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Educação

Cuidados além do aprendizado

Crianças podem não fazer parte do grupo de risco maior em relação ao coronavirus, mas estão entre as populações mais expostas a um dos prováveis efeitos colaterais perversos da pandemia: a violência doméstica. A decisão de interromper aulas presenciais - tomada por quase todos os países do planeta - foi necessária, principalmente para proteger crianças e adultos de um grave risco de contágio pelo Covid-19. O alerta de organizações que militam pelos direitos das crianças é que governos precisam estar atentos e agirem, agora e no retorno às aulas, para amenizarem esses possíveis efeitos colaterais negativos.

Casos de violência doméstica tendem a aumentar não apenas porque crianças passam mais tempo confinadas com os pais, mas, também, porque estão longe dos olhos dos professores. Um estudo que foi divulgado na semana passada pelo prestigioso centro privado NBER (sigla em inglês para Centro Nacional de Estudos Econômicos) mostra como os profissionais da educação são fundamentais para identificar desde cedo esses casos.

Para chegar a essa conclusão, os pesquisadores Maria Fitzpatrick, Cassandra Benson e Samuel Bondurant analisaram 48 milhões de registros de violência contra crianças nos Estados Unidos, entre 2003 e 2015. Dois padrões muito consistentes chamaram a atenção: as denúncias de negligência e maltrato aumentam significativamente no início do ano escolar (em torno de 48% a 64%), sendo os profissionais da escola os principais autores das denúncias, e caem logo após o fim do período letivo (entre 20% e 24%).

A análise principal foi feita a partir de casos registrados com crianças de cinco anos, pois nessa idade foi possível comparar dados daquelas que estavam na escola com aquelas que ainda não estavam. As estimativas feitas pelos autores considerando essas e outras variáveis indicam que a maioria dos casos de maus-tratos não chegaria ao conhecimento das autoridades se a crianças não estivessem matriculadas.

No estudo, os pesquisadores fazem referência a diversos estudos que mostram os impactos negativos – imediatos e futuros – que as crianças sofrem quando são vítimas de maus-tratos. A literatura acadêmica no tema indica também que, quanto antes o problema for detectado, menores serão os prejuízos e maiores as chances de agir para interromper com o ciclo de violência.

Os autores destacam duas recomendações principais para os formuladores de políticas públicas. A primeira é investir de forma mais consistente na formação de professores para detectarem esses casos. A segunda é que os debates sobre o retorno do investimento em educação não podem ficar restritos aos impactos na aprendizagem. “Qualquer discussão sobre medidas de qualidade do professor e da escola, bem como de políticas que prolongam o tempo que as crianças passam no ambiente escolar, precisam incluir estimativas da melhoria do bem-estar infantil resultante da detecção precoce e do relato de casos de maus-tratos”, afirmam os pesquisadores.

Tanto agora quanto na volta às aulas presenciais, a atenção a este problema será tão ou mais importante quanto à preocupação, legítima, com perdas de aprendizagem.

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