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Como implantar uma educação antirracista desde a educação infantil

A Escola da Vila, em São Paulo, tem atuado de diversas formas para implementar uma educação antirracista, envolvendo toda a comunidade escolar (professores, funcionários, estudantes, famílias) desde a educação infantil. Este ano, por exemplo, a escola contou com uma consultoria da historiadora Ynaê Lopes dos Santos […]

Publicado em 16/11/2022

por Redação revista Educação

escola da vila - antirracismo _DSC0206 - destaque Foto: Reprodução/Escola da Vila

A Escola da Vila, em São Paulo, tem atuado de diversas formas para implementar uma educação antirracista, envolvendo toda a comunidade escolar (professores, funcionários, estudantes, famílias) desde a educação infantil. Este ano, por exemplo, a escola contou com uma consultoria da historiadora Ynaê Lopes dos Santos para dar início a um currículo antirracista com as crianças da educação infantil. Ynaê é mestre e doutora em história social pela USP, e reconhecida pela sua vasta pesquisa na área de história da América com ênfase em escravidão moderna e relações étnico-raciais, além de ser autora de quatro livros que abordam este tema.

A consultoria foi realizada durante um ano e, a partir daí, foi desenvolvido um currículo pedagógico antirracista voltado para crianças pequenas. Alguns projetos estão sendo implementados, como apresentar para as crianças personalidades negras das artes e da literatura, do Brasil e da África, e aprofundar os conhecimentos que a equipe de professoras tem sobre cada uma dessas pessoas.

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Escola da Vila desenvolve currículo pedagógico antirracista voltado para crianças pequenas
Foto: Reprodução/Escola da Vila

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Leia: Documentário de Emicida inspira professora da rede pública

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Leitura para ampliar o repertório

“Passamos a introduzir na educação infantil projetos como a literatura com protagonismo preto. As crianças levam para a casa livros em que os personagens negros são protagonistas, pela sua história, valores e cultura. Outra proposta também é conhecer artistas. Ano passado estudamos a vida e obra de Gilberto Gil. Este ano, elegemos Jorge Benjor e Clementina de Jesus”, conta Andréa Polo, coordenadora da educação infantil da Escola da Vila.  

As crianças têm ampliado seu repertório literário por meio de uma curadoria que envolve a biblioteca e as professoras e conhecido títulos como Cadê você Jamela?, Rapunzel e o Quibungo, Lulu adora a biblioteca e Tanto, tanto!, que revelam o talento e a história da negritude no ambiente escolar dos pequeninos. Estes títulos apresentam e valorizam a diversidade racial, assim como aproximam as crianças de representações do cotidiano e da relação entre as pessoas, deixando temas mais complexos como a escravidão no Brasil e no mundo para crianças a partir do ensino fundamental.

A priori, não falamos na educação infantil da escravidão. Nesta fase, a ideia é criar vínculos com a condição humana e não com a parte cruel da história”, diz Andréa Polo. 

“Este momento é dedicado a apresentar a eles a riqueza e a magnitude da cultura africana. As crianças deixam de se espelhar apenas nas personagens brancas e passam a enxergar e admirar outros perfis e formas de ser e estar no mundo e passam a enxergar outros exemplos. Como diz Ynaê, um trabalho antirracista só começa a funcionar quando uma criança branca deseja ser um personagem negro. E isso já ocorre na escola, pois elas enxergam o valor daqueles personagens”, reconhece Andréa.
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Projeto de literatura com protagonismo preto é introduzido na educação infantil
Foto: Reprodução/Escola da Vila

No dia a dia

Outro projeto desenvolvido é a apresentação de brincadeiras comuns da infância, que são originárias de países africanos e que muitos não sabem, como alguns tipos de pega-pega e brincadeiras de roda. O livro As brincadeiras Africanas de Weza  ajudou a escola nessa pesquisa. “Na hora de brincar, as crianças reconheciam algumas semelhanças entre as brincadeiras e aprendiam as novas também sabendo de que região da África vinham. É muito importante este resgate cultural”, afirma a coordenadora.

O trabalho passa também pelo letramento de todos da escola, pois toda a equipe deve estar apta e com informações corretas para lidar com questões que surgem no dia a dia da criança. Isso inclui também a linguagem. “Palavras que remetem ao racismo, como denegrir, não podem fazer parte do nosso vocabulário. Precisamos sempre nos atentar ao que está sendo dito aos pequenos para que eles não reproduzam”, diz.

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Leia: Escolas de elite querem desnaturalizar o racismo

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Diagnóstico 

A Escola da Vila atua de forma ampla para promover uma educação antirracista. As ações fazem parte do compromisso da instituição de impactar positivamente a sociedade por meio da formação de crianças e jovens com ações que despertem a consciência e atuação contra o racismo.  Além do projeto pedagógico para a educação infantil, possui uma política de bolsas de estudos integral para alunos do ensino médio que têm como objetivo atender estudantes de baixa renda e, a partir de 2023, passa a contar com uma política própria para crianças na educação infantil, estas com bolsas parciais e voltadas para crianças negras ou indígenas. São, ao todo, 22 bolsas de estudos, que acabam beneficiando sobretudo negros e indígenas.

A escola possui, também um Núcleo Antirracista, que envolve funcionários e comunidade escolar, e coletivo de estudantes que discutem o tema e ações que podem ser implementadas na escola e na sociedade.

‘Plano de ação para 2023’

No ano passado, a escola realizou um censo da diversidade em que pôde olhar com mais profundidade para o panorama étnico-racial da instituição. E, a partir daí, tem desenvolvido cada vez mais ações que contribuem para a busca da diversidade, do conhecimento e de ações antirracistas. Em junho, a Vila promoveu o Dia de Mobilização pela Equidade Racial e realizou um Diagnóstico das relações étnico-raciais com toda a comunidade escolar. A partir desse Diagnóstico, a escola promoverá uma nova mobilização em novembro para produzir o ‘Plano de ação antirracista’, que será implementado a partir de 2023. 

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“Como diz Ynaê, um trabalho antirracista só começa a funcionar quando uma criança branca deseja ser um personagem negro”, reconhece Andréa
Foto: Reprodução/Escola da Vila

“As crianças estão recebendo muito bem essas propostas, que só contribuem com o ambiente e a pessoa que queremos formar. Aqui temos profissionais pretos, um núcleo de família antirracista que apoia essas iniciativas, um coletivo de estudantes que se movimentam em favor da mudança de uma cultura em prol de movimentos antirracistas, que não deve acabar. É um trabalho permanente”, avalia Andréa Polo.

“Temos a premissa de ter uma pedagogia antirracista, com uma agenda étnico-racial e com ações educativas que combatam o racismo e desnaturalizem a prática em toda a comunidade escolar”, diz Fernanda Flores, diretora da Escola da Vila. “A Escola da Vila está colocando em ação medidas que incluem bolsas de estudos para estudantes pretos, bem como prevemos a implementação efetiva da Lei 10.639 no currículo pedagógico com disciplinas sobre a história afro-brasileira, dando um entendimento maior sobre a cultura preta, tão importante para a nossa formação”, enfatiza Fernanda.

Escute nosso episódio de podcast:

Autor

Redação revista Educação


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