Educação

Eles conciliam trabalho e educação

Eles conciliam trabalho e educação

Para quem precisa trabalhar cedo, concluir os estudos ainda é um desafio. A Lei do Aprendiz foi um avanço, mas ainda há muito a ser feito

DA REDAÇÃO DA FUNDAÇÃO ROBERTO MARINHO
11/08/2017 - 16h25 - Atualizado 11/08/2017 17h12
Alunos do Programa Aprendiz Legal em Porto Alegre (Foto: Divulgação)

A estudante pernambucana Amanda Kelly Maria de Oliveira engravidou aos 15 anos. Mas não desistiu dos estudos e manteve-se na escola até o nono mês de gravidez. Após o parto, porém, precisou se dedicar à filha, Brena, e não pôde continuar frequentando a escola. Sua vontade de aprender e a indispensável ajuda da mãe garantiram que ela retornasse para a sala de aula pouco tempo depois.

Hoje, Amanda é estudante do Travessia, iniciativa do governo do estado de Pernambuco em parceria com a Fundação Roberto Marinho. O projeto é implementado em escolas públicas do estado para garantir que jovens e adultos, que cursavam séries não adequadas para a idade, concluam seus estudos com qualidade e no tempo certo.

“Tenho enorme prazer de aprender, de estar em sala de aula com meus colegas e professor. Quero cursar Direito, ser exemplo para minha filha, para que ela não pare de estudar nunca”, diz Amanda, de 18 anos, moradora do município de Jaboatão dos Guararapes, na região metropolitana do Recife.

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Para Vilma Guimarães, gerente-geral de educação da Fundação Roberto Marinho, o Dia do Estudante precisa ser comemorado diariamente, para que o direito do acesso à educação de qualidade para todos seja lembrado sempre. “Sabemos que, quanto maior a escolaridade dos pais, maior a dos filhos. Cada estudante que tem acesso a uma educação de qualidade impacta três gerações à frente. Precisamos pensar a educação como um direito indispensável para o presente e o futuro da sociedade”, diz.

O Travessia usa a metodologia do Telecurso, reconhecida pelo Ministério da Educação (MEC) e é adotada atualmente como política pública para apoiar a solução dos principais desafios da educação básica brasileira. 

Direito de estudar para os jovens que precisam trabalhar

O Dia do Estudante traz à tona também uma realidade que se torna dramática especialmente em épocas de conjuntura econômica difícil: os jovens que são obrigados a parar de estudar para trabalhar. Dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domicílio (Pnad), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), relativos a 2015, mostram que cerca de 2,6 milhões de crianças e adolescentes estão em situação irregular de trabalho no país – desses, 2 milhões na faixa dos 14 aos 17 anos. Em 2014, esse número alcançava 3 milhões de crianças e adolescentes, com 2,7 milhões deles na faixa de 15 a 17 anos.

Nesse contexto, é fundamental lembrar também de uma lei que permite ao jovem que precisa trabalhar a oportunidade de continuar estudando: a Lei da Aprendizagem (Lei 10.097/2000). No Brasil, o trabalho é totalmente proibido antes dos 16 anos, exceto como aprendiz. O programa de aprendiz, voltado para jovens entre 14 e 24 anos, combina educação e qualificação no trabalho. Os aprendizes são contratados com carteira assinada e direitos trabalhistas garantidos, o que os afasta da exploração do trabalho infantil. Os programas combinam a formação teórica com a prática nas empresas. Para participar, os alunos devem, por lei, continuar estudando ou já ter concluído o ensino médio. De acordo com a Lei da Aprendizagem, as empresas de médio e grande porte precisam contratar um número de aprendizes equivalente a um porcentual entre 5% e 15% de seu quadro de funcionários.

A Fundação Roberto Marinho, em parceria com o Centro de Integração Empresa-Escola e a Gerar, implementa o programa Aprendiz Legal. A iniciativa promove a formação dos aprendizes e auxilia as empresas a cumprir as contratações determinadas pela lei. Em todo o país, mais de 16 mil empresas participam do programa, que já formou mais de 130 mil jovens.

Jefferson Moura dos Santos, de 20 anos, é um desses jovens que fazem parte da iniciativa. Foi aí que o mundo do trabalho, enfim, abriu-se para o carioca: aprovado em uma entrevista, Jefferson virou um Aprendiz Legal numa empresa multinacional do setor alimentício, onde passou por novo teste.

Hoje, Jefferson comemora os dez meses de carteira assinada como auxiliar de estoquista e a possibilidade de seguir estudando. A certeza de que o futuro reserva boas expectativas vem de bem perto: “Tenho vários amigos aprendizes que foram efetivados. É uma mudança constante, um aprendizado novo a cada dia em sala de aula, quando participamos das formações, e na empresa”.

Filho de empregada doméstica e de pintor de paredes, Jefferson cursa o 2º período de marketing e propaganda, e se prepara para conquistar o primeiro diploma da família. “Minha nota no Enem me permitiu uma bolsa de 60%. Mas só consigo pagar o restante graças ao Aprendiz Legal. Não fosse o programa, possivelmente a faculdade estaria ameaçada, eu não conseguiria continuar estudando”, pondera.

Aparecida Lacerda, gerente geral de educação profissional da Fundação Roberto Marinho (Foto: Divulgação)


“A crise econômica ameaça a juventude brasileira porque os estudantes se veem obrigados a abrir mão de sua formação educacional para gerar renda em casa. A Lei da Aprendizagem permite conciliar a oportunidade do primeiro emprego com a qualidade da educação escolar básica”, destaca a gerente-geral de Educação Profissional da Fundação Roberto Marinho, Aparecida Lacerda. “Seria desejável que todos os jovens pudessem se dedicar exclusivamente aos estudos até o fim do ensino médio, pelo menos. Mas a realidade é que muitos precisam colaborar no orçamento familiar. Se abandonarem a escola, no futuro esses jovens terão menos formação e, assim, mais dificuldade de inserção no mundo do trabalho”, conclui.








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