Por Mateus Rodrigues e Ana Carolina Moreno, TV Globo e G1


Vista do auditório do CNE ao fim da sessão deliberativa — Foto: Larissa Batista/G1 DF

O Conselho Nacional de Educação (CNE) convocou reunião extraordinária para decidir, nesta terça-feira (26) se mantém ou revoga os critérios atuais do Plano Nacional de Educação (PNE) para medir o investimento no ensino básico. Esses índices existem desde 2010, mas nunca foram homologados pelo Ministério da Educação e, por isso, ainda não entraram em vigor.

Os critérios foram elaborados pela Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE), apresentados ao MEC em 2010, e entraram na versão final do PNE sancionada em 2014. São dois parâmetros:

  • Custo-aluno-qualidade inicial (CAQi): um cálculo que define o investimento por aluno, em cada etapa e modalidade de educação, para garantir uma qualidade mínima na educação.
  • Custo-aluno-qualidade (CAQ): um cálculo que define, em uma segunda fase, o investimento por aluno para aproximar a educação brasileira da oferecida em países desenvolvidos

O CAQi deveria ter sido implementado até 2016, com repasses da União a estados e municípios para reforçar o caixa da educação básica. Sem a homologação do parecer, no entanto, o texto nunca saiu do papel. Já o CAQ teria que ter entrado em vigor em meados de 2018.

O problema, segundo o CNE, é que decisões judiciais recentes – em ações movidas pelos governos locais – ordenaram que o MEC comece a repassar o dinheiro. Entre os argumentos de governadores e prefeitos, está o fato de que eles vêm sendo cobrados em avaliações de desempenho ligadas ao Plano Nacional de Educação.

O tema será tratado em reunião extraordinária da Câmara de Educação Básica. Pelo calendário regular, o colegiado já se reuniria na próxima semana, mas o debate foi antecipado para não tomar o tempo das outras pautas.

Nessa reunião, a Câmara de Educação Básica pode:

  • manter o texto, e reenviar ao MEC para que homologue e comece a repassar as verbas;
  • alterar o texto, revendo o indicador ou os prazos, por exemplo, ou
  • revogar o texto, como forma de rejeitar o CAQ e o CAQi como indicadores de política pública.

Se o parecer for revogado, na prática, o impasse se mantém. Isso, porque os indicadores constam no texto do Plano Nacional de Educação (PNE), que só pode ser alterado com o envio de uma nova lei ao Congresso Nacional. O governo não informou, até esta segunda, se pretende tomar essa atitude.

Primeira medida

Nesta segunda (24), antes mesmo da deliberação do CNE, o Ministério da Educação retirou o CAQ e CAQi de uma portaria. O texto define a composição e as atribuições do Comitê Permanente de Avaliação de Custos na Educação Básica, e também trocou a participação do Fórum Nacional de Educação por um representante do Ministério da Fazenda.

O artigo 2º dizia que o comitê tinha, como missão, assessorar o ministro na “análise de mecanismos federativos de cooperação e colaboração para implementação do Custo Aluno-Qualidade inicial - CAQi e Custo Aluno-Qualidade – CAQ”.

Na nova versão, consta a “avaliação da viabilidade de implementação de valores per capita associados à qualidade da educação básica, vinculada a existência das correspondentes fontes de custeio ou financiamento”, sem menção a nenhum indicador específico.

Reação às mudanças

A convocação da reunião extraordinária fez com que a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC), do Ministério Público Federal (MPF), pedisse nesta segunda-feira esclarecimentos ao CNE.

"No termo de convocação, o CNE limitou-se a informar a necessidade de cumprimento imediato dessa decisão judicial, sem nenhuma informação adicional acerca do conteúdo da referida decisão – impactando no controle social, na transparência e na publicidade dos atos administrativos, conforme estabelece o próprio regimento interno do Conselho", afirmou a PFDC, que deu ao conselho um dia útil para prestar esclarecimentos e encaminhar os documentos relativos ao parecer.

Os tribunais de conta, que nos últimos anos têm aperfeiçoado os mecanismos de fiscalização das metas do PNE, principalmente as ligadas à expansão de creches e pré-escolas, também se manifestaram contra mudanças no parecer. Em um ofício encaminhado ao CNE, Cezar Miola conselheiro do Tribunal de Contas do Rio Grande do Sul (TCE-RS) e presidente do Comitê Técnico da Educação do Instituto Rio Branco (IRB), expressou "preocupação" do comitê "quanto a possíveis mudanças em relação ao conteúdo do Parecer nº 08/2010, do Conselho Nacional de Educação. Ou, o que seria muito grave, a sua revogação".

Miola também defendeu a implantação do CAQi e do CAQ e afirmou que, sem esses parâmetros, o trabalho de fiscalização dos tribunais de conta é afetado. Além disso, o conselheiro disse que os municípios e estados fiscalizados usam a ausência dos indicadores "como elementos de impacto na gestão, configurando-se impeditivos da efetiva e integral aplicação dos dispositivos insertos no PNE".

Aumento do PIB investido em educação

O coordenador geral da Campanha Nacional pelo Direito à Educação (CNDE), Daniel Cara, também critica as medidas. Segundo ele, o CAQi exigiria investimento adicional de pelo menos 1% a mais do PIB anual em educação básica, a partir do esforço da União e de estados e municípios "que puderem colaborar".

"O que se sabe, por exemplo, é que a creche precisa ter um investimento de três a quatro vezes, a depender do local onde a creche está instalada, maior do que já existe hoje. Assim como também acontece com a pré-escola, um pouco menos no ensino fundamental e no médio", disse ele.

Para Daniel Cara, a condução do processo está equivocada dentro do governo. "Primeiro, você tira o CAQi e o CAQ do comitê que discute o financiamento da educação. Ao mesmo tempo, retira desse comitê o Fórum Nacional de Educação, que tem representação da sociedade civil, e coloca o Ministério da Fazenda. Com isso, ele assume que não vai cumprir com as estratégias do Plano Nacional de Educação que tratam do tema", critica Daniel Cara.

"Não cumprindo com as estratégias, ele (governo) pretende argumentar que é melhor, então, tirar da lei esses termos, que são fundamentais para a luta pública pelo direito à educação", diz o coordenador da CNDE.

Questionado pela TV Globo nesta segunda, o MEC não comentou a mudança na composição do comitê, e nem a retirada dos indicadores do texto da portaria.

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