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CPI do MEC seria 'uma grande pizza', diz Alvaro Dias

Senador Alvaro Dias (Podemos-PR) não quis assinar documento em apoio a CPI do MEC - Jefferson Rudy/Agência Senado
Senador Alvaro Dias (Podemos-PR) não quis assinar documento em apoio a CPI do MEC Imagem: Jefferson Rudy/Agência Senado

Do UOL, em São Paulo

11/04/2022 15h09

Integrante do grupo parlamentar que faz oposição ao governo do presidente Jair Bolsonaro (PL) no Senado, o senador Alvaro Dias (Podemos-PR) decidiu não assinar o documento que pede a criação de CPI (Comissão Parlamentar de Inquérito) para investigar esquemas de corrupção no MEC (Ministério da Educação).

Em entrevista ao colunista Igor Gadelha, do portal Metrópoles, o senador disse que não deu seu apoio à criação da comissão por avaliar que a instalação do órgão colegiado seria uma "encenação" da oposição e poderá resultar numa "grande pizza".

"Não assinei pela primeira vez uma CPI em vários mandatos, porque não vendo ilusões. Armar palanque eleitoral e entregar uma grande pizza é tudo que a população não merece nesse ano de eleição", afirmou o parlamentar.

Para justificar a decisão, Dias disse que uma investigação do MEC já está acontecendo no âmbito da Justiça e da comissão de Educação do Senado. "Respeito a sociedade e abomino a encenação", acrescentou.

A declaração de Alvaro Dias vem após dois senadores do partido, Oriovisto Guimarães (PR) e Styvenson Valentim (RN) retirarem seus apoios à CPI.

Com a retirada, o requerimento de criação da CPI apresentado pelo senador Randolfe Rodrigues (Rede-AP) ficou sem as 27 assinaturas mínimas necessárias para ser protocolado no Senado.

Pacheco pede investigação

A possível CPI para apurar irregularidades no MEC ainda precisa passar pelo crivo do presidente do Senado, Rodrigo Pacheco (PSD-MG). Ele atribuiu para si a avaliação de instalar ou não a comissão.

"Os critérios de CPI são assinaturas, o fato determinado, orçamento previsto. Então, quando se exige a existência de fato determinado, há um crivo sim da presidência de se entender se aquele fato determinado deve justificar uma CPI ou não", afirmou Pacheco em entrevista a jornalistas no Senado.

A tentativa da oposição causou um impasse no plenário do Senado, na última quinta-feira, 7. A senadora Rose de Freitas (MDB-ES) diz ter sido vítima de uma fraude ao ter seu nome incluído na lista de assinaturas da CPI sem sua autorização.

"Isso é uma fraude. Quem fez isso tem que ser expulso desta Casa", declarou. A lista final com os 27 nomes não traz o dela.

O presidente do Senado anunciou que abrirá uma investigação para investigar o fato e organizar um novo modelo de coleta de assinaturas na Casa. Nesta semana, Pacheco evitou dar apoio à criação da CPI e defendeu "cautela" em instrumentos do Legislativo que possam virar palanque eleitoral.

A coleta de assinaturas começou no fim de março e ganhou força depois que prefeitos afirmaram ao Senado, na última terça (5), terem recebido pedidos de propina de pastores ligados ao ex-ministro da Educação Milton Ribeiro. No requerimento, Randolfe pede uma equipe de 11 titulares e 11 suplentes para conduzir os trabalhos, que devem durar 90 dias.

Mesmo sem a instalação da CPI, o Senado já tem apurado as suspeitas por meio da Comissão de Educação. Além de colher depoimentos dos prefeitos que relataram pedidos de propina, o colegiado ouviu hoje o presidente do FNDE (Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação), Marcelo Lopes da Ponte, que negou irregularidades.

"Diante dos graves fatos narrados acima, cabe ao Senado Federal cumprir o seu dever de monitoramento e fiscalização e apurar as irregularidades e crimes praticados na destinação das verbas do Ministério da Educação e do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (FNDE)", escreveu Randolfe no requerimento de abertura da CPI.

    As suspeitas

    A Comissão de Educação ouviu, na última terça (5), cinco prefeitos que relataram pedidos de propina dos pastores. Um deles, de Bonfinópolis (GO), declarou ter sentido "ânsia de vômito" ao ouvir que teria que pagar R$ 15 mil pela liberação de R$ 7 milhões para a construção de uma escola. Outro prefeito, da cidade de Luís Domingues (MA), afirmou que o grupo pediu 1 kg de ouro, além da propina de R$ 15 mil.

    Os gestores que falaram à comissão são de cinco partidos diferentes e comandam municípios em três estados: Kelton Pinheiro (Cidadania), de Bonfinópolis (GO), José Manoel de Souza (PP), de Boa Esperança Do Sul (SP), Gilberto Braga (PSDB), de Luís Domingues (MA), Helder Aragão (MDB), de Anajatuba (MA), e Calvet Filho (PSC), de Rosário (MA).

    O pastor estava sentado na mesa no Ministério da Educação e, em seguida, fomos para o almoço. Nesse almoço, que não estava o ministro, só estavam os pastores Arilton Moura e Gilmar Santos, e 20 a 30 prefeitos. A conversa lá era muito aberta. Ele [Arilton] virou para mim e disse: 'Cadê suas demandas?'. Eu apresentei minhas demandas para ele e ele falou rapidamente: 'Você vai me arrumar R$ 15 mil para protocolar suas demandas e, depois que o recurso tiver empenhado, como sua região é de mineração, você vai me trazer 1 kg de ouro'. Eu não disse nem que sim nem que não e me afastei".
    Gilberto Braga, prefeito de Luís Domingues (MA), em depoimento no Senado

    Segundo os políticos, os encontros em que houve pedido de propina ocorreram um ano atrás, em março e abril de 2021. A abordagem dos pastores era uniforme, de acordo com os depoimentos: primeiro, os gestores municipais eram recebidos no MEC, com a presença de Ribeiro, e então levados pelos pastores a restaurantes, onde recebiam pedidos

    O pastor Santos negou ter recebido ou contribuído para o recebimento de propina. Pelas redes sociais, Santos também eximiu Bolsonaro de culpa. "Gostaria de externar que nenhum pedido fora feito ao Excelentíssimo Senhor Presidente da República", disse. Ailton Moura não se manifestou.

    Ribeiro e Bolsonaro

    Os nomes dos pastores Gilmar Santos e Arilton Moura ficaram conhecidos no mês passado, após virem à tona suspeitas de que estariam exercendo influência indevida no MEC. Eles são, respectivamente, presidente e assessor de assuntos políticos da Convenção Nacional de Igrejas e Ministros das Assembleias de Deus no Brasil.

    Reportagens dos jornais Folha de S. Paulo e Estado de S. Paulo, publicadas desde o mês, passado, indicam que os dois participam de um "gabinete paralelo" no ministério. Sem qualquer cargo público, estariam fazendo pedidos de propina a prefeitos que buscavam verbas para a educação em seus municípios.

    O agora ex-ministro da Educação Milton Ribeiro afirmou, em áudio divulgado pela Folha, o que o governo federal prioriza a liberação de verbas a prefeituras escolhidas por Santos e Moura. O dinheiro é destinado à construção ou reforma de creches e escolas, benfeitorias como quadras esportivas e compra de equipamentos para as unidades.

    Segundo Ribeiro afirmou no áudio, uma das demandas do pastor Gilmar "foi um pedido especial" que o presidente Jair Bolsonaro (PL) fez ao ministro. Inicialmente, Ribeiro admitiu ter encontrado os líderes religiosos, mas isentou o presidente. Já Bolsonaro declarou que colocaria a "cara no fogo" pelo ministro.

    Mesmo com a declaração pública de apoio, Ribeiro pediu exoneração do cargo uma semana mais tarde, e Bolsonaro disse que ele deixou o governo apenas "temporariamente". Ao deixar o cargo, o ministro já havia perdido inclusive o suporte de líderes evangélicos, como o pastor Silas Malafaia e o deputado Marco Feliciano (PL-SP).

    Investigações

    Ribeiro e os pastores são investigados em um inquérito da PF, aberto no último dia 25 por ordem da ministra Cármen Lúcia, do STF (Supremo Tribunal Federal), a pedido da PGR (Procuradoria-geral da República). As diligências apuram, a princípio, indícios de corrupção passiva, e tráfico de influência.

    Ao prestar depoimento, o ministro confirmou que Bolsonaro lhe pediu para receber o pastor Santos, mas negou "tratamento privilegiado" e a existência de um "gabinete paralelo" na pasta.

    "O presidente Jair Bolsonaro realmente pediu para que o pastor Gilmar fosse recebido, porém isso não quer dizer que o mesmo gozasse de tratamento diferenciado ou privilegiado na gestão do FNDE [Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação] ou MEC, esclarecendo que, como ministro, recebeu inúmeras autoridades, pois ocupava cargo político", disse o ex-ministro, em um trecho do depoimento.

    Ribeiro afirmou à PF que, após a primeira reunião com os pastores na sede do ministério, Bolsonaro sequer teria questionado sobre o teor da conversa. "O presidente da República jamais indagou o declarante a respeito da visita do pastor Gilmar", diz trecho do depoimento.