Como a tecnologia na escola permite a construção coletiva de aprendizado? - PORVIR
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Inovações em Educação

Como a tecnologia na escola permite a construção coletiva de aprendizado?

Especialistas ouvidos pelo Porvir refletem sobre o uso da tecnologia como recurso pedagógico e reforçam a importância da troca entre alunos e professores nesse processo.

Parceria com APDZ

por Ana Luísa D'Maschio ilustração relógio 18 de outubro de 2021

O período de ensino a distância causado pela pandemia da Covid-19 reforçou a importância da tecnologia na educação. No Rio Grande do Norte, por exemplo, professores e a equipe do Serviço Nacional de Aprendizagem Comercial (SENAC) criaram grupos de estudos e tiveram 15 dias de imersão para planejar as aulas remotas e o suporte pedagógico que seria ofertado aos estudantes, levando em consideração as diferentes realidades do estado. “Trocamos a roda com o carro andando e aprendemos muito”, afirma a instrutora de aprendizagem profissional comercial do SENAC-RN, Simone Borba.

De acordo com Simone, a equipe da instituição percebeu um processo de metacognição – ação de refletir sobre o que se aprendeu e a habilidade de avaliar esse aprendizado – durante a etapa de construção de estratégias para atender, a distância, as necessidades dos alunos. “Os professores com experiência em diversos aspectos da tecnologia, como programação e aplicativos, compartilharam conhecimento com os colegas. Foi uma fase interessante: além do treinamento, passamos a criar cultura digital, pensando nos recursos que traríamos, além de fortalecer os canais de escuta”, explica.

A percepção da tecnologia como parte do processo educacional está relacionada às recomendações da Base Nacional Comum Curricular (BNCC) – a competência 5 do documento sugere seu uso crítico e responsável. “Não se trata só de usar ferramenta pela ferramenta, a tecnologia pela tecnologia: buscamos uma intencionalidade e começamos a trabalhar de forma hegemônica. Fortalecemos a questão humana, afinal, somos todos educadores. E quando todo mundo fala a mesma língua na instituição, tornamos a tecnologia como nossa aliada e isso privilegia toda a proposta educacional”, conta a instrutora.

O que muda para os professores?

A tecnologia traz outras formas de pensar e se relacionar com objetos e com o mundo, bem como aulas mais dinâmicas, interativas, alinhadas com a linguagem das crianças e dos jovens, aponta a diretora pedagógica e de inovação da APDZ Educação e Tecnologia, Sueli Abreu. “Ao trabalhar com a tecnologia, o professor precisa quebrar aos poucos seus paradigmas em relação à aprendizagem e aos materiais que utiliza”, diz. “A capacitação é muito importante, mas, sem o espírito aberto para fluir a própria aprendizagem, fica um conteúdo vivendo na memória de curto prazo e sem significado”, complementa.

Assim como acontece na experiência do Senac no Rio Grande do Norte, Sueli acredita que o educador deve aprender a aprender. “O professor precisa ter a experiência da tecnologia nas suas várias facetas para que perceba suas próprias aprendizagens, imagine as dos estudantes e consiga perceber suas possibilidades. Deve aprender livremente, observando, tirando conclusões, errando, aplicando seus conhecimentos, observando de novo. O ciclo não acaba nunca. Deve, também, aprender a ver, observando seus alunos aprendendo para fazer as interferências necessárias na hora adequada.”

Professor e pesquisador da Universidade do Vale do Itajaí, em Santa Catarina (SC), André Raabe ressalta que a tecnologia apoia o aluno a sair da passividade, do estágio em que só recebe informações e aguarda o que vai ser cobrado. “A tecnologia parte para um modelo que é mais autônomo para o aluno, buscando a informação e a usando para construir coletivamente o conhecimento, junto com o professor”, diz.

Motivação para os estudantes

Para a diretora pedagógica da APDZ, as tecnologias digitais da informação e da comunicação devem permitir ao estudante vivenciar a construção do próprio conhecimento, ampliando a possibilidade do desenvolvimento de outras habilidades que os materiais pedagógicos tradicionais não permitiriam. “O estudante, nessa abordagem, apropria-se dos recursos tecnológicos ofertados e os aplica nas soluções de problemas propostos pelos educadores, bem como nas soluções de problemas apresentados por ele mesmo. Nesse aspecto, temos aprendizagens que podem ocorrer por meio de aplicativos, programas, realidade aumentada ou realidade virtual – que jamais seriam possíveis sem essas tecnologias”, afirma Sueli.

André Raabe, que também é um dos autores do Currículo de Referência de Tecnologia e Computação do Centro de Inovação para a Educação Brasileira (CIEB), destaca: “A tecnologia e, em especial, o computador permitem que os estudantes entrem em contato com a internet, tenham acesso a fontes diversificadas de informação, possam desenvolver hipóteses e testá-las por meio de softwares, desenvolver a lógica e o raciocínio por meio da programação, e se posicionar como produtores de conteúdo, não apenas como consumidores.”

Perceber, analisar e manipular dados, assegura Sueli, possibilitam o acesso e a análise de conhecimentos na educação básica de forma nunca antes experimentada. “Ao programar, o estudante precisa, ao mesmo tempo, pensar sobre o objeto que quer construir e sobre seu próprio processo de raciocínio. E isso traz consequências maravilhosas para o seu desenvolvimento intelectual”, completa.

Desafios para a implementação

André, Simone e Sueli concordam que a tecnologia traz resultados positivos e mais eficientes quando baseada em projetos e em resoluções de problemas, como acontece no SENAC-RN. “A tecnologia parece funcionar melhor quando a gente pensa não apenas no olhar para o currículo como sendo um conjunto de conhecimentos que precisam ser, como diria Paulo Freire, depositado, como se o aluno fosse uma caderneta de poupança para recebê-los”, identifica André.

A despeito do papel fundamental de trazer inovação e o contato com o mundo externo, André enfatiza que os diferentes níveis de impacto na aprendizagem gerados pela tecnologia dependem de como a escola está preparada para lidar com o tema. “Entendo que a tecnologia ainda não tem um papel fundamental na escola porque ela ainda não está presente de forma relevante. Deveria, mas não está. O papel que ela deve assumir é o de potencializar tanto os estudantes quanto os alunos para se tornarem fluentes e usarem a tecnologia a favor da aprendizagem, para enriquecer o processo.”

Os desafios para a implementação efetiva da tecnologia na escola, contudo, são grandes. “A escola precisa encontrar novas formas para capacitar sem que isso estoure seu orçamento e inviabilize o processo. É fácil? Não. Porém, é possível”, acredita Sueli.

É necessário também investir em infraestrutura, acrescenta André Raabe. “Além da preparação dos docentes, para que saibam escolher melhores formas de uso de tecnologia e se apropriar de forma a potencializar as atividades, permitindo a autoria dos estudantes e melhorando sua relação com a escola, é preciso ter acesso a serviços que mantenham esses computadores funcionando, internet de boa qualidade com velocidade condizente. Sem uma infraestrutura adequada e sem pessoal que dê apoio a essa infraestrutura, junto com a formação de professores, nenhum investimento em tecnologia rende resultado”, conclui.

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