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Pasta da ignorância

Declarações preconceituosas do ministro são só parte dos danos com aparelhamento

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O ministro da Educação, Milton Ribeiro - Pedro Ladeira/Folhapress

Já denunciado pela Procuradoria-Geral da República por homofobia, o ministro da Educação, Milton Ribeiro, reincidiu em declarações preconceituosas —e, sobretudo, reveladoras de que a pasta está mais a serviço de uma agenda ideológica do que empenhada em buscar diagnósticos e formular políticas para o setor.

Em um evento sobre merenda escolar, Ribeiro preferiu ganhar destaque com paranoia militante. "Não vamos permitir que a educação brasileira vá por um caminho de tentar ensinar coisa errada às crianças", disse. "Não tem esse negócio de ensinar ‘você nasceu homem, pode ser mulher’."

Trata-se, mais uma vez, da ofensiva contra uma suposta "ideologia de gênero", que mobiliza em especial o bolsonarismo de vertente religiosa —o ministro é pastor.

Entre tantas mazelas conhecidas na educação brasileira, ataca-se um fantasma. Do MEC não se conhecem estudos que justifiquem tamanha preocupação com a abordagem precoce ou indevida de questões de gênero e sexo nas escolas. Intencionalmente ou não, semeia-se um temor obscurantista em torno do mero ensino do tema.

Na academia, o entendimento predominante é que esse aprendizado não induz ao sexo precoce e muito menos promove apologia da homossexualidade. Colabora, isso sim, para o combate à gravidez na adolescência, ao abuso infantil e à transmissão de doenças, pautas de relevância no país.

De acordo com dados oficiais, quase meio milhão de nascidos vivos no Brasil em 2019 eram descendentes de adolescentes e jovens de até 20 anos. Em cerca de 20 mil casos, registrou-se a idade materna de 14 anos ou menos.

A Unesco tem proposta de educação sexual estruturada em níveis etários. Dos 5 aos 8, por exemplo, um conceito-chave a ser apresentado é que pessoas adultas não devem tocar as partes íntimas do corpo de crianças, a não ser para cuidados de higiene e saúde.

No Brasil, a disciplina é considerada tema transversal no ensino desde a definição dos chamados parâmetros curriculares nacionais há 25 anos. Ficou de fora, no entanto, da Base Nacional Comum Curricular (BNCC), aprovada em 2017, que traz os objetivos de aprendizagem de cada ano escolar nas redes de ensino.

Acabou incluída apenas no ensino de ciências ao final do período fundamental, como parte do aprendizado sobre vida e evolução.

Não há chance de um debate bem informado a respeito no atual governo —e os danos provocados pelo aparelhamento ideológico do MEC, infelizmente, nem de longe se limitam à educação sexual.

editoriais@grupofolha.com.br

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