Antônio Gois
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Antônio Gois

Um espaço para debater educação

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Antônio Gois

Jornalista de educação desde 1996. Autor dos livros 'O Ponto a Que Chegamos'; 'Quatro Décadas de Gestão Educacional no Brasil' e 'Líderes na Escola'.

Por Antônio Gois — Rio


No meio dos acalorados debates sobre o que fazer com o Novo Ensino Médio, é importante que a necessária discussão sobre o desenho curricular não se sobreponha a outras ações estruturantes que precisam ser feitas nesta etapa. A boa notícia neste front é que há mais concordâncias do que discordâncias, mas, como sempre em educação, não há bala de prata.

Um ponto central do debate é a evasão escolar. Na transição entre os anos letivos de 2019 e 2020 — portanto pré-pandemia e antes de a implementação do Novo Ensino Médio começar para valer — o percentual de jovens que evadiram da escola nesta etapa chegou a 7%, patamar bastante superior ao verificado no fundamental (2%). Como sempre, há significativas desigualdades regionais. No Mato Grosso, por exemplo, a taxa de evasão no período chegou a 13%, enquanto Pernambuco — um notável caso de sucesso para padrões nacionais — apresentou o menor percentual: 4%.

É fato que inúmeras pesquisas já destacaram como uma das causas relevantes da evasão o descontentamento do jovem com a escola, um sinal de que a discussão sobre estrutura curricular não pode ser desprezada. Porém, há farta literatura acadêmica apontando que fatores extra-escolares — como a necessidade de trabalhar e a gravidez precoce não-planejada — são também relevantes nessa complexa equação que leva um estudante a desistir de estudar antes de completar a educação básica.

Aqui são necessárias políticas intersetoriais (envolvendo áreas de saúde, emprego e assistência social). Uma das promessas do atual governo nessa direção é o pagamento de incentivos financeiros aos jovens. Se bem desenhado, pode contribuir com esse esforço, mas certamente não será, isoladamente, suficiente para resolver o problema.

Outro ponto importante é a adequação da formação docente. De novo utilizando um indicador pré-pandemia e anterior à implementação do Novo Ensino Médio, em 2019, apenas 63% dos professores desta etapa tinham formação plenamente adequada para a disciplina que lecionavam. Um percentual relevante (25%) possuía licenciatura em área diferente da disciplina que assumiam na escola (por exemplo, um professor de matemática que dá aulas de física). O restante dos casos mapeados pelo Inep é de professores sem licenciatura ou até (casos mais raros) sem ensino superior completo. Portanto, sem olhar para políticas de formação, contratação e carreira, qualquer mudança — por melhor ou pior que seja — será impactada por isso.

O Censo Escolar do MEC mostra também outros desafios estruturais, como a infraestrutura. Por exemplo, quase metade (49%) das escolas não tem laboratório de ciência, 23% não possuem quadra de esporte, e em 12% faltam até bibliotecas ou salas de leitura. Somam-se a essas também questões como a gestão do clima escolar, atenção à saúde mental, entre tantas outras que não são resolvidas por reformas curriculares.

Em discussões acaloradas, por vezes há um exagero de rotular mudanças como se fossem, sozinhas, grandes soluções ou ameaças gravíssimas para o futuro dos jovens. Propostas como a do Novo Ensino Médio podem até amenizar ou agravar problemas, mas, sem considerar esses e outros fatores estruturais, o debate ficará sempre limitado.

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