Por Maiara Barbosa, G1 Mogi das Cruzes e Suzano


As mães de alunos da Escola Estadual Sylvia Mafra Machado, em Mogi das Cruzes, estão preocupados com a onda de violência entre os estudantes. Segundo elas, ao menos sete alunos já saíram da escola com medo de novas agressões. Os pais relatam que o tipo de agressão mais comum é o corredor polonês, em que alunos se posicionam lado a lado e dão chutes, tapas e socos em quem é obrigado a passar pelo corredor. Uma mãe procurou a polícia e registrou boletim de ocorrência.

A Secretaria Estadual de Saúde informou que "os alunos envolvidos foram suspensos, medidas educativas e restaurativas foram trabalhadas com eles – através da mediação de conflitos – e os pais/responsáveis foram acionados". Ainda de acordo com a secretaria, "é preciso entender o trabalho das escolas é focado em educar e socializar".

Vanessa Rocha Krause é uma das mães que preferiu transferir a sua filha de 13 anos da escola, que fica no Alto do Ipiranga. Ela diz que estava cansada das agressões e não via providências sendo tomadas. Segundo ela são três alunos que estavam à frente das agressões, duas meninas e um menino, todos com idade entre 17 e 18 anos.

Ela conta que, em uma das agressões, sua filha teve uma mecha de cabelo arrancada. “Ela ficou com marcas dos socos nas costas. Puxaram ela tão forte pelo cabelo que ela perdeu uma mecha e ainda pegaram a touca dela e pintaram de canetinha.”

De acordo com o supervisor de ensino Marcelo Fialho, responsável pela mediação de conflitos na Diretoria de Ensino de Mogi das Cruzes, o caso é grave, mas a situação está sendo monitorada. "Infelizmente, situações como essa, nós encontramos dentro de escolas, praças, hospitais e todos os ambientes de convivência. Isso não quer dizer que vamos passar a mão na cabeça. Isso exige um olhar especial. O caso foi grave, mas temos uma professora mediadora na unidade que atua há cinco anos lá e todas as medidas foram tomadas" (leia mais sobre o trabalho dos professores mediadores abaixo).

Sobre as transferências, Fialho diz que a escola oferece segurança, mas os pais de alunos se sentem inseguros e que, de acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), a escola não pode proibir o direito de ir e vir, impedindo a transferência dos alunos.

A mãe ainda disse que soube de outros episódios de agressão e que a escolha de quem ia ser agredido acontecia de maneira aleatória. “Um menino foi jogado dentro do cesto do lixo. Ele ficou tão assustado, tão traumatizado, que eu soube que os pais dele estão se mudando de cidade. Uma amiguinha da minha filha também foi puxada, mas ela tem problema no coração e começou a chorar, aí liberaram. Na escola tem duas irmãs gêmeas, uma menina que está grávida também deixaram ela passar, mas a irmã dela foi linchada”, conta.

A mãe disse que a brincadeira de mau gosto aconteceu mais de uma vez e, quando a sua filha ficou com hematomas por conta dos socos, resolveu procurar a direção da escola. Segundo ela, a diretora da unidade chegou a dar suspensão de cinco dias para os envolvidos, mas não resolveu. “Primeiro ela [diretora] disse que era só uma brincadeira. Durante a suspensão, uma das meninas que bateu na minha filha ficou indo todo dia na porta da escola para ver se ela estava lá e ficava fazendo ameaças.”

Trauma

Depois das ameaças, a filha de Vanessa parou de ir para a escola, enquanto a mãe buscava uma solução. Ela voltou a conversar com a diretora, mas ela teria dito que não poderia se responsabilizar pelo o que acontecia do lado de fora da escola. Por isso, a menina passou a estudar em outra unidade de ensino. Apesar de já estar estudando em outra escola, por conta do trauma, a filha de Vanessa está fazendo acompanhamento psicológico e tem receio de ir para as aulas.

É uma bela de uma covardia isso. Onde já se viu ter que tirar o seu filho da escola, mudar toda a rotina e as amizades, sendo que os agressores continuam dentro da escola fazendo novas vítimas?

Quem também foi vítima das agressões é a filha de 12 anos de Denise da Costa. A mãe afirma que a filha ficou com manchas roxas pelo corpo depois de ter sido obrigada a passar pelo corredor. “Será que a escola está esquecida? Não tem autoridade? Suspensão não resolve para os envolvidos.”

Denise acredita que os agressores escolhiam os alunos com boas notas por se sentirem invejados. Apesar da burocracia para a transferência, ela acredita que acabou tomando uma decisão que trará benefícios para sua filha. “A escola não me oferecia segurança, como eu ia deixar a minha filha lá? Como diz aquele ditado ‘há males que vêm para o bem’. Por isso eu acho que agora, na outra escola, minha filha está se adaptando bem, está recuperando o conteúdo atrasado e já tirou boas notas nas provas. Por outro lado, eu fico revoltada em saber que outras crianças que estão lá ainda serão vítimas dos maus-tratos desses alunos.”

Mediação

De acordo com o supervisor de ensino, Marcelo Fialho, em casos de conflitos, a primeira medida a ser tomada é a conversa entre os alunos, ainda na sala de aula, por meio do professor. Caso o problema continue, ou aconteçam agressões físicas, entram em ação o diretor da unidade e também o professor mediador.

De acordo com Fialho, todas as escolas estaduais de Mogi das Cruzes, Biritiba Mirim e Salesópolis contam com um professor mediador, que cumpre a carga horária de trabalho na unidade.

O foco é restaurador e não punitivo. A punição é feita em último caso, quando já se esgotaram todas as possibilidades. A gente acredita que o ideal é a construção de valores e isso, assim como a mudança de hábitos, não é do dia para a noite. Na maior parte dos casos, as agressões não voltam a acontecer porque é feito um acompanhamento.

De acordo com Fialho, sobre os casos de agressão que aconteceram na Escola Estadual Sylvia Mafra Machado, a transferência dos agressores não aconteceu, uma vez que a diretora da unidade tem conhecimento de toda vida escolar dos alunos e é preciso assegurar uma vaga aos estudantes. "Qual é a segurança que ele não vai fazer a mesma coisa [agressão] na outra escola que ele for estudar? Uma vez que a escola, que o diretor e os professores, já conhecem o problema e a família, é mais fácil abraçar a causa e tentar restaurar. Muitas vezes, a própria família precisa de orientação", argumenta.

Toda a análise feita do perfil dos alunos e quais ações serão tomadas seguem o regimento interno de cada escola. Dependendo do caso, o Conselho de Escola (formado por pais, professores, alunos e funcionários) é acionado e orienta a direção na escolha. Nos casos mais graves, até mesmo o Conselho Tutelar pode ser acionado para acompanhar o aluno agressor e sua família.

Casos de Polícia

No mês de maio de 2017, as agressões registradas na polícia, entre alunos nas escolas estaduais de Mogi das Cruzes, aumentaram 133%, na comparação com o mesmo período do ano passado. De acordo com o levantamento dos boletins de ocorrência registrados nas delegacias de Mogi, em 2016 foram 3 ocorrências e, neste ano, o número aumentou para 7.

Os dados fornecidos pela Delegacia Seccional levam em conta as ocorrências registradas como lesão corporal envolvendo alunos em escolas no 1°, 2°, 3° e 4° Distrito Policial. O levantamento não leva em conta as ocorrências registradas na Delegacia da Mulher.

Desmaio

Em Suzano, um caso de agressão fora da escola, que começou por causa de uma briga ainda dentro da unidade, deixou uma adolescente de 13 anos desmaiada, no Jardim São José. A agressão aconteceu no último dia 25 e começou, segundo a família, por causa de uma fofoca entre duas meninas da Escola Estadual Professor José Benedito Leite Bartholomei. As desavenças ultrapassaram as barreiras da escola quando uma das alunas reuniu a própria família para agredir a adolescente de 13 anos.

De acordo com o boletim de ocorrência registrado pela família, a vítima viu que a agressora tinha levado seu cunhado, suas irmãs e uma amiga para participarem da agressão, no dia 24 de maio.

A menina, que prefere não ser identificada, disse que se lembra de parte do que aconteceu. “Eu estava subindo o morro para ir embora e uma amiga me avisou que a família dela [agressora] estava vindo atrás. Primeiro o cunhado dela perguntou o porquê eu tinha batido nela, depois ela colocou o dedo na minha cara e eu fui tirar o dedo dele do meu rosto. Foi ai que me puxaram pelo cabelo, eu cai e bati a cabeça. Eu apaguei, quando eu acordei, já estavam me chutando e eu não vi mais nada. Depois quando eu já estava me levantando do desmaio, vieram e me bateram de novo.”

A menina explica que, antes da agressão, no dia 22, ela teve uma discussão verbal com a menina que estuda na mesma escola. O pai da menina conta que a agressão só cessou por conta de um rapaz que passava pela Rua Irlanda e interferiu na briga.

O namorado da jovem, que a acompanhava no momento que ela foi abordada, sozinho, não conseguiu ajudar. “Foi por Deus. Enquanto muita gente ficou apenas olhando e gravando no celular, ele foi ajudar. Ele livrou a minha filha da morte. Onde já se viu, ela caída no chão e ainda continuaram batendo nela", contou o pai.

A menina disse que, até então, não conversava com a agressora e seus pais mudaram a adolescente de escola, com medo do que poderia acontecer. As investigações do crime de lesão corporal estão sendo feitas pela delegada Silmara Marcelino, da Delegacia da Mulher.

A Secretaria Estadual de Educação informou que "todas as 5 mil escolas do Estado têm mediação, realizada por professores e vice-diretores com capacitação técnica para atuar em situações de conflitos. Em ambos os casos apresentados pela reportagem, de Mogi das Cruzes e Suzano, os alunos envolvidos foram suspensos, medidas educativas e restaurativas foram trabalhadas com eles – através da mediação de conflitos – e os pais/responsáveis foram acionados. Aliás, os responsáveis sempre são chamados e, dependendo do caso, o Conselho Tutelar e o Conselho de Escola, formado por professores, pais, alunos, funcionários e comunidade, também são convocados. É o Conselho de Escola que decide sobre transferência de alunos e outras punições, por exemplo. É preciso entender o trabalho das escolas é focado em educar e socializar."

A Secretaria da Educação do Estado de São Paulo entende que o enfrentamento à violência em suas unidades de ensino deve ocorrer em diversas frentes, que englobam também comunidade escolar, famílias e a polícia. Para isso, desenvolve desde 2009 em todas as 5 mil escolas o Sistema de Proteção Escolar, programa que orienta as equipes gestoras e apoia professores e alunos envolvidos em situações dessa natureza. O Sistema já apresenta resultados positivos: o comparativo de janeiro a maio dos últimos três anos mostra queda de 15% no número de casos de ocorrência registrados pelo ROE – Registro de Ocorrência Escolar.

O programa Escola da Família, que abre a porta das escolas estaduais aos finais de semana para a comunidade, trabalha para combater situações de vulnerabilidade, justamente porque a Pasta acredita que a participação da sociedade e dos pais e responsáveis é peça-chave para que se evite problemas dentro dos muros das escolas."

A secretaria completou que é parceira em campanha contra bullying e que os professores têm acesso a apostilas online para o desenvolvimento de atividades e discussões sobre o tema. Além disso, todas as escolas estaduais têm parceria com a Ronda Escolar, da Polícia Militar, para cuidar do entorno da unidade.

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