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Crise de aprendizagem

País precisa ser capaz de elaborar e implantar políticas aptas a promover um salto na qualidade da educação básica

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Por Notas & Informações
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Quando se olha o panorama da educação básica brasileira, é nítida a existência de uma crise de aprendizagem. Isso não significa que todo o ensino dado às crianças e aos jovens seja de péssima qualidade ou que não tenha havido avanços significativos em determinadas áreas. É preciso reconhecer, no entanto, que há ainda graves problemas de aprendizado que precisam ser enfrentados. Sem atraso, o País precisa ser capaz de elaborar e implantar políticas públicas aptas a promover um salto na qualidade educacional.

Organizado pelo movimento Todos pela Educação, o Anuário Brasileiro da Educação Básica apresenta a situação da educação no País. Os números impressionam. Há, por exemplo, 2,23 milhões de docentes na educação básica. Desse total, 79,9% têm ensino superior e 36,9%, pós-graduação. No ano passado, houve 48,45 milhões de matrículas nessa categoria de ensino, que engloba educação infantil, ensino fundamental e médio, educação profissional, educação de jovens e adultos e escolas especializadas. Desse total de matrículas, 39,46 milhões (81%) frequentaram a rede pública.

De cada 100 estudantes que entram na escola, 90 concluem o Ensino Fundamental 1 aos 12 anos – 60,7% com aprendizagem adequada em português; 48,9%, em matemática –, 76 terminam o Ensino Fundamental 2 aos 16 anos – 39,5% com aprendizagem adequada em português; 21,5%, em matemática – e 64 concluem o Ensino Médio até 19 anos – 29,1% com aprendizagem adequada em português; 9,1%, em matemática.

Talvez uma das principais conquistas da educação no País seja a universalização do ensino fundamental, também no campo. Dos 5,5 milhões de crianças de 6 a 14 anos que moravam em zona rural em 2018, 99,3% estavam na escola. O desafio dessa etapa é o término do curso na idade esperada. Quase um quarto dos alunos termina essa etapa com mais de 16 anos, o que tem efeitos sobre o ensino médio. Entre os jovens de 15 a 17 anos, 91,5% estão na escola, mas apenas 68,7% estão no ensino médio.

Há também algumas evidentes deficiências de infraestrutura. Por exemplo, apenas 45,7% dos estabelecimentos de ensino contam com biblioteca ou sala de leitura. Um dado especialmente ruim do ano passado foi a diminuição, em torno de 30%, das matrículas em regime integral no ensino fundamental em relação ao ano anterior.

O que mais chama a atenção no Anuário é a baixa qualidade do aprendizado. Menos da metade dos alunos atingiu níveis de proficiência considerados adequados ao fim do terceiro ano do ensino fundamental em leitura e matemática. Em relação à escrita, um terço (33,8%) dos alunos apresentou níveis insuficientes.

O quadro é ainda mais problemático quando se analisam os níveis de renda. Por exemplo, apenas 14,1% das crianças do nível socioeconômico mais baixo apresentaram nível suficiente de alfabetização em leitura. Ou seja, no grupo onde a educação deveria ser a grande esperança de um futuro melhor, mais de 85% das crianças estão em etapas defasadas do aprendizado já no terceiro ano do ensino fundamental. No patamar socioeconômico mais alto, a proporção é inversa. No terceiro ano, 83,5% das crianças apresentaram nível suficiente de alfabetização em leitura.

Tem havido melhoras. Nos anos iniciais do ensino fundamental, observa-se um avanço do Índice de Desenvolvimento da Educação Básica (Ideb). A melhora é mais lenta nos anos finais dessa etapa e, em relação ao ensino médio, verifica-se uma estagnação. “Ignorar os desafios reais da educação básica – adverte o Todos pela Educação – é também fechar os olhos à grave realidade socioeconômica, de falta de competitividade tecnológica, científica e produtiva que vivenciamos. (...) Trata-se, principalmente, de reconhecer a urgência dos problemas, buscar aprender com as iniciativas de sucesso, entender os grandes números e contextualizá-los na realidade de cada localidade.” Com urgência, a educação precisa de um projeto estratégico. A crise de aprendizagem é a negação de um horizonte mais justo e mais humano para as novas gerações.