Antônio Gois
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Antônio Gois

Um espaço para debater educação

Informações da coluna

Antônio Gois

Jornalista de educação desde 1996. Autor dos livros 'O Ponto a Que Chegamos'; 'Quatro Décadas de Gestão Educacional no Brasil' e 'Líderes na Escola'.

A educação deve ser a principal aposta da sociedade para reduzir desigualdades num prazo razoável de tempo? Esta é uma das questões analisadas pelo sociólogo Marcelo Medeiros num capítulo de seu recém-lançado livro “Os Ricos e os Pobres”. A pergunta é meramente retórica, pois o autor apresenta argumentos convincentes para, contrariando algum senso comum, responder que não. Ela é necessária, mas insuficiente, e seria um erro, segundo Medeiros, esperar das políticas educacionais mais do que elas podem fazer.

O principal embasamento para esse argumento vem de estudos – alguns já citados aqui na coluna – em que Medeiros e coautores estimam qual seria o impacto na desigualdade de renda caso o Brasil tivesse universalizado no passado o ensino fundamental ou médio. Por exemplo, se todos os trabalhadores tivessem, no mínimo, o médio completo, 93% da desigualdade na renda do trabalho permaneceria como estava em 2010. “Uma queda de 7% na desigualdade é muito bem-vinda, mas a magnitude do esforço para alcançá-la não deve ser desconsiderada: exigiria um sistema educacional melhor que o atual já funcionando há meio século, isto é, desde uma época em que o Brasil não conseguia sequer enfrentar o analfabetismo”, diz o autor.

Isso não significa que o impacto da educação seja desprezível no mercado de trabalho. Do ponto de vista individual, ela ainda faz muita diferença em termos de renda e empregabilidade. Só que o retorno mais significativo acontece entre aqueles que conseguem completar o superior, especialmente em áreas de maior valorização salarial. A principal explicação aqui é simples: como o diploma universitário é ainda muito restrito no Brasil, quem o possui conquista uma grande vantagem – uma das maiores do mundo, de acordo com a OCDE –em relação a maioria de trabalhadores que parou no fundamental ou no médio.

Voltando ao argumento do livro, Medeiros mostra que reduções maiores na desigualdade (como uma queda próxima de 20%, por exemplo) só seriam alcançadas, em cenários otimistas, com uma expansão vigorosa do acesso a cursos superiores mais elitizados, algo bastante difícil de ser executado no curto prazo no contexto brasileiro.

Essas conclusões, como o autor reiteradamente repete nos capítulos em que trata da educação, não deve ser entendida como uma justificativa para diminuir sua relevância ou a necessidade de seguirmos buscando garantir o direito a uma educação básica de qualidade para todos. É fundamental recordar que há uma literatura acadêmica bem consistente a mostrar que mais anos de estudo, mesmo no contexto brasileiro, impactam positivamente em indicadores de saúde, redução de criminalidade, salários, empregabilidade, além de ser um dos fatores cruciais para o desenvolvimento econômico e social. Educação é também fundamental para o exercício da cidadania, sendo reconhecidamente um direito que potencializa o acesso a outros direitos.

Há, portanto, vários motivos para democratizar o ensino. Trabalhar com expectativas mais realistas no que diz respeito ao impacto na pobreza e desigualdade, no entanto, é importante, pois algumas vezes o discurso em favor da educação busca transferir para essa área toda a responsabilidade na correção de injustiças no mercado de trabalho, tributárias, ou mesmo no acesso a políticas públicas.

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