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Por e — Rio de Janeiro

A participação de estudantes do final do ensino médio no Enem caiu entre os alunos da rede pública quase pela metade em seis anos. Levantamento de O GLOBO com os dados do Inep mostra que, em 2016, quando houve a maior adesão, 67% dos jovens do 3º ano se inscreveram e fizeram os dois dias da prova. Em 2022, última edição com dados disponíveis, esse patamar despencou para 38%. Isso significa que só quatro em cada dez alunos que estão terminando a educação básica foram fazer a prova mais importante para o acesso ao ensino superior no país. Essa é a “maior preocupação” do ministro da Educação, Camilo Santana, para o Enem 2024.

— A nossa maior preocupação e prioridade é como garantir que os alunos matriculados no 3º ano do ensino médio façam o Enem. Como há estados que têm 90% de inscritos e outros têm 40%? Isso é um trabalho que vamos procurar fazer, encontrar mecanismos para estimular a inscrição de jovens, numa articulação com os estados — afirmou Camilo, no fim do segundo domingo do exame deste ano.

O Enem, como um todo, sofreu uma redução na quantidade de participantes. Os anos de 2021 e 2022 foram os com menor número de inscritos no exame: 3,1 milhões e 3,3 milhões, respectivamente.

Dados sobre os alunos da rede de ensino — Foto: Editoria de Arte
Dados sobre os alunos da rede de ensino — Foto: Editoria de Arte

Em 2023, houve um crescimento de 540 mil candidatos, em especial entre pessoas que já se formaram e têm direito à gratuidade (aumento de 43% em relação a 2022). Este grupo é formado por pessoas mais pobres que estão fora da escola e buscam melhor qualificação. O número de isenções para alunos de escolas públicas ou bolsistas de colégios privados cresceu bem menos, apenas 6%.

De acordo com especialistas, a crise econômica, que leva os jovens a buscarem uma fonte de renda mais imediata, e a pandemia, que atrapalhou a formação dos alunos que fizeram o Enem de 2020 a 2023, são as principais responsáveis por essas quedas, incluindo a participação dos estudantes ao fim do ensino médio. É uma combinação de urgência com falta de esperança e de confiança na escola.

— Na prática, os alunos de escolas públicas estão desesperançados ou não sonham alto, não confiam na sua possibilidade de passar no Enem — afirma Cláudia Costin, presidente do Instituto Singularidades e professora visitante na Universidade de Harvard.

Nesse cenário adverso, a participação dos alunos que estão terminando o ensino médio em escolas públicas pode ser garantida pela mobilização das próprias redes de ensino, avaliam analistas. Esse é um trabalho que deve ser feito especialmente pelas redes estaduais, responsáveis por 84% das matrículas do ensino médio brasileiro.

— Esse dado faz muita referência a quanto as secretarias de Educação mobilizam os alunos para o Enem e a se prepararem para a vida — afirma Costin. — O aluno tem que perceber que a escola o prepara bem. Mas também tem que desenvolver mais confiança na sua capacidade de aprender. São duas coisas que andam juntas, mas cada uma delas é um fenômeno. Uma fala da confiança dele como indivíduo, e outra na confiança nos professores.

No Ceará, a rede estadual garante apoio aos interessados desde o processo de obtenção de documentos necessários, passando pela inscrição, preparação pedagógica e até a garantia de transporte aos estudantes nos dias da prova e montagem de pontos de apoio com a distribuição de kits de lanches e água. Com isso, o estado conseguiu que 71% de seus alunos efetivamente fizessem a prova, o maior índice do país.

— O incentivo da minha escola foi muito importante e todo mundo foi fazer a prova. Mesmo aqueles que não querem, os professores ajudam, conversam com a família — conta Elias da Silva, aluno da rede estadual do Ceará. — Incentivar o estudante a ler, a se inscrever no Enem, nos faz acreditar que somos capazes de entrar mesmo sendo de escola pública e de periferia.

Três estados não conseguiram chegar aos 30% de participação: Roraima (23%), São Paulo (29%) e Bahia (29%). Em 2016, nenhum estado tinha menos da metade dos estudantes de escolas públicas fazendo o Enem.

— Não dá para imaginar uma política de Ensino Médio sem pensar no Enem. A formação não é só para ele, mas é também para ele — afirmou Ernesto Faria, diretor-fundador do Interdisciplinaridade e Evidências no Debate Educacional (Iede). — É necessária a disponibilização de materiais, diretrizes, e isso tem que estar nas políticas estaduais do ensino médio. Os estados têm o dever de entender a relevância da prova. O MEC não deveria ter que mostrar isso.

Presidente do grêmio de um colégio estadual em Itaquaquecetuba (SP), Wendell Augusto criou um mutirão de inscrição para os colegas entenderem a importância do exame.

— O pessoal não sabia as datas de inscrição, nada. A galera não se inscrevia porque não tinha perspectiva. Não procuravam saber as possibilidades também. O governo tem de pegar na mão do estudante, apoiar, fazer intensivão para o Enem dentro das escolas — defende.

Apesar de não administrar diretamente as escolas, o Ministério da Educação, para Ernesto, tem trabalho a fazer. O diretor do Iede afirma que o governo federal pode mobilizar os estados para garantir condições como transporte gratuito e bônus no boletim:

— O MEC deve buscar criar incentivos para os alunos do ensino médio fazerem a prova, como vincular o exame com as estratégias pedagógicas do 3º ano, dar incentivos ou pontos no boletim.

O que fazem os estados

Em nota, a Secretaria da Educação do Estado de São Paulo informou que foi disponibilizado neste ano uma plataforma para preparação do Enem com simulados e exercícios, acessada por 73% dos alunos no 3º ano do enino médio. Além disso, em 2024 haverá um componente curricular novo chamado Aceleração para Vestibular, para “garantir um contato semanal com modelos de avaliações para ingresso ao ensino superior”.

A secretaria da Bahia alegou que mais de 3,2 mil estudantes da rede estadual de ensino que cursaram a 3ª série do Ensino Médio em 2022 foram aprovados em universidades públicas. Naquele ano, o estado teve 163 mil estudantes matriculados nesta etapa escolar.

O estado também alegou que ofereceu passe livre aos estudantes com o metrô gratuito em Salvador e parcerias com prefeituras do interior para a abertura das catracas de ônibus, além de entregar kits com lanches, lápis e canetas e ações motivacionais e de preparar acolhimento nos locais de prova do Enem. O governo de Roraima não respondeu aos questionamentos sobre o baixo percentual de inscrição.

*Giovanna Durães é estagiária sob orientação de Thiago Prado

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