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Enem com foco

Batalha ideológica em torno do exame prejudica debate para seu aperfeiçoamento

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Alunos aguardam abertura dos portões da Unip para realizar a prova do Enem, em São Paulo (SP) - Zanone Fraissat - 5.nov.23/ Folhapress

Uma das principais trincheiras da guerra cultural travada no campo político é a da educação. Setores mais populistas e radicais da direita atribuem as mazelas do ensino nacional à ideologização do currículo escolar pela esquerda —um fenômeno observável episodicamente, mas tratado de modo desproporcional e casuístico.

Nesse contexto, o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) se converteu em um cavalo de batalha. O governo de Jair Bolsonaro (PL) tinha aversão a qualquer questão que abordasse identidade de gênero e, durante sua gestão, a prova não teve perguntas que falassem em ditadura militar.

Na edição deste ano, que começou no domingo passado (5), lideranças ruralistas se indignaram com duas questões que criariam uma imagem negativa do agronegócio —uma delas de fato trazia um texto panfletário e estava repleta de jargões esquerdistas. Entretanto a celeuma criada tomou a parte pelo todo de 90 questões.

Esse tipo de catastrofismo tem prejudicado um debate mais produtivo sobre o Enem, que, sim, merece aperfeiçoamentos não limitados aos vieses ideológicos.

A elaboração de um exame de tal alcance não é trivial. As questões são formuladas por professores universitários selecionados por meio de edital e passam por revisão de uma comissão.

São testadas, ou seja, submetidas a várias pessoas, para avaliar atributos como o grau de dificuldade e o risco de que o avaliado consiga acertar sem real conhecimento do assunto. Tal procedimento se baseia na chamada Teoria de Resposta ao Item (TRI).

Em 2021, a Folha realizou análise estatística de 24 questões criticadas por conservadores ou que abordavam a ditadura militar em provas do Enem realizadas entre 2009 e 2019, com o objetivo de verificar se foram eficientes em testar o conhecimento técnico dos alunos. Concluiu-se que sim.

No entanto é costumeiro notar nas provas, especialmente em linguagem e humanidades, perguntas um tanto nebulosas e alternativas dúbias de respostas. Num recente exemplo anedótico, o músico Caetano Veloso revelou dificuldade em responder a uma questão relativa a sua obra.

Ademais, avaliações como o Enem acabam influenciando a bibliografia e a abordagem dos conteúdos ministrados em sala de aula. Privilegia-se, afinal, o que tem mais chances de estar na prova.

Nesse sentido, é importante que o exame estimule a diversidade intelectual com ampliação do escopo de autores, fontes e linhas de pensamento. Tal providência salutar contribuiria para a melhoria da formação e do espírito crítico dos estudantes brasileiros.

editoriais@grupofolha.com.br

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