Encaminhamentos de jovens para ajuda especializada em saúde mental cresceram após pandemia
A readaptação às aulas presenciais após quase dois anos de pandemia tem exigido muito mais atenção dos profissionais de educação e, segundo a coordenadora de uma escola da rede pública de São Paulo ouvida pelo Profissão Repórter, os encaminhamentos de alunos para os Caps - Centros de Atenção Psicossocial - cresceram muito.
"São muitos os desafios, acho que o principal é a convivência. Entender que não estou em um espaço domiciliar, então os limites vão ser outros. Vão ter alunos que vão estar incomodados com a aparência, inseguros de estar aqui no ambiente escolar, e vão estar mais retraídos. Eu vou ter outros que, pelo contrário, manifestam agressividade, estão com dificuldade de lidar com o outro. Então, às vezes, um pisão, um esbarro, vira uma situação de conflito. Tivemos um aumento dos encaminhamentos ao Caps, por dois pontos: apareceram, sim, mais casos, mas também as famílias têm recorrido à escola", conta a coordenadora Camila Mendes.
Diante das mudanças de comportamento percebidas em crianças e adolescentes, não só os professores, mas também os pais têm buscado ajuda especializada. Segundo a coordenadora do Caps Campo Limpo, de São Paulo, o local tem recebido mais de 100 pacientes novos por dia.
Nossa equipe foi até o local para acompanhar uma consulta de Gustavo, de 9 anos, e também conheceu João Ferreira da Silva, de 14 anos, que estava com o pai. O adolescente está tomando remédio desde o ano passado e também recebeu as seguintes recomendações: inserir atividade de esporte, cultura e lazer no dia a dia para sair um pouco de casa e diminuir o tempo nas telas.
"As crianças que estão demandando mais, que vem procurar mais um apoio, são as crianças do primeiro ano fundamental. A impressão que eu tenho é que ficaram quase dois anos sem o processo da rotina escolar e aí essas crianças estão atrasadas pedagogicamente, tanto no que diz respeito à aprendizagem como à socialização, sabe? Acho que vai deixando muito claro a importância da escola no desenvolvimento das crianças. E não é só importante pela questão do ensino, do conteúdo, mas também da rotina, da interação com outras crianças, da mediação de conflitos", destaca Andreia Maria Silva, psicóloga do Caps.
Na escola onde os jovens estudam, quando questionados se estavam felizes com a volta das aulas presenciais, todos os alunos de uma turma de crianças de oito a nove anos, garantiram que sim.
Luísa Bezerra Soares: "Me sentia triste, porque não tinha nada para fazer em casa. Aí eu brincava de escolinha, fingia que eu era a aluna comportada, mas mesmo assim não matava a saudade"
Ariane Oliveira: "Enquanto estava essa pandemia estava muito chato. Eu cheguei a chorar em casa".
Miguel Almeida: "Eu me senti meio triste, porque as aulas tinham acabado e porque ia vir o passeio, que foi cancelado".
Ester Maria da Silva: "Me sentia sozinha. Sem fazer nada, sem companhia. Agora está tudo mais calmo".
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Edição de 05/07/2022 - Saúde mental nas escolas