Luana Génot
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Luana Génot
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Luana Génot


Hoje é domingo, dia 20 de novembro, mais um “Dia da Consciência Negra”. Ainda é necessário repetir e relembrar. É uma luta discursiva, de calendário e de espaço reforçar a efeméride.

Sabemos que para a grande maioria das pessoas é desafiador o exercício de tirar práticas antirracistas do papel, para além de hoje ou deste mês (como falei na coluna anterior). “Para que consciência negra?” “Não deveria ser consciência humana?” Você já deve ter se deparado com algumas dessas perguntas que ignoram o contexto de uma realidade que hierarquizou, e ainda hierarquiza, negros e indígenas, e coloca brancos no centro de tudo. Ainda que não se admita isso claramente.

A cor da pele não é só algo superficial e que pouco importa. Na prática, queiramos ou não, representa um filtro de oportunidades, em vida e após a ela, também. Nossas estatísticas não mentem.

De acordo com uma pesquisa da Professora Sophie Trawalter, da Universidade de Virgínia, a maioria dos monumentos erguidos para a preservação de memórias póstumas nos Estados Unidos são de pessoas brancas," majoritariamente homens. A realidade do Brasil não é diferente.

Existe hoje um processo de questionamento sobre se faz sentido ou não que permaneçam erguidas.

Estátuas de escravagistas, inclusive, têm sido derrubadas e alvejadas nos EUA, Brasil e em outras partes do mundo.

A memória que temos eternizada em nossas vidas sobre o protagonismo da História é majoritariamente branca. São os homens brancos que mais ganham nomes de ruas, estátuas e homenagens póstumas nominais.

Mas essa História, na prática, envolve pessoas de todas as cores, que são por muitas vezes apagadas e invisibilizadas. Mesmo se temos ruas, avenidas, estátuas dedicadas a figuras negras e indígenas como Teodoro Sampaio, os irmãos Rebouças, Zumbi ou ainda Araribóia, são exceções frente à grande maioria de brancos imortalizados.

E por falar em imortais, ouso aqui perguntar: qual a cor dos “imortais” do nosso país? Poderia ser uma pergunta para o próximo Enem (que, neste ano, teve como tema de redação os “Desafios para a valorização de comunidades e povos tradicionais no Brasil”).

Voltando aos “imortais”, não só os das estátuas. Recentemente, tive a oportunidade de participar de uma mesa redonda na Academia Brasileira de Letras (ABL), para o lançamento do livro “200 anos de independência: das margens do Ipiranga às margens da sociedade”. Dividi o microfone com os autores do livro.

Durante a minha fala, senti que não poderia deixar de trazer uma questão incômoda: a falta de pessoas negras e indígenas na ABL. Já parou para pensar que, até hoje, apenas três homens negros foram imortalizados? E que nenhuma mulher negra ou pessoa indígena ocupou essas cadeiras?

Não é por falta de tentativa. Em 2018, Conceição Evaristo tentou uma vaga para a cadeira 7. Mesmo após uma das maiores campanhas populares da história da ABL, perdeu.

Em 2021, o autor Daniel Munduruku, com mais de 50 obras publicadas e prêmios acumulados, também tentou e não conseguiu. Em uma entrevista, Daniel disse que a instituição deveria ser um retrato da sociedade e que isso seria possível à medida que ela se abre para acolher a diferença.

Durante participação no “Roda Viva”, Conceição disse que a Academia precisa tomar cuidado, porque, do contrário, perderá o bonde da História. Faço de suas palavras as minhas e estendo essa provocação para todas as instituições, públicas ou privadas.

A visibilidade das narrativas talvez seja um dos tantos desafios de negros e indígenas neste país que insiste em deixar estas narrativas à margem.

E para quem ainda tem dúvidas sobre o assunto, pode e deve refletir sobre o quanto a consciência negra e indígena nos torna mais humanos. Justamente por abrir espaços de direito, de modo mais intencional, para todas as possibilidades de narrativas.

Quem sabe quando tivermos mais consciência negra e indígena estaremos mais próximos da tal consciência humana?

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