: Divulgação/GESP

Natural de São Paulo, Feder é formado em administração pela Fundação Getúlio Vargas (FGV) e mestre em economia pela Universidade de São Paulo (USP). Ele já atuou como professor, gestor e diretor de escolas.

Feder foi anunciado como membro do time de secretários do governador Tarcísio de Freitas em novembro de 2022. Na época, ele ainda estava no comando da pasta da Educação no estado do Paraná.

Secretário por quatro anos na região Sul do país, ele trabalhou pela implantação de escolas cívico-militares e de aulas de programação, empreendedorismo e educação financeira no currículo paranaense.

Uma de suas marcas é a defesa de um projeto de parcerias com empresas privadas para a gestão de escolas da rede pública de ensino.

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