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O Brasil tem fracassado no desafio educacional mais simples e relevante: ensinar as crianças a ler e a escrever. Entre 2019 e 2021, a parcela alfabetizada dos alunos da rede pública diminuiu a ponto de os não alfabetizados se tornarem maioria entre os alunos matriculados no 2º ano do ensino fundamental — etapa em que todas as crianças deveriam estar alfabetizadas.

Em 2019, 60,3% dos estudantes pesquisados pelo Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep) sabiam ler e escrever o básico. A proporção retrocedeu em 2021 para 43,6%, uma queda vertiginosa de 16,7 pontos percentuais. Levantamento conjunto feito por Itaú Social, Fundação Lemann e Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) constatou que 40% dos alunos tinham dificuldades de aprendizado e que 11% enfrentavam dificuldades em leitura e escrita incompatíveis com a série em que estavam matriculados.

É verdade que a pandemia causou prejuízo ao aprendizado. Como única alternativa, o ensino passou a ser feito à distância, e os resultados obtidos foram flagrantemente negativos. Parte do retrocesso na alfabetização tem relação com isso, mas a pandemia não pode ser tida como responsável por todas as mazelas do ensino brasileiro. Mesmo antes da Covid-19, em 2019, 39,7% dos alunos eram considerados não alfabetizados pela pesquisa do Inep. No último Estudo Internacional de Progresso em Leitura, o teste de alfabetização conhecido pela sigla em inglês Pirls, o Brasil ficou à frente apenas de cinco países num ranking de 65.

Constatado o problema, o MEC lançou em junho uma política para tentar ajudar estados e municípios a reverter a situação vergonhosa: o Compromisso Nacional Criança Alfabetizada. O governo federal pretende investir R$ 1 bilhão neste ano e R$ 3 bilhões nos próximos três. O dinheiro servirá para distribuir 7 mil bolsas a articuladores do programa de alfabetização nos estados e municípios, se destinará à formação de professores especializados em alfabetização e financiará a produção de material didático. O resultado é incerto, devido à disparidade entre as estruturas educacionais de 27 unidades federativas e 5.570 municípios. O monitoramento constante da execução do programa será vital para evitar erros e desperdício de recursos.

Nos 35 anos desde a redemocratização, o poder público vem, acertadamente, dando atenção à educação. As frentes são múltiplas. Nos últimos tempos, ganharam prioridade a qualidade dos ensinos fundamental e médio, este sujeito a altas taxas de evasão. Antes de tudo, porém, é essencial tratar da alfabetização. Sem saber ler nem escrever direito, não há como o aluno usufruir o que lhe será ensinado depois. O ideal é que também haja cuidado especial com as creches públicas, para que não sejam apenas um espaço para pais e mães deixarem os filhos enquanto trabalham. Crianças precisam ser estimuladas desde cedo.

Prevista na Constituição, a alfabetização é um dos direitos mais negligenciados pelo Estado. Os avanços verificados no passado não servem para abater a dívida que o poder público ainda tem. O Brasil precisa encarar com seriedade a missão de erradicar a vergonha do analfabetismo.

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