Brasil Educação Enem e vestibular

Enem ainda não tem detectores de metal garantidos para aplicação de prova

A três meses do exame, Inep briga na justiça para conseguir o equipamento, que evita fraudes
Candidatos chegam para fazer prova do Enem 2016 Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo
Candidatos chegam para fazer prova do Enem 2016 Foto: Alexandre Cassiano / Agência O Globo

BRASÍLIA- A menos de três meses da aplicação do Exame Nacional do Ensino Médio (Enem), o Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), autarquia vinculada ao Ministério da Educação responsável pela avaliação, ainda não tem os detectores de metal para serem usados nos locais de prova. A medida de segurança foi adotada nas últimas edições do exame para evitar fraudes.

Ao se dar conta do problema, o Inep exigiu do Centro Brasileiro de Pesquisa em Avaliação e Seleção e de Promoção de Eventos (Cebraspe) — responsável por aplicar e corrigir o Enem durante anos até ter o contrato rescindido no início de 2017 — o repasse de 81.376 equipamentos, alegando ser o dono do material. O Cebraspe, por sua vez, sustenta que o acervo lhe pertence e que não tem obrigação de cedê-lo. A briga em torno dos detectores, que só aumenta à medida que se aproxima a data do Enem, marcado para os dias 5 e 12 de novembro, foi parar na Justiça.

A juíza federal Diana Maria Wanderlei da Silva, em sua decisão no último dia 9, deu razão ao Cebraspe. Ela determinou que a organização é a proprietária dos equipamentos e que não pode ser obrigada a entregá-los ao Instituto para a realização do exame. “O Inep não comprovou, em momento algum, que os detectores de metal, objetos desta ação, foram adquiridos com recursos próprios, ou que foram registrados no seu inventário patrimonial, com identificação específica, para dar-lhe a legitimidade ao pedido administrativo de devolução a qualquer tempo”.

O Inep sustenta que nos pagamentos feitos ao Cebraspe para a realização do Enem, de 2014 a 2016, estavam incluídos os custos unitários dos equipamentos. Alega ainda que em contratos com organizações sociais, como é o caso da entidade que aplicava o exame, os bens adquiridos são de propriedade do poder público. O Cebraspe, então, apresentou notas fiscais de aquisição de 80 mil unidades de detectores em seu nome e endereço para entrega. Além disso, anexou ao processo planilhas de custos apresentadas em 2016 especificando a “utilização, manutenção, higienização” de 30 mil equipamentos, para reforçar a tese de que a autarquia pagava pelo uso, mas não era proprietária do material. Na decisão, a juíza Diana Silva ainda argumentou: “Se a propriedade fosse do Inep, não poderia o Cebraspe utilizar os detectores em outros certames realizados”. O Inep entrou com pedido de reconsideração da decisão, que foi mantida pela magistrada.

Por trás do imbróglio em relação aos detectores está um desentendimento anterior por conta da decisão do instituto de não assinar o aditivo com o Cebraspe para o Enem 2017. A decisão do governo retirou cerca de 80% da arrecadação do centro, que teme não conseguir se manter financeiramente, apesar de fazer concursos, vestibulares e estudos educacionais pelo país. Em seu lugar, o governo escolheu para o Enem deste ano, com mais de 7 milhões de inscritos, o consórcio formado por Fundação Cesgranrio, Fundação Getulio Vargas (FGV) e Vunesp. A escolha para aplicar e corrigir as provas é feita sem licitação, com aval do Tribunal de Contas da União (TCU), desde 2009, pela complexidade de executar uma avaliação do tamanho do Enem, que acontece no país inteiro.

Feita a troca, o Inep atentou para a falta de detectores em quantidade suficiente e procurou o Cebraspe para propor uma locação do equipamento. A organização social, porém, decidiu não aceitar a proposta. Em parte porque necessita do material para realização de concursos já contratados, mas também por conta do mal-estar provocado com sua retirada da organização do Enem.

Sem saída, a autarquia do MEC enviou um ofício, em julho, ao Cebraspe, com o pedido de entrega dos detectores até que se conclua a discussão sobre sua propriedade, alertando para a adoção das medidas judiciais cabíveis, caso não fosse atendida. Depois da mensagem, considerada ameaçadora, a organização decidiu entrar com um mandado de segurança preventivo para não ser obrigada a entregar o equipamento.

Por meio de nota, o Inep informou que a aplicação do Enem 2017 “contará com a utilização de detectores de metal, em todos os locais de prova”, mas não respondeu de que forma garantirá tal medida de segurança, nem comentou a disputa com o Cebraspe.

Já o centro informou, após ser procurado, que comprou 80 mil detectores de metal entre 2014 e 2016 e disse ser “evidente que esses aparelhos são de sua propriedade”, mas que analisa atender à solicitação do Inep, ao menos parcialmente. A organização social ressaltou, em nota, que não há qualquer obrigação contratual para a cessão desses aparelhos para o atual consórcio que realizará o Enem. Mas, “com o intuito de contribuir para o êxito dessa aplicação”, diz que analisa "os aspectos jurídicos, estatutários e técnicos para verificar a possibilidade de cessão de parte dos detectores”.

APARELHOS EVITAM FRAUDE NO EXAME

Desde que o Exame Nacional do Ensino Médio (Enem) se tornou um meio de seleção para as universidades, em 2009, a segurança da prova virou ponto primordial. Logo na primeira edição do “novo Enem", naquele ano, a prova foi roubada da gráfica, o que levou à substituição do consórcio, escolhido pelo menor preço, o Conasel, pelo Cespe, hoje Cebraspe. A partir de então, o fantasma da fraude colou de vez na seleção.

A cada ano, porém, a prova foi ganhando mais relevância, com a adesão gradual das universidades públicas. A avaliação também passou a ser critério para acessar o ensino superior privado por meio do Programa Universidade para Todos (ProUni) e do Fundo de Financiamento Estudantil (Fies). Neste ano, 7,3 milhões candidatos se submeterão ao teste . O discurso do combate a fraudes no Enem foi amplificado na gestão Michel Temer.

Na primeira edição do teste comandada pela equipe do ministro Mendonça Filho, no ano passado, uma operação da Polícia Federal (PF) foi deflagrada nas salas de prova e noticiada até com fotos dos pontos eletrônicos usados por uma quadrilha especializada em fraudar o teste. A ação, no entanto, não minimizou a exposição de outros problemas. Em dezembro, o Ministério Público Federal informou que um relatório da PF concluiu que as provas do primeiro e do segundo dias do exame, além da redação, vazaram antes do início da aplicação.

O Inep negou e a PF não se pronunciou à época. Agora, a falta de detectores de metal se apresenta como um problema a mais num processo vulnerável. O equipamento, em forma de raquete, permite uma "revista" em grande escala para inibir a entrada de candidatos com acessórios usados em fraudes, como microcelulares e pontos eletrônicos. O aparelho vinha sendo usado desde 2014.