publicado dia 20/10/2022

Congresso Nacional e eleições 2022: quais as concepções de educação em jogo?

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Nas eleições gerais, a concorrência pela Presidência ganha destaque, mas as candidaturas eleitas para o Poder Legislativo também merecem atenção, porque é na Câmara dos Deputados e no Senado (Congresso Nacional) que os projetos de país em disputa serão analisados, debatidos e votados pelas pessoas escolhidas pela população brasileira. 

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Um desses projetos a ser pautado é o da Educação, que tem temas centrais em debate atualmente, como a implementação da Reforma do Ensino Médio e da Base Nacional Comum Curricular, a defesa da escola pública e da liberdade de cátedra, bem como a Lei de Cotas e as condições para acesso e permanência nos espaços educativos. 

Para interpretar como ficou o novo balanço de posicionamentos em torno das políticas educacionais no Congresso Nacional após o processo eleitoral de 2022, o Centro de Referências em Educação Integral ouviu Bárbara Bruna Moreira Ramalho, professora na Faculdade de Educação da Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG) e membro do núcleo de ensino, pesquisa e extensão Territórios Educação Integral e Cidadania (TEIA) da UFMG.

A especialista destacou a relevância da eleição de uma série de pessoas cujas identidades são historicamente marginalizadas e reforçou a necessidade da sociedade apoiá-las para além do voto, durante seus mandatos. “São pessoas que nos ajudam a lembrar que nosso papel não é de reação, é de anunciar outros projetos educativos, outros mundos, que educação tem uma dimensão criadora, inventiva, não de subserviência”, disse Bárbara. Confira os principais trechos da conversa a seguir:

Centro de Referências em Educação Integral: No Congresso Nacional, há a Bancada da Educação e da Ciência que, este ano, das 48 candidaturas, elegeu 8. Como fica o novo balanço entre as diferentes concepções de Educação no Congresso Nacional? Quais são as principais defesas dessas frentes? 

Bárbara Bruna Moreira Ramalho: Quantitativamente há uma certa continuidade do que já vinha acontecendo, mas conceitualmente fomos mais para a direita. Há destaque para a agenda conservadora e reacionária, como o Escola Sem Partido e a educação domiciliar. 

Mas houve também a eleição de mulheres negras, indígenas, da comunidade LGBTQIA+, professoras, egressas do movimento estudantil, com larga e enraizada experiência no campo da Educação, e acadêmicas que trazem o saber da prática, no sentido freiriano. 

São pessoas que nos ajudam a lembrar que nosso papel não é de reação, é de anunciar outros projetos educativos, outros mundos, que educação tem uma dimensão criadora, inventiva, não de subserviência a essa lógica racista, patriarcal, capitalista que, no final das contas, é colonialista.

Pensando na eleição dessas mulheres, cujas identidades são historicamente subalternizadas, só foi possível porque tivemos momentos de reconhecimento da importância dessas identidades, o que contribuiu para que elas chegassem onde estão. Os tempos que vivemos são uma reação proporcional ao medo da revolução que esses corpos podem provocar nesses ambientes. 

Ao mesmo tempo, essas mulheres estão indo para espaços hostis, o que nos convoca enquanto sociedade, movimentos sociais, comunidades escolares, a pensar que a democracia e o projeto educacional serão construídos no cotidiano e ao lado dessas mulheres. 

Nosso papel não é só eleger, é permitir que elas não adoeçam nesses espaços, porque a violência política é forte e cotidiana. Mais do que nunca precisamos pensar em convocar uma gestão mais democrática, mais coletiva, que permita que elas sobrevivam nesses espaços com qualidade, com alegria.

CR: De que maneira as escolas e a comunidade escolar podem estar mais próximas do Congresso Nacional? 

BBMR: Podem participar se reterritorializando, reconstituindo ambientes de diálogo no seu interior, entre os professores, com os estudantes e as comunidades. Também voltar a reconhecer os sindicatos, que vêm sofrendo um desmonte, como representativo das categorias de profissionais da Educação, bem como buscar fóruns, espaços de interesse para discussão e participação, como os que debatem o Plano Nacional de Educação, que precisa voltar a ser pautado, e outros projetos educacionais. 

Além disso, é preciso dar condições de trabalho para que os professores possam ter oportunidade e desejo de se engajar nessas discussões.

Para os parlamentares, fica o desafio de chegar a esses lugares mais na ponta, de também fomentar espaços de diálogo sobre políticas de Educação enquanto projetos que podem ser disputados, não dados. 

CR: Quais devem ser as principais pautas de Educação em debate no Congresso no ano que vem?  

BBMR: Precisamos discutir com seriedade a Reforma do Ensino Médio, que vem se mostrando cada vez mais excludente, entender o que a Base Nacional Comum Curricular tem significado para os professores que estão no chão da escola, e voltar a discutir e colocar em prática o Novo Fundeb, porque a Educação precisa de financiamento.

Também vamos precisar debater o direito à diversidade e discussões sobre gênero no contexto da escola, mostrando exatamente o que significa discutir diversidade sexual e de gênero: é proteção e direito das crianças e adolescentes. E temos que pautar a Educação Integral não como projeto um projeto paralelo, mas como concepção de educação, que garanta investimento concreto de várias ordens.

Há ainda a questão da educação domiciliar, que é um mecanismo de exclusão mais sofisticado, em que vamos precisar falar sobre direito e liberdade individual. A escola é uma potência, por isso é muito atacada. 

No Ensino Superior há o desafio que propõe a reforma curricular dos cursos de licenciatura vinculada à BNCC, que traz um retrocesso histórico e um empobrecimento para a formação de professores, bem como temos que discutir a Lei de Cotas, que esse ano chegou ao prazo inicialmente previsto, mas é preciso reconhecer que dez anos de vigência dessa Lei é muito pouco diante de séculos de negação de direitos.

Outro ponto fundamental é a permanência dos estudantes na universidade. Quando entrei em 2007, como mulher negra, era muito diferente do que é a universidade que dou aula hoje. Me reconheço nos meus estudantes e acho que muitos deles se reconhecem em mim, as salas estão mais pretas e diversas e, por isso mesmo, mais potentes. Os cortes na bolsa-permanência para estudantes indígenas e quilombolas têm um impacto perverso na vida dessas pessoas e precisamos dar condições para que elas acessem o direito à educação e permaneçam estudando. 

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