Educação
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Por Lucas Altino — Rio

Uma polêmica medida, criticada por especialistas em educação, está crescendo no país: a instalação de tecnologia de reconhecimento facial nas escolas. Segundo relatório da InternetLab, centro independente que pesquisa tecnologia, direitos e políticas públicas, essa ferramenta já foi lançada em pelo menos 15 cidades do Brasil, incluindo capitais como Fortaleza, Goiânia e Rio de Janeiro. Usado sob o argumento de aumento da segurança dos alunos e de combate à evasão escolar, o reconhecimento facial ainda não tem resultados comprovados, dizem pesquisadores, que citam que outras ações seriam mais eficazes e menos custosas para tratar da questão.

Das 15 iniciativas mapeadas pela InternetLab, todas na rede pública, três já estão em pleno funcionamento: em Goiânia (GO), Jaboatão dos Guararapes (PE) e Betim (MG). Já nos demais casos, a medida ainda está em fase de testes ou passando por trâmites jurídicos. Com exceção de Tocantins, onde há uma política estadual que prevê a implementação em todas as cidades, as outras iniciativas foram tomadas a nível municipal, no Rio de Janeiro, Angra dos Reis (RJ), Mata de São João (BA), Fortaleza (CE), Águas Lindas (GO), Morrinhos (GO), Itanhaém (SP), Potirendaba (SP), Santos (SP), Porto Alegre (RS) e Xaxim (SC).

A tecnologia foi lançada pelas secretarias municipais de educação para atender a três finalidades principais, de acordo com o que a InternetLab recebeu de respostas em seu levantamento: "otimização da gestão do ambiente escolar, em que o reconhecimento facial permitiria economizar tempo de aula, administrar as faltas escolares, e para gestão de merendas e material escolar; "combate à evasão escolar, para evitar alterações indevidas no registro de presença, para comunicar o Conselho Tutelar e para gerenciamento de programas sociais, em caso de inassiduidade; e "para fins de segurança, para evitar que estudantes saiam sem a autorização e para salvaguardar o patrimônio escolar", mostra a pesquisa.

Entretanto, a coordenadora da área de Privacidade e Vigilância do InternetLab, Bárbara Simão, afirmou que houve poucas respostas completas das secretarias sobre a real eficácia da tecnologia. E até hoje, diz, não há um caso concreto que embase a necessidade do uso do reconhecimento facial.

— Parece haver uma falta de estudo prévio, de avaliação de impacto no uso da tecnologia na prática. A gente percebeu que existe certa aposta na tecnologia como se ela fosse resolver problemas de natureza estrutural, sem consideração sobre a sua precisão. É uma aposta dos municípios, mesmo que sem respaldo técnico de como ela vai realmente operar, quais seriam seus benefícios, e se não há alternativas melhores — explicou Simão, que afirma que o uso da tecnologia está em viés de alta no país.

Além da falta de respostas técnicas, o uso dessa tecnologia não é devidamente regulamentado no Brasil. Nos últimos anos, alguns projetos de lei sobre o tema foram protocolados, mas nenhum prosperou. Já na Lei Geral de Proteção de Dados, há regras gerais importantes, mas nada específico sobre esse uso em instituições de ensino. Procurado, o Ministério da Educação explicou que não regulamenta a utilização da tecnologia e que as secretarias municipais têm autonomia para tomar essas decisões. O sistema de reconhecimento facial também nunca foi tema de planos nacionais de educação, esclareceu o ministério.

Segundo a pesquisa, apenas o município de Mata de São João (BA) afirmou contar com normas orientativas sobre a adoção da tecnologia, por meio de leis municipais que disciplinam o tratamento de dados pessoais e a segurança da informação municipal.

Na ausência de regulamentação, pesquisadores se preocupam sobre possíveis imprecisões técnicas e de mau uso da tecnologia. A InternetLab identificou , por exemplo, que na rede municipal de Xaxim já houve registros de falta de frequência em dias que alunos na verdade compareceram à escola.

Para Andressa Pella, coordenadora geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação, não há "justificativa plausível" para o uso dessa tecnologia. Ela diz que a evasão escolar se dá por problemas de ordem socioeconômica ou de estrutura escolar, como falta de condições de acesso e permanência dos estudantes.

— O problema demanda investimentos em políticas de proteção social, combate à fome, e em políticas educacionais, garantindo os direitos desses estudantes. Se as escolas tiverem investimentos em infraestrutura e em seu corpo de profissionais, elas conseguem junto aos familiares e órgãos de assistência social, identificar e fazer a busca ativa de estudantes fora da escola — disse Pellanda. — udo isso é muito mais simples, muito mais pedagógico, mais eficiente e barato do que instalar tecnologia de reconhecimento facial. Por que se resolve gastar recurso público com um sistema que não resolve o problema?

Além da eficiência questionável, os especialistas dizem que a tecnologia traz riscos desnecessários. Primeiro sobre a segurança dos dados. Segundo Barbara Simão, é preciso ter maiores detalhes e esclarecimentos sobre como ocorrem os armazenamentos dos dados dos alunos, além da devida qualificação dos operadores desses sistemas. Há preocupações, por exemplo, sobre risco de vazamentos e de uso indevido das imagens das crianças e adolescentes.

— De que forma e quais órgãos e instituições terão acesso aos dados coletados? Que medidas serão tomadas para proteger essas informações? Nada disso é claro nas propostas que têm circulado no país — complementa Pellanda.

Outro risco é o viés discriminatório que a tecnologia de reconhecimento facial pode acarretar. Principalmente por isso, essa tecnologia vem sendo questionada em muitos países, já que ela passou a ser usada em instituições de segurança público mundo afora, o que já resultou em investigações de racismo, por exemplo. Em Nova York, há um veto desde 2020 sobre o uso do reconhecimento facial até que se tenha um estudo mais preciso sobre os benefícios dessa tecnologia.

No Brasil, a ONG Ação Educativa é uma signatária de uma carta aberta que pede o banimento global dessa tecnologia.

-- O reconhecimento facial tem mais malefícios do que benefícios. Ela abre a possibilidade para muitos tipos de infração de direitos humanos e da privacidade do cidadão. Hoje ainda é uma tecnologia que erra muito, mas mesmo se for completamente precisa a vigilância massiva e indiscriminada é uma violação dos direitos das pessoas -- explicou Tarcizio Silva, assessor de Tecnologia na Ação Educativa

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