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Educação 360: Tecnologia é aliada do aprendizado

Ferramenta indispensável ao ensino também pode dispersar alunos
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Educação 360 Jovem Tech lotou o auditório do Museu do Amanhã Foto: eduardo uzal / Eduardo Uzal
Educação 360 Jovem Tech lotou o auditório do Museu do Amanhã Foto: eduardo uzal / Eduardo Uzal

A tecnologia será, cada vez mais, um recurso fundamental no processo de ensino e aprendizado, mas ainda há muitas dúvidas sobre como usar as ferramentas da informática nas escolas. Ao mesmo tempo em que a inovação é capaz de mostrar estatisticamente onde os alunos mais acertam e mais erram, em uma determinada disciplina, ou entusiasmar os estudantes com a construção de um robô, o acesso fácil à internet pode dispersar os estudantes e até colocá-los em contato com a deep web , área proibida e perigosa do mundo virtual.

A utilização das diferentes tecnologias no ensino médio foi o tema do Educação 360 Jovem Tech, que lotou o auditório do Museu do Amanhã com a presença de mais de cem alunos de diversas partes do país, além de professores e especialistas. O encontro teve mediação do jornalista Antônio Gois, colunista de educação do GLOBO.

– A tecnologia pode se tornar um ponto de luz ou de ameaça, dependendo da forma como é encarada. Acabei de voltar de um congresso em Paris sobre inteligência artificial e educação e ainda há muitas dúvidas sobre como aliar esses dois aspectos – afirmou Lucia Dellagnelo, diretora do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (Cieb), que participou da primeira mesa de debates, “Tecnologia no ensino médio”.

Lucia lembrou que, entre as dez competências fixadas na Base Nacional Comum Curricular (BNCC) para nortear o trabalho das escolas e dos professores, está “compreender, utilizar e criar tecnologias digitais de informação e comunicação de forma crítica, significativa, reflexiva e ética”.

Na abertura do encontro, Todd Ensign, professor da Fairmont State University e diretor de um centro de desenvolvimento de softwares da Nasa, contou como a organização de competições de robótica mobilizou e estimulou jovens estudantes de West Virginia (EUA), onde mora.

– Começamos há oito  anos com um torneio com 55 times e hoje temos mais de cem. Na robótica, os alunos focam na solução de problemas reais do mundo. Eles ganham muita autoconfiança quando desenvolvem essas habilidades e percebem que elas vão além da escola e chegam à vida de cada um.

Protagonistas desta edição do Educação 360, alunos do ensino médio participaram de todas as mesas de discussão e, na plateia, puderam fazer comentários e perguntas diretas aos especialistas. Aluna do Colégio pH, Mariana Meireles destacou que a tecnologia permite mais independência dos alunos, fazendo com que “o professor deixe de ser como uma babá”. Giovanni Hora, também do pH, lembrou como as aulas com PowerPoint reduziram o uso de giz e quadro-negro nas salas de aula, e defendeu a realização de provas em meios digitais, para diminuir o uso de papel.

O engenheiro filipino Lee Magpili, que trabalha na divisão educacional da Lego, na Dinamarca, chamou atenção para a necessidade de o aprendizado ir além da solução de problemas. Lee foi perguntado sobre como estimular os jovens a aproveitar o lado positivo da tecnologia, em detrimento dos aspectos sombrios da web.

– É muito importante construir a confiança das crianças e dos jovens. Isso envolve mostrar que é perigoso usar a tecnologia de forma negativa e incentivar a usar de forma positiva. É fundamental estimular que as crianças e jovens sejam transparentes. Também é essencial validar o pensamento crítico. É fácil ver como se faz um robô no YouTube. Mas temos que destacar o processo em vez da resposta final – afirmou  Lee.

ENSINO TÉCNICO PROFISSIONALIZANTE

A penas 16,8% dos jovens que concluem o ensino médio chegam à universidade. Oito por cento optam por cursos técnicos. “O que oferecer para esses 75,2% restantes?”, questionou Ana Inoue, assessora de educação do Itaú BBA na segunda mesa de debates, “Formação para o trabalho”. Para a psicóloga, um dos pontos positivos da reforma do ensino médio proposta pelo governo federal é a possibilidade de o aluno cursar, ao mesmo tempo, o ensino profissionalizante.

– O aluno passou a ter direito à escolha, e uma das opções é o ensino técnico “dentro” do ensino regular. Estamos apegados a uma ideia rançosa, que vem do início do século passado, de que o ensino técnico é para pobres e desvalidos. O ensino técnico é emancipatório, é a oportunidade de contextualizar a aprendizagem, é o primeiro estágio do mundo do trabalho – defendeu Ana.

Ela lembrou que o ensino médio é a última política pública universal no Brasil, ou seja, destinada a todos os estudantes. No entanto, 40% dos jovens de 15 a 19 anos estão fora da escola. Diretor de Educação e Tecnologia da Confederação Nacional da Indústria (CNI) e diretor-superintendente do SESI, o economista Rafael Lucchesi criticou a supervalorização da universidade como caminho para melhor inserção no mercado de trabalho e classificou o Brasil como “país de bacharéis e academicista”.

– A capacidade de processamento de informação vai multiplicar por dez nos próximos anos. O futuro das profissões está nas ocupações de base cognitiva, analítica e interativa. É um erro achar que o futuro está só na universidade. Existem profissões técnicas, como nas áreas de mineração e mecatrônica, que estão entre as mais requisitadas no mercado de trabalho. É uma mentalidade atrasada pensar que educação superior é para rico e educação profissional é para pobre – afirmou Lucchesi.

Vários alunos chamaram atenção para as carências do ensino fundamental, especialmente nas escolas públicas, o que faz com que os jovens cheguem ao ensino médio muitas vezes despreparados, desestimulados e sem conseguir tomar uma decisão sobre que rumo profissional pretendem seguir. Testes de avaliação da educação básica realizados com alunos no fim do ensino médio mostram que 72,8% não dominam o esperado em Língua Portuguesa, e 92,7% não sabem o suficiente em Matemática.

– Se o aluno não tem base adequada, como vai ter incentivo? Parece que esquecem que a gente começa lá na creche, no jardim de infância. Querem falar em um modelo de Primeiro Mundo, quando no Brasil ainda não estamos cuidando bem da raiz, da base – criticou o cearense Cauan Menezes, aluno do ensino médio em Fortaleza.

Ana Inoue comparou a situação do ensino médio no país a um paciente na UTI:

– Não dá para falar “tome um chazinho, se acalme, faça exercícios, se alimente bem”. As decisões na UTI são dramáticas. A reforma do ensino médio pode dar errado, mas também pode dar certo e melhorar a vida dos jovens. Aumentar a carga horária é bom, trazer o ensino técnico pode ser muito bom também.  Quando falo de ensino técnico, não é apertar parafuso e bater prego. Ninguém imagina o ensino técnico desprovido da capacidade de resolver problemas.

CURRÍCULO COMUM X CURRÍCULO FLEXÍVEL

Uma das principais mudanças da reforma do ensino médio é a combinação de um currículo comum, com menos disciplinas, para todas as escolas e outro f lexível, em que os alunos poderão escolher itinerários específicos. Na mesa de discussão “Itinerários formativos do novo ensino médio”, professores, especialistas e estudantes mostraram preocupação com a maneira como a teoria vai se tornar prática.

– Quando pensamos em reformular o ensino médio, fomos olhar os modelos do mundo. Só no Brasil temos 13 disciplinas obrigatórias e uma carga horária de apenas quatro horas por dia. Os itinerários formativos abrem novas possibilidades, inclusive para a educação profissional. Meu receio é com a implementação. Os itinerários não são para subtrair conhecimento, mas para aprofundar. É preciso garantir que os itinerários tenham aprofundamento, sem retirar o direito de aprendizagem de nenhum jovem – afirmou Priscila Cruz, presidente executiva do movimento Todos pela Educação.

Diretora do Instituto Inspirare, Anna Penido fez uma apresentação das principais mudanças da reforma do ensino médio, que pretende aproximar a escola da realidade dos jovens e reduzir a evasão escolar. Anna mostrou que 28% dos alunos do ensino médio abandonam a escola no primeiro ano e apenas 64% concluem o curso com idade até 19 anos. Um dos itens da reforma é colocar o “estudante no centro da aprendizagem” com foco em “desenvolvimento e formação para a vida no século XXI”.

– O papel aceita tudo. A questão é: como vai se tornar realidade? O abandono da escola está ligado a fatores externos, como violência, acessibilidade, e também internos, como déficit de aprendizagem, dúvidas sobre o significado do estudo na própria vida, bullying. Se a gente oferecer ao jovem algo de qualidade, isso pode ser revertido – disse Anna.

O aumento da carga horária escolar prevê passar das atuais 800 horas/ano para 1.000 horas/ano até 2022 e chegar a 1.400 horas/ano, sem prazo definido. Os itinerários formativos propostos são Linguagens e suas Tecnologias; Matemática e suas Tecnologias; Ciências da Natureza e suas Tecnologias; Ciências Humanas e Socia is Aplicadas, e Formação Técnica e Profissional.

A mesa-redonda gerou uma discussão acalorada. Muitos alunos questionaram como as mudanças serão implementadas, em uma realidade tão desigual entre escolas públicas e particulares e entre aquelas das regiões centrais e das periferias e comunidades.

– Toda escola vai oferecer  todos os itinerários? Vai ser igual para a elite e para a periferia? A carga horária vai aumentar, mas muitos alunos das escolas públicas trabalham. Como vai ser? Outra coisa é o ensino técnico. É importante, mas não quero parar ali, quero ir para a universidade – afirmou Carolina Rosa, aluna da Fundação Roberto Marinho da comunidade da Maré, Zona Norte do Rio.

Priscila Cruz defendeu que o curso técnico gere créditos que possam ser usados pelos alunos que ingressarem na universidade, evitando que comecem o curso superior do zero, quando já têm conhecimento específico vindo da educação profissional.

ADAPTAÇÃO DOS PROFESSORES

Jovens digitais, adultos analógicos. Como os professores vão se adaptar ao avanço das tecnologias nas salas de aula e a alunos que cresceram em meio a celulares, internet e redes sociais? O tema foi discutido na quarta e última mesa do Educação 360, “O professor do ensino médio”.

– Os meios digitais fazem a gente ficar muito narcisista, a gente mergulha na piscina que é a gente mesmo. O professor tem que romper essa piscina, trazer novas possibilidades. Existem novas tecnologias, mas ainda não há uma gramática para essas tecnologias. O novo professor precisa desenvolver essa linguagem com os jovens, se aproximar deles – afirmou o diretor do Instituto Singularidades, Miguel Thompson.

Para Thompson, uma das novidades da reforma é um ensino médio não linear, em que serão fundamentais o que o professor chamou de “6 Cs”: comunicação, conexão, conhecimento, criatividade, cooperação e crítica.

Aluna da Fundação Roberto Marinho na favela da Maré, Suelem de Castro, uma das participantes da mesa, destacou a importância de os professores se aproximarem dos alunos, mesmo com o crescente uso das tecnologias para o ensino e o aprendizado.

– A gente quer o professor identifica cada tipo de aluno. Espero que a mudança no ensino médio não nos afaste do professor e traga só tecnologia – afirmou. Valesca Gonçalves, aluna do SESI no Amazonas, contou que a reforma já chegou à sua escola e que um dos pontos mais relevantes é o aprendizado prático, aliado à teoria.

– Queremos aprender na prática, como acontece na robótica. Aprender Matemática é uma guerra, mas você pode ter novas fórmulas, paródias. Falar para o aluno “você consegue” também é um grande estímulo.

Aluno do ensino médio em Curitiba, Guilherme Marcondes falou da experiência de ter aulas usando um aplicativo com um laboratório em 3D, apresentado por um professor. Mas também cobrou melhorias no ensino fundamental, para que os estudantes cheguem mais bem preparados à última etapa da educação básica.

– Tecnologia não é problema nem solução. O que falta é boa base. Se não, como o professor do ensino médio vai ensinar, por melhor que ele seja?

Professor de Linguagens no Colégio pH, Jessé Castilho contou como teve que se adaptar às demandas dos alunos quando saiu da posição de aluno universitário para educador.

– Tecnologia não é apenas tirar a aula do quadro-negro e botar no PowerPoint. É preciso fazer do aluno um protagonista. Os alunos reclamavam que minha aula era lenta. Comecei a estudar metodologias ativas, acredito na metodologia que traz criatividade, que não estigmatiza os erros dos alunos nem os próprios erros, que cria circunstâncias favoráveis, que conhece a história de cada aluno e que não abandona a afetividade – defendeu o professor.

Na plateia, muitos estudantes mencionaram as dificuldades do professor no Brasil, especialmente o da rede pública, e defenderam que as escolas capacitem os educadores a lidar com as novas mídias.

– A gente sabe da situação frágil que o professor vive no Brasil. Por mais que seja difícil, a gente tem que colocar a mão na massa. O interesse do professor é importantíssimo – concluiu Jessé.