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Educação 360 Jovem: como lidar com um modelo ultrapassado de ensino

Em bate-papo com os estudantes, o escritor Marcelo Rubens Paiva relembra seus tempos na faculdade
O bate-papo com o escritor Marcelo Rubens Paiva, no Museu do Amanhã Foto: Marcelo de Jesus / Agência O Globo
O bate-papo com o escritor Marcelo Rubens Paiva, no Museu do Amanhã Foto: Marcelo de Jesus / Agência O Globo

RIO — Em uma sociedade com um fluxo de conhecimento ilimitado, a maneira como o conteúdo é passado aos jovens faz toda a diferença. No entanto, como adequar o modelo ultrapassado de ensino à demanda por uma formação mais ampla? O questionamento pontuou o bate-papo com o escritor Marcelo Rubens Paiva, durante o Educação 360 Jovem , nesta segunda-feira, no Museu do Amanhã.

O evento é uma realização O GLOBO e Extra, com patrocínio master de Sesi, patrocínio de Fundação Telefônica e colégio pH, e apoio de TV Globo, Futura, Unesco, Unicef, Instituto Inspirare, Uber e Companhia das Letras.

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Estudantes querem ser livres dentro da escola

Daniel Lipkin, de 14 anos, sentou-se na primeira fileira da conversa e também foi o primeiro a pedir a palavra. Estudante do primeiro ano do ensino médio do Colégio Estadual Infante Dom Henrique, em Copacabana, ele não foi à aula, com aval dos pais, porque queria participar das discussões sobre o sistema educacional.

— Estou matando aula para estar aqui. Considerando todas modificações que estão sendo debatidas e que os alunos estão sugerindo (como um ensino médio mais próximo do cotidiano) , o que deveria ser feito com as avaliações? — questionou. — Acho que avaliação é algo que afeta o aluno no aspecto psicológico. Quando ele está aprendendo, é bom absorver a informação e não apressá-lo, porque assim ele vai acabar esquecendo. A escola não abrange a informação, não trabalha onde posso usar isso, por que isso existe. A escola diz apenas: aprenda isso, regurgite isso, o que tira a razão da educação.

A partir da pergunta de Daniel, o escritor Marcelo Rubens Paiva criticou o peso dado às avaliações no modelo atual. Para ele, os estudantes devem estar no centro do processo.

— Você matou aula e foi uma escolha maravilhosa, veio a este museu maravilhoso, conheceu pessoas incríveis. Temos que confiar em vocês, nessa geração mais jovem, que tem nas redes sociais um campo enorme. É tão mais fácil ter contato com a informação. A dificuldade é como ter instrumento para isso e como aprender a aprender. Como saber o que ler, com quem conversar. Mas avaliação? A vida vai te avaliar.

Marcelo Rubens Paiva: 'Eu me arrependo de ter pedido para abolirem certas disciplinas'

Paiva ressaltou, no entanto, que, embora muitos conteúdos pareçam chatos, é importante em determinado momento aprendê-los. Na maioria das vezes, o que muda a percepção dos estudantes sobre esse conteúdo é a maneira como ele é ensinado. O escritor citou uma greve da qual participou quando era aluno da graduação da USP e na qual os estudantes aboliram o currículo — com disciplinas como antropologia, semiótica, entre outras — para a realização de projetos como filmes, livros, porque achavam que fazia mais sentido.

— Hoje eu me arrependo tanto disso, porque nunca mais tive oportunidade de parar um ano ou dois da vida para estudar sociologia, antropologia, filosofia. Muitas vezes, ouvir apenas os jovens é um paradoxo, porque eles querem deixar de estudar as coisas "chatas", mas essas coisas são maravilhosas de serem estudadas. Só que a forma como se dava antropologia, sociologia, semiótica na minha universidade era tão chata e tão mal feita que tivemos que fazer essa revolta. A minha sugestão é que os educadores ensinem aquilo que é chato, mas de uma forma legal. Temos que ensinar literatura, mas fazer com que as pessoas não encarem o livro como obrigação, e sim como uma descoberta, como resolver seus próprios problemas, como entender sua família — afirmou.

A importância dos espaços de cooperação

Professora de educação física, Mariana Lopes, que estava na plateia, falou sobre a importância de criar espaços de cooperação para transformar a escola e buscar soluções conjuntas para os problemas que aparecem no cotidiano.

— A gente passa por um sistema de educação que ensina mais a competir com os outros do que olhar quem é o aluno. É preciso um processo de desconstrução disso, para reaprendermos a "fazer com". Fazemos política pública, mas não chamamos as pessoas para opinarem, os jovens para construir junto, dentro das nossas diferenças, respeitando a diversidade.

Nesse sentido, Paiva lembrou a importância das mobilizações sociais das minorias e defendeu que essa prática comece na escola:

— Nos bastidores, um garoto estava falando sobre questão de gênero, ele queria discutir o preconceito que sofre nas escolas. Contou que era aluno de uma escola privada e sofria preconceito, foi para escola pública e lá havia um grupo de estudantes que debatia questões de gênero e ocupava a escola toda sexta- feira à tarde para uma troca de ideias. Tudo passa pela política. Temos que ensinar o jovem de 14, 15 ou 16 anos a fazer política.