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Crédito de carbono é dinheiro

Por José Renato Nalini
Atualização:
Amazônia. Foto: TIAGO QUEIROZ/ESTADÃO

O mundo precisa levar a sério o aquecimento global. Parece que está sendo obrigado a isso, pois catástrofes climáticas são mais frequentes e atingem todo o planeta. O remédio existe e se chama redução das emissões dos gases venenosos. Isso pode se converter em recurso financeiro para socorrer economias combalidas como a brasileira.

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Há pouco, uma reportagem de Luciana Dyniewicz e Renée Pereira mostrou que o empresário Ricardo Stoppe já comercializou cem milhões de reais em crédito de carbono e o negócio está bem promissor.

Para isso, ele reservou inicialmente 150 mil hectares na Amazônia e agora já possui 500 mil hectares próprios, além de um milhão e meio de hectares de outros produtores. O mundo civilizado - que leva o aquecimento global a sério - precisará comprar créditos de carbono. Se o Brasil tivesse governo inteligente, estaria empenhado em aproveitar nossa reserva natural e em repor aquilo que a criminosa devastação destruiu nos últimos anos.

É claro que isso requer uma consciência sensível, algo que falta à maioria dos proprietários de terra e que nunca chegou perto da mentalidade de grileiros, invasores e infratores ambientais. Ricardo Stoppe investiu dois milhões na contratação de engenheiros florestais e auditorias internacionais cadastradas por empresa certificadora. Foi difícil no início, pois ninguém comprava crédito de carbono. Ele começou a vender em 2019 e recebeu dois dólares e meio por crédito. Hoje ele vende a doze dólares no mercado voluntário e garante que chegará a trinta dólares neste ano.

Essa previsão detectada por um empresário inteligente e em dia com o que acontece no planeta fez com que ele investisse duzentos e cinquenta milhões em terras e projetos de carbono. Com isso, ele é um dos maiores produtores de créditos certificados pela companhia americana Verra.

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Pessoas lúcidas sabem que a tendência é de aumento do valor do crédito. Por isso, há quem compre hoje para revenda quando o produto se valorizar. E isso é inevitável. O mundo que leva a ciência a sério sabe disso.

Esse investimento já compete com a pecuária, embora ainda não com a soja. Mas chegará lá. O crédito de carbono é criação do Protocolo de Kyoto, em 1997 e não é senão um certificado que atesta a redução da emissão de gases de efeito estufa. Um crédito equivale a uma tonelada desses gases venenosos que deixa de ser emitida.

O importante é que os créditos investem nos projetos mitigadores dos impactos nocivos à natureza. Financiam reflorestamento e a manutenção de mata em área sob risco de vir a ser dizimada.

É preciso compreender que o mercado de carbono funciona de forma regulada, como na Europa, com metrificação legal e de forma voluntária, como no Brasil. Aqui, empresas e indivíduos decidem voluntariamente reduzir ou neutralizar suas emissões.

A regulação faz com que o governo defina limites de emissões para o setor produtivo. Quando a empresa emite além do teto fixado, pode comprar títulos de uma companhia que não esgotou sua cota. A COP 26 aprovou regras para o comércio global, para que países que absorvem mais do que emitem gases venenosos possam vender créditos para os países emissores.

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No ambiente regulado, o crédito vale cerca de cinco dólares. Na União Europeia, após a COP26 e aquilo que ela trouxe de maus presságios, se tudo continuar como está, o preço disparou. Passou de sessenta e quatro vírgula três dólares para cento e um vírgula seis dólares, uma alta de 58%.

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Tudo é uma questão cultural. O pensamento rançoso, antiquado e materialista do empresário antigo não via qualquer vantagem na "floresta em pé". O bom sinal é que a juventude esclarecida vai substituindo a velharia anacrônica. Jovem sabe que preservar o ambiente é questão de sobrevivência.

O próximo governo federal deverá reverter a política antiambiental que foi inaugurada nesta gestão ecocida. Nunca se desmatou tanto. Nunca se invadiu tanta terra indígena, que é terra pública, garantida pela Constituição. Mas o governo se recusa a cumprir a Constituição. E a falta de consequência legal para tal conduta delinquencial é uma prova do fracasso moral da República brasileira, como já acentuado por vários respeitados pensadores.

A esperança é que a partir de 2023, haja regulamentação federal para a redução das emissões. Há um projeto de lei 528/21, que - se aprovado - conferiria mais força à política da descarbonização. Por enquanto, existe apenas o mercado voluntário, mas em pequena escala. Não existe uma consciência ecológica generalizada, embora alguns exemplos já evidenciem a rentabilidade de um investimento verde.

Se o Brasil tivesse investido numa educação ambiental de qualidade, seria a população a exigir compostura do governo. Por isso, tudo tende a favorecer a sensação de que manter o povo deseducado é eficiente estratégia para os inimigos da natureza.

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*José Renato Nalini é reitor da Uniregistral, docente da pós-graduação da Uninove e presidente da Academia Paulista de Letras - 2021-2022

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