Por Samantha Silva, g1 Piracicaba e Região


Professora Alessandra Grechi com alunos da Escola Estadual Honorato Faustino em Piracicaba — Foto: Alessandra Grechi/Arquivo pessoal

Quando a quarentena de pandemia tirou os alunos das salas de aula em 2020, as escolas tiveram que se adaptar para manter o aprendizado dos estudantes, mas não levou muito tempo para que ficasse claro que a mudança não seria fácil. Ao perceber a dificuldade dos alunos em aprender à distância, uma professora de Piracicaba (SP) criou o lema "não deixar nenhum aluno para trás", iniciando uma ação na escola que chegou a entregar atividades nas casas dos estudantes para ajudá-los.

A Escola Estadual Honorato Faustino, em Piracicaba, alcançou a maior nota em São Paulo no Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) 2021 nos anos iniciais, ou seja, do 1º ao 5º ano do ensino fundamental. A instituição tem a pontuação de 8,8 no índice, que leva em conta a porcentagem de alunos aprovados e as notas dos estudantes em uma prova chamada Saeb.

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Após as aulas presenciais serem suspensas, a professora Alessandra Grechi conta que logo perceberam que somente aulas on-line e a busca de materiais na escola não estava sendo suficiente. "Além de todo medo da pandemia e a distância da escola e dos colegas, alguns alunos tinham dificuldades em participar das atividades on-line e até de ir retirar os matérias na escola", conta.

Professora Alessandra Grechi durante aulas online em Piracicaba — Foto: Alessandra Grechi/Arquivo pessoal

Para contornar a distância dos alunos, Alessandra iniciou junto com os outros professores uma busca ativa para entender a necessidade dos estudantes e ajudá-los da melhor forma. "Fazíamos constantes contatos individuais através de vídeo-chamadas com esses alunos para que não se sentissem excluídos e desmotivados, muitas vezes só para conversar e outras para ajudá-los a avançar no conteúdo", conta.

Em alguns momentos, chegavam a levar o material na casa dos alunos, porque a família não conseguia ir até a escola retirar. "Nesse período , não deixar nenhum aluno para trás era o nosso lema, professores e gestão escolar unindo forças para que nossos alunos tivessem a aprendizagem garantida."

Desafios de uma rápida adaptação

Para a professora, o maior desafio durante a quarentena foi adaptar as aulas presenciais para uma metodologia online rapidamente. Com 45 anos, 15 deles na educação, Alessandra - assim como todos os professores da escola - nunca tinham educado crianças durante uma pandemia.

"A gente nunca trabalha sozinho, sempre em equipe, e nesse momento de pandemia ainda mais. Então um ajudou o outro sempre, nossas aulas online eram sempre acompanhadas de mais de um professor, porque a questão da tecnologia foi muito difícil pra gente", conta. Da noite para o dia, os professores tiveram que se adaptar a lecionar usando câmeras, microfones, programas e aplicativos que não estavam acostumados.

Reuniões semanais com a gestão da escola também ajudavam os professores a lidar emocionalmente com os desafios do período e preparar o conteúdo das aulas. "Porque os professores precisavam também ser ouvidos, também necessitavam desse atendimento emocional para poder estar passando para os alunos."

"Tive que aprender a controlar minha ansiedade, meus medos, incertezas, pois nunca havia passado por um momento assim e ter que lidar com minhas próprias emoções e expectativas, e ainda as dos meus alunos e seus responsáveis não foi nada fácil", lembra.

Apesar das dificuldades, e com todo o esforço dos professores, a escola conseguiu manter um índice de presença de cerca de 90% dos alunos nas aulas, segundo Alessandra.

"Os alunos, com certeza, foram os maiores motivadores para que a gente continuasse trabalhando. Nas nossas aulas online, ver aquelas carinhas curiosas, querendo aprender, nas mais diferentes situações, porque cada um estava vivendo uma realidade dentro da sua casa. E quando a gente abria a sala pras aulas online, estavam ali 20, 25 carinhas, mais de 80% da sala, sempre dispostos a aprender, sempre querendo saber mais."

Professora Alessandra Grechi durante aulas online em Piracicaba na pandemia — Foto: Alessandra Grechi/Arquivo pessoal

O déficit do presencial

Na volta ao presencial, de início ainda de forma híbrida, as instituições de ensino tiveram que lidar não só com o medo de uma pandemia que ainda não tinha acabado, mas um atraso no ensino planejado antes da quarentena.

"Agora é recuperar aquilo que ficou, porque, por mais que a gente tenha as aulas online, por mais que a gente não tenha deixado nenhum aluno sem estar tentando ensinar, eu acho que foi um período de perdas. E não só perda de conhecimento, mas muitas crianças perderam familiares, muitas emoções sendo trabalhadas ao mesmo tempo", explica Alessandra.

A escola montou uma série de estratégias para conseguir ajudar os alunos na recuperação dos estudos que não puderam acontecer nas salas de aula, que incluem um projeto de recuperação e reforço. "Eles gostam de participar e querem participar do projeto, porque eles sabem que a chave de todo sucesso da nossa escola é trabalhar o aluno individualmente nas suas dificuldades, ou em pequenos grupos, que seja, mas perceber que ele está ali, não é só mais um e é importante pra nossa escola."

O projeto trabalha com os alunos durante todo o ano, e os professores da escola também conversam sempre entre si para trocar ideias que funcionaram nesse processo de aprendizado.

"Eu acho que é importante um olhar individual pra cada criança. O incentivo que ele pode aprender, conhecer as suas habilidades, suas dificuldades e passar isso pra criança. Eu acho que, quando você, professor, passa para a criança que ela é capaz de aprender e pode aprender, eu acho ninguém segura. Eu acho que eles vão atrás e realmente conseguem aprender", finaliza a professora.

Cálculo do Ideb

O Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb) é calculado levando em conta dois fatores: a porcentagem de alunos aprovados (ou seja, que não repetiram de ano) e as notas dos estudantes em uma prova chamada Saeb.

Divulgado em setembro deste ano, os dados de 2021 tiveram pouca variação em relação à edição anterior, de 2019, mas especialistas ouvidos pelo g1 afirmam que isso não significa que não houve perdas na aprendizagem na pandemia ou que as desigualdades regionais não se acentuaram no período.

Considerando os dois fatores em que o índice é calculado, neste ano, os dois “ingredientes” foram comprometidos, porque:

  • Parte das redes de ensino adotou a aprovação automática na pandemia (e terá, portanto, um Ideb artificialmente mais alto).
  • Pela primeira vez, também por causa da Covid-19, a porcentagem de alunos que fizeram a avaliação (Saeb) pode ser muito mais baixa em alguns estados, fornecendo dados estatisticamente pouco confiáveis. Comparações e rankings não serão fiéis à realidade.

À época da divulgação dos dados, Victor Godoy Veiga, ministro da Educação, afirmou que estratégias adotadas pelo governo federal, juntamente aos estados e municípios, pretendem levar a uma educação de qualidade, reparando as perdas de aprendizagem decorrentes da pandemia.

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